BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O movimento de viés golpista do presidente Jair Bolsonaro seguiu vivo fisicamente em Brasília após a manifestação do 7 de Setembro.

Mais de cem caminhões ocupavam nesta quarta-feira (8) a Esplanada dos Ministérios, sendo usados para pressionar pela derrubada do bloqueio que dá acesso ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao Congresso Nacional.

O movimento tem o dedo de empresas do agronegócio de Goiás, Santa Catarina e São Paulo. A maioria dos caminhões estacionados no canteiro central e nas vias da Esplanada trazia a identificação delas.

O trânsito seguia bloqueado e, até o começo da noite, havia grande quantidade de manifestantes bolsonaristas em frente aos ministérios.

O clima era de hostilidade a jornalistas e aos policiais militares que faziam a barreira que impede o acesso ao STF e ao Congresso.

Diferentemente da terça (7), a quarta-feira foi um dia útil para o STF.

Os ministros retomaram a votação sobre a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas. A tese, que altera diretamente os critérios para demarcação, com prejuízos a populações tradicionais, é encampada pelo governo Bolsonaro e pela bancada ruralista no Congresso. A sessão foi suspensa, e o assunto voltará à pauta do plenário nesta quinta (9), com o voto do relator, ministro Edson Fachin.

O Supremo é o principal alvo de Bolsonaro e de seus apoiadores que compareceram às manifestações em Brasília, no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Os manifestantes que seguiam em Brasília, a bordo de caminhões, falam abertamente em invasão ao STF, em fechamento da Suprema Corte e em prisão dos ministros, dando sequência ao discurso golpista de Bolsonaro.

Os manifestantes chegaram a tentar invadir o Ministério da Saúde na manhã desta quarta. Funcionários ficaram assustados com a violência empregada pelos apoiadores do presidente, que tentaram agredir jornalistas.

Na noite de segunda (6), caminhões e ônibus derrubaram duas barreiras montadas pela PM e invadiram a Esplanada. Nos últimos dois dias, houve forte pressão de caminhoneiros e manifestantes para derrubar a última barreira existente, na altura do Itamaraty.

Com os veículos ligados e buzinaço, os grupos bolsonaristas tentavam avançar pela via que dá acesso ao STF e ao Congresso, mas a PM vinha conseguindo conter a invasão.

A presença dos caminhões virou um problema de segurança pública de difícil solução. Integrantes da Secretaria de Segurança Pública do DF fizeram reuniões ao longo do dia para tentar encontrar uma solução para a desocupação da Esplanada dos Ministérios.

Não havia previsão de uso de força para retirada dos caminhões, segundo integrantes do comando da PM. Eles diziam aguardar o fim do ato, que não tem previsão, para tentar nova negociação para retirada dos veículos.

Funcionários da secretaria ouvidos pela reportagem relatam que havia quatro movimentos bolsonaristas cadastrados com carta branca para manifestação na Esplanada até o fim da tarde desta quarta.

As autoridades de segurança, no entanto, não estavam conseguindo contato com os seus representantes para tratar da retirada dos caminhões.

Já ficou claro para essas autoridades que a maioria dos caminhões e ônibus não tem relação com os movimentos cadastrados. Muitos tinham estrutura para permanência na via, com barracas, material de cozinha e comida.

A reportagem contou 101 caminhões estacionados no canteiro ou nas duas vias paralelas da Esplanada dos Ministérios. E havia um padrão nessas frotas: vários veículos com as mesmas características e que pertencem a grupos econômicos, como consta na plotagem feita nos carros.

Pelo menos quatro caminhões de grande porte estacionados na Esplanada carregavam as inscrições do Grupo Brasil Novo, sediado em Florianópolis. A empresa é especializada em transporte rodoviário, com boa parte dos serviços voltada ao agronegócio.

Outros 17 caminhões carregavam a identificação “Arroz e Feijão Grão Dourado”, uma empresa sediada em Piracanjuba, no interior de Goiás.

Havia ainda três caminhões que pertenceriam a duas empresas no nome dos mesmos empresários: Irmãos Chiari Agropecuária e Dez Alimentos.

Além das empresas ligadas ao agronegócio, dez caminhões colocados bem em frente ao Congresso, antes da grade de isolamento, tinham a inscrição da empresa Pro Tork, do Paraná. A empresa fabrica capacetes para motociclistas. Um dos capacetes é feito para "patriotas" e os caminhões reproduzem essa linha de produto.

A reportagem não conseguiu contato com as empresas. E, pelo clima de hostilidade com a imprensa, decidiu não abordar os responsáveis pelos caminhões na Esplanada.

Uma fileira de caminhões foi disposta rente à grade que isola o Congresso de ponta a ponta. Buzinaços eram feitos o tempo todo.

Em comparação com o 7 de Setembro, havia menos policiais e menos carros do Batalhão de Choque da PM na blindagem da via almejada pelos bolsonaristas.

No fim da tarde desta quarta, três autoridades da Secretaria de Segurança foram até a grade do bloqueio na altura do Itamaraty para tentar uma negociação.

O prazo para a permanência de movimentos bolsonaristas na Esplanada acabou no fim da tarde, conforme acordado previamente, mas os manifestantes e os caminhões permaneciam no local.

Os integrantes da pasta pediram a alguns bolsonaristas a retirada dos veículos, como condição para abertura das grades. Os manifestantes, por esse acordo, poderiam seguir na via que leva ao STF e ao Congresso, escoltados pela polícia.

Porém não houve acordo. A conversa durou menos de meia hora, e os integrantes da secretaria deixaram o local.