SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A avenida Paulista é sinônimo de multidão. Palco de grandes manifestações e eventos, aberta para o lazer aos domingos, repleta de atrações culturais, cheia de pessoas apressadas em suas calçadas largas durante a semana. E, onde tem muita gente reunida, também sobra oportunidade para ladrões.

A avenida mais famosa de São Paulo é líder em furtos de celulares na capital, é o que mostra levantamento feito pela reportagem com base na análise de boletins de ocorrência registrados na cidade no ano passado. Na via, foram 2.804 registros na Polícia Civil. Os boletins, porém, não são distribuídos de maneira uniforme ao longo do ano.

A análise mostra que grandes eventos favorecem picos desse tipo de crime na Paulista, uma das vias mais monitoradas por câmeras na cidade, tanto pela segurança pública quanto pela privada.

No ano passado, a avenida foi palco de sete grandes manifestações contrárias ou favoráveis ao presidente Jair Bolsonaro (PL). Nesses sete dias somados, foram 1.034 furtos, o equivalente a 37% do total registrado no ano.

Apesar da concentração de registros em datas específicas, o cotidiano também é complicado para quem trabalha na Paulista. A compradora Daniele Caselatto, 33, conta que entrou para a estatística em um dia chuvoso do final de 2021.

Ela relata que caminhava entre o prédio onde trabalha e o local em que deixa o carro quando recebeu uma trombada de três rapazes. O que parecia algo acidental revelou-se um furto. "Quase me derrubaram. Não percebi na hora [que tinham levado o celular], só quando cheguei ao estacionamento", diz. "Fiz o BO, mas não recuperei. Infelizmente, tive que comprar outro."

Além das trombadas seguidas de eventuais "pedidos de desculpa", são muito comuns também os ataques feitos por pessoas em bicicletas, nas calçadas. Quase todo mundo que trabalha na Paulista tem relatos de conhecidos ou colegas de trabalho que já perderam o celular dessa maneira.

A secretária Cássia Tancredo, 50, conta que duas amigas tiveram os aparelhos furtados assim, no cruzamento com a alameda Campinas. "É mais perigoso no fim da tarde. Não pode mostrar, porque eles já vêm em cima", conta.

Embora as ocorrências se espalhem pela avenida como um todo, é nas proximidades do Masp (Museu de Arte de São Paulo) que elas se multiplicam -mesmo havendo uma base fixa da Polícia Militar em frente ao parque Trianon, do outro lado da rua.

O padrão do crime na Paulista se repete em grande parte da região central de São Paulo. Nas proximidades da Luz, das praças da República e da Sé, no transporte sobre trilhos e em qualquer canto onde haja aglomeração, mesmo em tempos de pandemia, o risco de ser furtado é grande.

Fabio Fortes, ex-presidente do Conseg (Conselho Comunitário de Segurança) Santa Cecília, é morador de Higienópolis e anda diariamente pela região central da capital paulista. Para ele, a situação é crítica há bastante tempo.

"Uma coisa que me irrita profundamente é quando autoridades dizem que não devemos portar o celular ou ficar com o aparelho aparente", afirma. "É uma clássica demonstração da insegurança pública. Como alguém fala que não posso andar com o telefone na rua?", questiona.

Segundo Fortes, não é difícil identificar os ladrões que transitam pelo bairro. "Você vê eles se preparando para dar o bote. O que deveria ter é o P2 [policial militar à paisana] para surpreendê-los", afirma.

Há exemplos que confirmam a impressão de quem lida com segurança pública sobre a relação entre aglomerações e esse tipo de modalidade criminosa.

A Covid-19 tirou dos paulistanos a diversão do Carnaval em 2021. Em 2020, porém, a estatística explodiu justamente em fevereiro, com os blocos. Foram 16.276 casos em apenas 29 dias, mais que o dobro da média mensal dos últimos três anos (7.825).

Professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Rafael Alcadipani levanta outro ponto sobre a incidência de furtos no centro. Ele diz que os criminosos que agem nas regiões ricas e centrais da cidade, mais bem policiadas, evitam abordar violentamente as vítimas por ser mais fácil acabarem detidos.

Isso, porém, não impede que, mesmo em bairros ricos, ocorram assaltos com abordagens violentas, como no último dia 14, quando dois suspeitos, com roupas de entregadores de aplicativo, assaltaram três vítimas na região dos Jardins (zona oeste).

O 78º DP (Jardins) investiga o caso e, até a publicação deste texto, não havia prendido ninguém, conforme última atualização da Secretaria de Estado da Segurança Pública.