RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Enquanto os blocos de rua clandestinos se espalham pelo Rio de Janeiro, as autoridades silenciam. Apesar da proibição, diversos grupos se reúnem e fazem a festa parados ou saem pela cidade desde a noite de sexta (25), mesmo observados por policiais e guardas municipais.

O clima é de improviso, com músicos que se juntam nas ruas e foliões circulando entre um bloco e outro, seguindo informações nas redes sociais. Sem estrutura de banheiros, esquema especial de limpeza ou cadastramento de ambulantes, têm deixado as ruas da região central com lixo e xixi.

Apesar disso, o prefeito Eduardo Paes (PSD), que anunciou a proibição em janeiro após uma reunião junto aos organizadores formais dos blocos, não escreveu nem deu nenhuma declaração pública sobre o assunto.

Nesse período, ele usou sua conta no Twitter principalmente para falar sobre a greve que paralisa o sistema do BRT (corredores exclusivos de ônibus no município) e para compartilhar informações sobre a guerra na Ucrânia.

Na manhã deste domingo (27), enquanto um cortejo passava pelo Morro da Conceição, no bairro da Saúde, ele publicou uma foto de sua mesa de trabalho: "Bom dia! Bora trabalhar pelo Rio! Dormir é para os fracos. Bom domingo."

A Secretaria Municipal de Ordem Pública (Seop), responsável por monitorar o Carnaval e pela atuação da Guarda Municipal, também divulgou apenas imagens de patrulhamentos na orla da zona sul da cidade e em pontos turísticos.

Questionada sobre o motivo de não estar havendo dispersões, a pasta enviou vídeos e respondeu que "desmobilizou cinco blocos clandestinos entre ontem e hoje. A Seop destaca que as fiscalizações têm sido feitas com base na conscientização e no diálogo".

O governador Cláudio Castro (PL), a quem a Polícia Militar está subordinada, tampouco falou sobre a folia. Sua última publicação no Twitter foi na sexta-feira, também sobre a guerra na Ucrânia. No Instagram, postou sobre a tragédia das chuvas em Petrópolis.

Procurada, a Polícia Militar apenas afirmou que "segue à disposição dos órgãos municipais para apoiar nas ações de ordenamento em todo o estado". A corporação disse neste sábado (26) que mobilizou um efetivo extra de 8.760 policiais.

Na manhã daquele mesmo dia, a reportagem soube de ao menos duas ocasiões em que carros da corporação passaram com as sirenes ligadas e fizeram com que as pessoas se dispersassem.

Nas horas seguintes, porém, os grupos de foliões foram crescendo e se espalhando pela região, fazendo com que a fiscalização se limitasse à presença de viaturas e agentes nos entornos. Blocos parados também acontecem desde a noite de sexta.

Neste sábado, por exemplo, um desfile começou em frente ao prédio do 5º Batalhão da Polícia Militar, na praça da Harmonia. Antes da saída, um policial chegou a filmar a movimentação no local, com centenas de foliões fantasiados, mas não houve intervenção.

Pela noite, após a passagem dos cortejos, o cenário nas ruas era de muitas garrafas e latas no chão e poças de urina nos cantos dos edifícios. Procurada, a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) afirmou que não montou operação especial para o Carnaval.

"Na eventualidade de foliões e blocos não autorizados ocuparem ruas, a Comlurb realiza a limpeza normalmente, uma vez que a companhia está sempre preparada para qualquer situação relacionada à limpeza urbana na cidade", respondeu.

Como não há uma organização prévia, músicos se juntam e, na base do boca a boca, mais gente vai chegando. É comum que os desfiles que começam num lugar se "desmembrem" em mais de um trajeto, arrastando mais pessoas que migram de um cortejo para outro.

Neste domingo, o bloco que percorre o Morro da Conceição também chegou a ter a presença de uma equipe grande com cães e cassetetes, mas sem ocorrências. É comum que os músicos parem de tocar quando a viatura passa e, logo depois, o som volte.

"Festa privada - só vacinado", diz um estandarte roxo no meio da multidão que toma as ladeiras fantasiada e coberta de glitter, ironizando a permissão de eventos privados. Ele também passou em frente a um prédio do Ministério da Guerra, observado por militares.

As únicas regras impostas pelo prefeito Eduardo Paes são o uso de máscara em local fechado (teoricamente com multa de R$ 621) e a apresentação de comprovante de vacinação, o que muitas vezes não tem sido cumprido.

As multas para empresas organizadoras das festas que eventualmente não exigiram o passaporte de imunização variaram entre R$ 3.105 e R$ 6.210 neste início de ano, segundo o município. Escolas de samba barraram a Folha em eventos de Carnaval após reportagem ter relatado falhas na cobrança.

O secretário Brenno Carnevale (Ordem Pública) disse nesta sexta à reportagem que não havia previsão de multa para participantes em blocos clandestinos. Porém, se organizadores fossem identificados, afirmou, poderiam sofrer multa administrativa de cerca de R$ 1.000.

No sábado, ele reiterou que cortejos na rua não estão permitidos, ainda que parados. "No entanto, nossa atuação está pautada mais pela conscientização e pelo diálogo. Estamos evitando, por exemplo, fechamentos de vias importantes ou transtornos para a locomoção da cidade como um todo", afirmou.