SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Mais polarização política. Campanha eleitoral para presidente da República sendo antecipada para 2021. Populismo na economia elevando gastos públicos e a dívida do governo. O temor de que haverá a mistura desses riscos no curto prazo repercutiu com força no mercado financeiro nesta segunda-feira (8).

O estopim foi o ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinar a anulação de todas as condenações proferidas contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela 13ª Vara Federal da Justiça Federal de Curitiba, responsável pela Lava Jato. Assim, Lula retoma o direito de se candidatar nas próximas eleições.

Com a volta do petista à disputa pela presidência em 2022, o mercado teme uma guinada ainda maior do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao populismo e consequente abandono da agenda liberal e do compromisso com a saúde fiscal do país para angariar votos.

Caso Lula dispute a eleição, analistas veem grandes chances de um segundo turno entre o petista e Bolsonaro. Pesquisa do Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria) divulgada nesta segunda pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra que apenas Lula supera Bolsonaro na intenção de voto em 2022.

"Isso acaba com a possibilidade de uma terceira via, que era o que o mercado esperava, alguém mais alinhado com as reformas. Como a esquerda não estava organizada, o mercado via espaço para isso", diz Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos.

Com a pandemia, a saúde fiscal do Brasil se deteriorou pelo aumento de gastos e queda na arrecadação. Dado o cenário, participantes do mercado financeiro defendem a aprovação de reformas, como a administrativa e a fiscal, de modo a conter as despesas públicas.

"A polarização é ruim, leva Bolsonaro a abandonar o compromisso com a contas públicas para uma agenda mais populista, que dê mais retorno político", afirma Cruz.

Com o auxílio emergencial em 2020, Bolsonaro viu sua popularidade crescer. Com a piora no número nos casos de coronavírus e medidas mais restritivas de isolamento, o governo irá promover uma nova rodada de auxílio emergencial neste ano.

O Senado aprovou na semana passada a PEC Emergencial, que estabelece um teto de R$ 44 bilhões para pagamento do benefício. Uma contrapartida para o novo gasto, porém, não foi definida.

Daniel Miraglia, economista-chefe do Grupo Integral, cita o temor do mercado que a agenda de privatizações e de ajuste fiscal se dissipe.

"Dada a situação fiscal do Brasil, o mercado não vê mais espaço para isso", afirma Miraglia.

A decisão de Fachin pegou o mercado, em um pregão negativo, de surpresa. O Ibovespa chegou a cair 4,28%, mas fechou em queda de 3,98%, a 110.611,58 pontos, menor valor desde 1º de março.

As ações preferenciais (mais negociadas) da Petrobras recuaram 5,76%, a R$ 21,10 cada uma. As ordinárias cederam 4,80%, a R$ 21,00.

O dólar ficou R$ 0,10 mais caro. A moeda fechou em alta de 1,67%, a R$ 5,7770. O dólar turismo está a R$ 5,933.

“O receio do mercado é que o período eleitoral seja mais conturbado com uma possível candidatura de Lula, cuja visão pode ser contrária àquela da agenda de reformas atual, o que pode dificultar a trajetória fiscal, reduzir a confiança para investimentos a longo prazo e, por consequência, comprometer o crescimento econômico do país”, afirma Paloma Brum, economista da Toro Investimentos.

Alguns participantes do mercado também veem que, com a candidatura de Lula, Bolsonaro tem mais chances de se eleger, dada a aversão ao PT que o impulsionou em 2018.

“Estamos entre o fogo e o caldeirão. Dois populistas que prometem um monte de coisa para o povo. Ficamos com pouca ou nenhuma alternativa para o ano que vem. Para o mercado, é o pior cenário possível”, diz André Machado, sócio-fundador da escola de traders Projeto Os 10%.

O risco-país medido pelo CDS de cinco anos operava em alta de 9,55% nesta segunda, próximo ao fechamento do mercado, indo a 215,25 pontos, maior nível desde novembro de 2020.

O CDS funciona como um termômetro informal da confiança dos investidores em relação às economias dos países, especialmente emergentes. Se o indicador sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país; se ele cai, o recado é o inverso.

“Está bastante cedo [para falarmos de eleição], mas o mercado sempre se antecipa. Hoje também houve um certo efeito manada", afirma Murilo Breder, especialista em renda variável da Easynvest.

Segundo ele, não é uma questão de qual candidato é melhor ou pior e sim de perspectiva de mudança no cenário econômico. "O mercado financeiro sempre vai tentar ganhar dinheiro se ajustando ao cenário", diz Breder.

Além da incerteza quanto à agenda liberal do governo, o mercado se preocupa com a piora da pandemia no Brasil e a alta nos juros dos títulos do Tesouro americano, o que leva investimentos aos Estados Unidos, em detrimento de países emergentes.

Os juros futuros também subiram na sessão, em reflexo de um aumento no risco fiscal e consequente elevação na Selic.

O juro para janeiro de 2025 foi de 6,95% para 7,27%.