BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PL) fez um passeio por Brasília na manhã deste sábado (29) e se recusou a falar sobre o fato de ter faltado ao depoimento à Polícia Federal determinado pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Também não comentou relatório da PF que apontou que houve crime com sua participação na divulgação de dados sigilosos de uma investigação, no ano passado.

Na quinta-feira (27), o magistrado havia mandado o chefe do Executivo depor no dia seguinte no âmbito do inquérito que apura o vazamento de investigação da PF sobre suposto ataque ao sistema do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Bolsonaro, porém, não compareceu à oitiva e apresentou recurso, que foi negado por Moraes. A polícia concluiu que o presidente cometeu crime neste caso, mas não o indiciou por respeitar posicionamentos recentes do Supremo de que pessoas com foro só podem ser indiciadas mediante prévia autorização da corte.

Neste sábado, Bolsonaro evitou tratar do assunto. O presidente deixou o Palácio do Planalto no início do dia para acompanhar a solenidade de ingresso de novos alunos do Colégio Militar de Brasília.

Ele participou da cerimônia porque uma das novas estudantes é sua filha mais nova, Laura.

Como mostrou a Folha, a herdeira do presidente teve tratamento especial para conseguir entrar na escola. Após pedido de Bolsonaro ao comandante do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira, ela foi aceita no colégio sem passar pelo processo seletivo a que são submetidos meninos e meninas que disputam as vagas abertas na unidade de ensino.

Depois da cerimônia, o chefe do Executivo percorreu alguns pontos da capital, entre eles a Catedral. Em nenhum momento ele comentou a ausência no depoimento determinado por Moraes.

Ao sair da Catedral de Brasília, Bolsonaro parou para falar com jornalistas. Ele não respondeu às indagações sobre o depoimento à PF e, perguntado sobre o número de mortos pela pandemia da Covid-19, limitou-se a dizer que comprou vacinas, que foram oferecidas para a população "de forma voluntária".

Ele também admitiu que pode haver conflitos em disputas estaduais em sua base eleitoral no pleito deste ano, mas se negou a dar detalhes sobre as tratativas para 2022. "Não vou entrar nessa questão política, vai me tomar o tempo todo, temos muitos problemas no Brasil. Está na mão do presidente do partido, meu filho Flávio também está tratando do assunto".

Ele também voltou a falar sobre reajuste dos servidores, mas, mais uma vez, não disse qual decisão irá tomar.

"Tem um montante reservado [no Orçamento], que por enquanto está congelado. Ninguém, no momento, falou que vai conceder, da nossa parte, ou não, o reajuste. O que eu peço que todos pensem é o seguinte: os recursos são poucos, estamos saindo, espero, de uma pandemia, e se você puder colaborar com uma categoria ou outra, eu acho que devemos fazê-lo. Eu posso dar 1% para todo mundo ou reconhecer o valor de poucas categorias agora. Outras também merecem e têm o seu valor, mas não temos recursos para todo mundo."

Nas redes sociais, Bolsonaro e os filhos também não comentaram a ausência no depoimento e a ordem de Moraes. No ano passado, o presidente chamou o ministro de canalha em um ato com apoiadores que defendem o fechamento do Supremo. Depois, divulgou carta recuando.

Em decisão publicada na quinta, o magistrado afirmou que o chefe do Executivo não indicou local, dia e horário dentro do prazo para ser ouvido pelos policiais e, por isso, teria que comparecer na Superintendência da PF no Distrito Federal, às 14h do dia seguinte para o interrogatório.

Em 29 de novembro, Moraes havia dado prazo de 15 dias para que a oitiva fosse realizada. Quando o tempo estava para esgotar, a AGU (Advocacia-Geral da União) pediu a prorrogação sob a justificativa do excesso de compromissos de Bolsonaro, mas indicando que o presidente compareceria ao interrogatório.

Moraes, então, concedeu mais 45 dias de prazo, que se esgotaria nesta sexta (28).

Na última quarta (26), a AGU pediu para Bolsonaro não ser interrogado. Moraes, porém, não atendeu à solicitação do órgão, mandou o presidente prestar depoimento na quinta e justificou que a AGU alterou o posicionamento às vésperas do fim do período previsto.

Bolsonaro, no entanto, faltou à oitiva e apresentou recurso contra a decisão do magistrado minutos antes do horário marcado para o interrogatório.

Menos de uma hora depois, Moraes recusou o recurso sob o argumento de que já havia passado o momento de apresentação desse tipo de pedido.

O ministro, porém, tem pouca margem para aplicar sanções contra Bolsonaro por ter ignorado sua ordem.

Integrantes do Supremo avaliam que Moraes não precisava ter determinado hora e local para o presidente depor, de um dia para outro, sendo que não havia, em tese, a obrigatoriedade de o presidente depor.

Existe no governo o sentimento de que ele quer medir forças com o mandatário, mas agora está ficando com poucas saídas.

Uma delas, considerada drástica por técnicos e especialistas, é abrir uma apuração de ofício para saber se Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade ao descumprir ordem judicial.