BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro disse nesta quinta-feira (10) que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, prepara um parecer para desobrigar o uso de máscara por quem já foi vacinado contra a Covid ou quem já se infectou com o coronavírus.

"Acabei de conversar com um tal de Queiroga, não sei se vocês sabem quem é. Nosso ministro da Saúde. Ele vai ultimar um parecer visando a desobrigar o uso de máscara por parte daqueles que estejam vacinados ou que já foram contaminados para tirar este símbolo que, obviamente, tem a sua utilidade para quem está infectado", afirmou o presidente.

O anúncio foi feito durante um evento no Planalto de anúncio de medidas para o setor de turismo. Queiroga não estava na solenidade, mas estava no palácio.

O ministro da Saúde participava de uma reunião com os colegas Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil), Tereza Cristina (Agricultura), Marcos Pontes (Ciênciar) e Carlos Alberto França (Relações Exteriores) para discutir o uso de instalações de fábricas veterinárias para a produção de vacinas contra a Covid.

O presidente seguiu dizendo que, pelo protocolo adotado no Brasil, quem está infectado deve ficar em casa. "Se bem que para nós, o nosso protocolo para quem está infectado, este, sim, fica em casa. Não aquele fica em casa todo mundo. A quarentena é para quem está infectado, não é para todo mundo, porque isso destrói empregos, mata de outra forma o cidadão", afirmou.

Apesar da proposta do presidente, uma pessoa pode transmitir o vírus mesmo que esteja vacinada e sem apresentar sintomas. Como ainda há pouquíssimos vacinados no Brasil e alta circulação do coronavírus, o risco de alguém que tomou a vacina contrai-lo e transmiti-lo, mesmo sem ficar doente, para quem ainda não esteja protegido é bem grande.

Ao chegar à cerimônia, Bolsonaro estava de máscara. Um segurança que antes da chegada do mandatário estava sem o equipamento de proteção foi orientado a cobrir o rosto e retirou uma máscara cirúrgica do bolso do paletó.

Pouco depois do anúncio do presidente, Queiroga concedeu no início da noite desta quinta uma entrevista na frente da Ministério da Saúde. "Queremos que [o não uso da máscara] seja o mais rápido possível, mas para isso precisamos vacinar a população brasileira e avançar", disse o ministro.

Questionado se avalia que houve pressão de Bolsonaro, Queiroga negou. "O presidente não me pressiona, não. Sou o ministro dele e trabalhamos em absoluta sintonia. E assim funcionam as democracias do regime presidencialista. E o presidente sempre nos aconselha de maneira muito própria. E levo a ele os subsídios para que tenhamos as melhores decisões em relação à saúde pública", disse.

Desde que assumiu o cargo, Queiroga tem se posicionado a favor do uso de máscaras. "A pátria de chuteiras agora é a pátria de máscaras", disse no fim de março.

Ao longo dos últimos meses, o ministro também tem dito que o uso de máscaras e distanciamento são importantes como medidas de prevenção e para a retomada da economia.

Questionado em depoimento na CPI da Covid nesta semana se orientava o presidente a usar a proteção, o ministro respondeu: "Evidentemente que sim".

No entanto, aos senadores ele evitou comentar sobre a postura de Bolsonaro, afirmando que se trata de "ato individual". "Não vou fazer juízo de valor a respeito da conduta do presidente da República", disse, ao ser questionado sobre a insistência do presidente em promover aglomerações e a ficar sem máscara.

"O presidente da República não conversou comigo acerca da atitude dele. Eu sou ministro da Saúde. Eu não sou um censor do presidente da República”, afirmou.

Em maio, o Ministério da Saúde lançou uma campanha sobre medidas de prevenção contra a Covid, com o mote "o cuidado é de cada um, o benefício é de todos". Um dos vídeos da iniciativa traz a família do personagem Zé Gotinha de máscaras e cita outras ações, como lavar as mãos e distanciamento.

"Zé Gotinha sempre foi o símbolo da campanha de vacinação no Brasil. Vamos vacinar a população brasileira e aderir às medidas não farmacológicas, como o uso de máscara", disse o ministro na ocasião.

Em seu discurso nesta quinta, Bolsonaro também insistiu no tratamento com hidroxicloroquina e ivermectina, que não têm eficácia contra a Covid. O presidente voltou ainda a defender a tese de supernotificação de casos de Covid pelos estados em busca de mais recursos federais. No início da semana, o presidente citou um documento de servidor do TCU (Tribunal de Contas da União) e foi desmentido pela própria corte.

Mas, ao contrário do que diz Bolsonaro, as mortes por Covid devem ser ainda maiores do que apontam registros oficiais.

A declaração de Bolsonaro foi dada horas depois de a CPI da Covid no Senado aprovar a quebra de sigilo telefônico e telemático dos ex-ministros Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e de integrantes do chamado "gabinete paralelo", estrutura de aconselhamento do presidente para temas ligados à pandemia e com defesa de teses negacionistas.

A fala não estava prevista. A cerimônia já havia sido encerrada pelo cerimonial quando o presidente dirigiu-se ao púlpito para falar.

Em seu discurso, Bolsonaro elogiou ex-assessor presidencial Arthur Weintraub, alvo da CPI por causa do gabinete paralelo. "Com todos esses problemas do 'fique em casa, a economia a gente vê depois', não errei uma sequer. E não foi da minha cabeça, foi conversando com pessoas como um anônimo entre nós por muito tempo, o Arthur Weintraub", disse Bolsonaro.

O presidente afirmou que seu ex-assessor aprendeu "o básico de japonês em 48 horas". "Trazia documentos para mim, pesquisas, fazia contatos e a gente foi aprendendo o que era aquilo", afirmou Bolsonaro.

O presidente também citou reunião realizada no ano passado com médicos defensores do tratamento precoce e defendeu os participantes do encontro transmitido ao vivo pelas redes sociais do presidente.

"São heróis, pessoas que estavam tentando salvar vidas, e não se acomodando embaixo da cama, como muitas autoridades fizeram pelo Brasil. Isso para a CPI agora é gabinete paralelo", afirmou Bolsonaro.

À noite, em sua live semanal, Bolsonaro voltou a falar em sua intenção de desobrigar o uso de máscara. "A gente não pode viver numa opressão a vida toda sobre isso daí", disse o presidente.

Bolsonaro disse que não impôs nada ao ministro da Saúde. "É o que eu falei para o Queiroga agora. Eu não impus nada para ele, né? Se bem que eu tenho que também dar minhas peruadas ali, no bom sentido. É possível a Saúde apresentar um estudo da desobrigatoriedade da máscara para quem já foi vacinado ou para quem já foi contaminado e curado, poxa? Ele falou: 'é possível'. É possível, vamos fazer isso. Vamos ficar refém de máscara até quando?", disse o presidente.

Bolsonaro reclamou que a obrigatoriedade do uso de máscaras "está servindo para multar a gente" e reclamou do governador João Doria (PSDB-SP), seu desafeto político.

"Estou sendo ameaçado agora de ser multado em São Paulo se não usar máscara, 'porque aqui ele é um cidadão igual a outro qualquer'. Ô, hipócrita, você não respeita o seu povo, rapaz, não respeita ninguém. Vai ameaçar presidente da República? Tem moral para mais nada, completamente descredibilizado no seu estado", afirmou o presidente, que fará um evento com motociclistas em São Paulo no fim de semana.