CAPITAN BADO, PARAGUAI (FOLHAPRESS) - A dona de casa Rosana Benitez, 54, cozinhava em casa na quarta-feira (13), na cidade paraguaia de Capitán Bado, na fronteira com o Brasil, quando ouviu uma bateria de tiros.

Quando botou a cabeça para fora da janela para saber do que se tratava, viu o marido, Juan Gomez, caído sobre uma poça de sangue. Ela fez suas malas às pressas e nesta quinta (14) estava de partida para a capital, Assunção.

Na última semana, houve mortes em série na fronteira formada pelas cidades de Ponta Porã (MS) e Pedro Juan Caballero, controlada pelo PCC. A tensão, porém, não se limita aos dois municípios. A menos de 100 km dali, Coronel Sapucaia (MS) e Capitán Bado também vivem o clima de medo sob a onda de violência.

Coronel Sapucaia, assim como Ponta Porã, não tem nenhuma barreira física na fronteira. Isso é um ativo valioso para organizações criminosas brasileiras, interessadas em escoar drogas de países vizinhos para o Brasil e a Europa.

A presença desses grupos tem deixado um rastro de sangue pelos locais onde passam, seja devido a guerras entre grupos rivais, seja devido a acertos de contas entre membros da própria facção.

Em Capitán Bado, o assassinato do marido de Rosana acendeu o alerta das polícias brasileiras e paraguaias. Na ocasião, mais duas pessoas foram baleadas, incluindo um ex-vereador.

Rosana diz que tudo durou menos de cinco minutos. Juan, marido dela, um técnico em refrigeração que tomava tereré num bar, foi o único a morrer no episódio.

"Ele não tinha envolvimento com qualquer coisa, era uma pessoa pobre. Que seja feita justiça", afirmou, ao lado da caminhonete onde guardava seus pertences.

A polícia ainda não prendeu o autor do crime. De acordo com uma das linhas de investigação, o alvo do ataque era um ex-vereador, sobrinho de Juan.

Na quinta, uma batida policial encontrou uma pistola Glock, um revólver Taurus, silenciador, radiocomunicadores e veículos em uma casa na cidade. A suspeita é que os itens possam estar relacionados ao crime.

Enquanto a situação não se resolve, moradores da cidade temem a possibilidade de se tornarem mais uma vítima colateral de um atentado.

De olho no noticiário da TV que transmitia os novos capítulos da guerra na fronteira, o comerciante Roberto Lazar, 52, comentou: "A gente fica consternado, porque parece que o crime não escolhe mais as suas vítimas".

Ele vive na cidade há mais de 30 anos, onde a violência entre traficantes sempre fez parte da rotina, de uma maneira ou de outra. Mas os moradores sem relação com a criminalidade costumavam se sentir seguros, apesar de tudo. Isso agora acabou.

Capitán Bado e Coronel Sapucaia são divididas apenas por uma rua, a avenida Internacional. Aqui e ali, bandeiras dos dois países tremulam uma ao lado da outra.

A população das duas cidades somadas não chega a 25 mil habitantes. O número pequeno de pessoas, porém, parece inversamente proporcional à quantidade de vezes que a região ganha o noticiário policial devido à violência.

A região é sede de uma célula do Comando Vermelho. Durante vários meses, um homem suspeito de ser o representante do líder da facção, Fernandinho Beira-Mar, viveu por ali. Evaldo Rodrigues acabou preso depois na cidade de Dourados (MS). O poder da facção, porém, permanece intacto.

A facção rivaliza com o PCC (Primeiro Comando da Capital), o "dono" de uma das fronteiras mais desejáveis no mundo do crime, a que separa Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.

Segundo policiais ouvidos pela reportagem, no momento não há sinais de que a violência na região se trate de uma guerra entre as facções, que vivem em estado de tensão permanente.

Os reforços na segurança ostensiva, feitos em Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, também se estenderam até Coronel Sapucaia e Capitán Bado.

Ao entrar na avenida que dá acesso às duas cidades, a reportagem encontrou uma viatura da Polícia Civil, com um policial ostentando uma metralhadora.

Os policiais parecem ter consciência, porém, que estão ali mais para dar alguma sensação de segurança à população do que para inibir criminosos com armamentos muito mais potentes.

Marcas de bala de fuzil na fachada da única delegacia da cidade brasileira lembram bem desse fato.

Nas delegacias das duas cidades, mesmo com reforço vindo da capital, os policiais continuam intimidados por crimes cada vez mais brutais.

Com frequência, agentes da polícia paraguaia são mortos pelos criminosos, mas, entre as forças de segurança, costuma reinar o entendimento de que os alvos morreram porque tinham ligação com o crime.

A fim de evitar essa cooptação, Capitán Bado troca todo o corpo de policiais a cada semana. Isso porque algum tempo a mais do que isso no mesmo lugar pode ser o suficiente para que algum agente vire alvo do mundo criminoso.