WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - A Casa Branca anunciou nesta quinta-feira (28) uma nova versão do plano Build Back Better, que inclui programas sociais e ambientais, no valor de US$ 1,75 trilhão (R$ 9,83 trilhões). A proposta inicial previa gastos de US$ 3,5 trilhões (R$ 19,62 trilhões), ou seja, quase o dobro do plano reformulado.

O recuo é uma tentativa de resolver os embates internos no Partido Democrata, o mesmo do presidente Joe Biden, que já duram meses. A ala progressista quer programas mais abrangentes, enquanto dois senadores centristas defendem menos gastos públicos. Como a maioria democrata no Senado é apertada (50% mais o voto de desempate), os planos não podem ser aprovados sem união completa da legenda.

O novo valor está dentro do que o senador Joe Manchin, um dos que discordam do plano original, havia dito considerar aceitável. No entanto, ele ainda não endossou publicamente a nova proposta.

A ala progressista também analisa os próximos passos. Além da retirada de itens, uma das questões é que a Casa Branca divulgou uma estrutura básica do plano, não o projeto de lei em si, que traz detalhes dos programas. A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, afirmou que o texto final está sendo debatido.

O grupo progressista adotou a estratégia de forçar o governo a avançar com o pacote social, usando como forma de pressão o bloqueio à aprovação de outro plano, de cerca de US$ 1,2 trilhão em investimentos em infraestrutura, que já foi aprovado no Senado em agosto e depende apenas de aval da Câmara, Casa na qual os democratas têm maioria. Pelosi disse que planeja votar o pacote de infra até domingo (31).

Na manhã desta quinta, a deputada Pramila Jayapal, líder da ala progressista na Câmara, e o senador Bernie Sanders, independente que vota com os democratas, ressaltaram a posição da ala: só votarão a favor do pacote de infraestrutura se houver certeza de que o Build Back Better também será aprovado.

Se aprovados, os pacotes serão o maior conjunto de investimentos sociais feitos em décadas nos EUA e poderão ajudar a reduzir a desigualdade social, um dos temas da campanha eleitoral de Biden à Presidência. O plano prevê ao todo US$ 1,75 trilhão (R$ 9,83 trilhões) em investimentos sociais e ambientais e mais US$ 100 bilhões (R$ 560 bilhões) para gastos relacionados à imigração.

​A proposta atual do Build Back Better inclui US$ 400 bilhões para a universalização do acesso à pré-escola para crianças de três e quatro anos de idade e ampliação do acesso infantil a planos de saúde.

O avanço do acesso à pré-escola, que deve beneficiar seis milhões de famílias, ajudará as mulheres a terem mais tempo livre para trabalhar e estudar, uma vez que o alto custo da educação infantil faz com que muitas mães tenham de ficar em casa cuidando dos filhos o dia todo.

"Este é o primeiro pacote legislativo na história do pais que valoriza o papel central das mulheres, especialmente o das mulheres não brancas, na economia, ao relacionar a recuperação econômica ao avanço delas no trabalho", avalia Patrick Gaspard, diretor do think tank Center for American Progress.

Haverá também verbas para aumentar o acesso à moradia, a planos de saúde e auxílios para trabalhadores de baixa renda. Na área ambiental, haverá US$ 555 bilhões (R$ 3,1 trilhões) para investimentos em transição para energia limpa, como a adoção de carros elétricos, o que ajudará os EUA a atingir as metas para reduzir a emissão de poluentes nos próximos anos.

Por outro lado, ideias como ampliar de forma substancial o acesso gratuito a universidades, reduzir o preço de medicamentos e garantir licença médica remunerada para trabalhadores ficaram de fora.

"Ninguém conseguiu tudo que queria, incluindo eu. Mas isso são compromissos e consensos, o único caminho para fazer grandes coisas em uma democracia", disse Biden, em discurso na Casa Branca, após se reunir com legisladores no Congresso, na manhã desta quinta.

"O Build Back Better criará milhões de empregos, fará a economia crescer, investirá em nossa nação e transformará a crise climática numa oportunidade para competir e vencer a competição do século 21 contra a China e todos os outros países do mundo", defendeu o presidente, em discurso na Casa Branca.

Biden se pronunciou pouco antes de embarcar para a Europa, onde participará do encontro do G20 e da COP26. O presidente buscou acelerar a aprovação do pacote antes do início da conferência ambiental, mas ainda não se sabe quando o tema será votado oficialmente.

Um dos pontos polêmicos é como custear os gastos. O governo propõe um aumento de impostos sobre grandes empresas e milionários. A expectativa é a de que as novas taxas gerem uma nova arrecadação de cerca de US$ 2 trilhões (R$ 11,2 trilhões), o que, em tese, evitará que o país aumente seu déficit.

Haverá um imposto mínimo de 15% sobre lucros de grandes corporações, uma taxa de 1% sobre a recompra de ações feitas pela própria empresa que as emitiu e penalidades para multinacionais americanas que moveram suas sedes para paraísos fiscais. O plano também prevê aumentar em cinco pontos percentuais o imposto sobre rendimentos pessoais acima de US$ 10 milhões (R$ 56 milhões) por ano, e em mais três pontos percentuais para quem ganha acima de US$ 25 milhões (R$ 140 milhões).

A elevação das cobranças, bem como a falta de detalhes sobre como isso será feito, gera críticas de empresários. "Seguimos preocupados que taxas e projetos multi-trilionários podem levar a uma grande inflação de curto prazo, reverter nossa recuperação econômica e colocar empresas americanas em desvantagem competitiva", disse Neil Bradley, vice-presidente da US Chamber of Commerce, que representa empresas em Washington.

Haverá eleições parlamentares em novembro de 2022, e alguns representantes não querem ficar marcados por terem aumentado impostos nem desagradar doadores de campanha.

Ao mesmo tempo, a demora no avanço das propostas vai reduzindo as chances dos democratas de terem resultados claros a apresentar aos eleitores na votação do ano que vem. Um mau resultado no pleito pode fazer com que os democratas percam as maiorias estreitas que possuem, o que dificultaria ainda mais a aprovação de projetos nos dois anos finais do mandato de Biden.

NOVA VERSÃO DO PACOTE SOCIAL E AMBIENTAL PREVÊ:

US$ 555 bilhões para o combate às mudanças climáticas, como incentivos para fontes de energia menos poluentes

US$ 400 bilhões para universalizar o acesso à escola para crianças de três e quatro anos; a medida deve atender mais de 6 milhões de crianças e garantir recursos para os seis primeiros anos do programa

US$ 200 bilhões em abatimento ou créditos de impostos para famílias com crianças; válido por um ano

US$ 165 bilhões para reduzir o gasto com plano de saúde e ampliar o acesso a planos gratuitos e de baixo custo (Medicaid e Medicare)

US$ 150 bilhões para ampliar o acesso a cuidados para idosos

US$ 150 bilhões para ampliar o acesso à moradia com preço acessível; inclui a construção de 1 milhão de casas

US$ 100 bilhões para os serviços de imigração, a serem usados para acelerar a análise de vistos e de pedidos de asilo, entre outras medidas

US$ 40 bilhões para treinamentos de trabalhadores e bolsas de ensino superior