BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Após cobrança do STF (Supremo Tribunal Federal) por maior transparência sobre as emendas de relator (conhecidas pelo código RP9), o Congresso criou um sistema digital para receber as indicações de gastos desta fatia bilionária do orçamento.

A ideia é acabar com as propostas feitas por ofícios, mas a nova regra preserva o cerne do funcionamento deste tipo de emenda, que é privilegiar parlamentares e grupos de poder a partir de negociações políticas.

A ferramenta ainda mantém brecha para esconder o nome do parlamentar que de fato apadrinhou a emenda. Isso porque o pedido pode ser registrado no nome de prefeitos, por exemplo, ainda que beneficie algum deputado ou senador.

O novo sistema foi apresentado a assessores de deputados e senadores nesta quinta-feira (10) por representantes da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional, pasta que gere este novo sistema.

"Não sei no Senado, mas na Câmara essa distribuição [de verba] depende do tamanho das bancadas. Como as bancadas estão sendo alteradas agora, a gente pode não ter isso previamente definido antes do começo de abril", disse o diretor da comissão Wagner Primo.

As emendas de relator se converteram em um dos principais instrumentos de negociação política com o Congresso na gestão Bolsonaro. A verba é usada para irrigar redutos eleitorais.

Uma assessora presente estava na reunião resumiu a ideia de que o novo sistema melhora a transparência ao centralizar os pedidos de gasto na plataforma digital, mas mantém a negociação política pela verba.

"Isso tem de ficar bem claro. Isso aqui é só uma transparência para a gente entregar para Rosa Weber [ministra do STF que relatou a ação sobre as emendas RP9]. Mas a negociação vai continuar do mesmo jeito", disse ela, que não foi identificada na transmissão da reunião pelo canal da Câmara no YouTube.

"Quem é parlamentar da oposição sabe que a cota é essa. Quem é da situação sabe que a cota é outra", afirmou ela ainda.

Não ficou claro se os presentes sabiam da transmissão da reunião. "Todo mundo é da casa, não tem nada gravado", chegou a dizer Primo, antes de começar uma fala.

Há R$ 16,5 bilhões reservados para este tipo de emenda no Orçamento de 2022, sendo que a maior fatia (R$ 8,25 bilhões) será direcionada ao Ministério da Saúde.

Não há cota definida para cada parlamentar neste tipo de emenda, como ocorre com as individuais.

De forma geral, qualquer parlamentar, além de outros agentes políticos, como prefeitos, governadores e associações, podem fazer indicações de gastos com a verba das emendas RP9, mas a definição de quais propostas serão aceitas passa por negociação política.

Essas propostas eram feitas por ofícios. Agora serão encaminhadas a este sistema digital.

Depois de selecionar os pedidos de emendas, o relator do orçamento envia as indicações para os ministérios executarem a verba.

Em novembro de 2021 a ministra Rosa Weber, do STF, chegou a suspender a execução das emendas RP9. Ela argumentou que a verba cria "um grupo privilegiado de parlamentares que poderá destinar volume maior de recursos a suas bases eleitorais".

Cerca de um mês depois, a ministra liberou o pagamento destas emendas. Também mandou o Congresso dar "ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso públicos", a todos os documentos relacionados à distribuição dessas verbas em 2020 e 2021.