R DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O violento assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em março de 2018, acabou por inspirar e fortalecer movimentos de formação e defesa das mulheres na política.

O Instituto Marielle Franco, por exemplo, nasceu com a missão de preservar a memória da vereadora e estimular ações em defesa de mulheres negras, LGBTQIA+ e periféricas. Em 2020, a organização não-governamental realizou uma pesquisa para identificar violência sofrida por candidatas negras na disputa municipal. Foram ouvidas 142 mulheres, em 21 estados brasileiros.

Criado em 2019, o movimento MDN (Mulheres Negras Decidem) se dedica à formação de lideranças políticas. Ao lado do Instituto Marielle Franco e do Instituto Alzira, participa do conselho consultivo da Secretaria da Mulher.

Em junho, a Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados lançou o Observatório Nacional da Mulher. Em parceria com entidades da sociedade civil, o observatório faz atualmente o perfil das ocupantes de cadeiras nas assembleias legislativas e câmaras municipais de todo o país.

Coordenadora do Instituto Alziras, Roberta Eugênia explica que a tarefa é mapear candidaturas e produção de dados também com o objetivo de coibir a violência contra mulheres na política, além de identificar as barreiras à sua permanência na vida pública.

"A partir do diagnóstico, o objetivo é produzir respostas às práticas de violência contra mulheres", afirma.

Lista **** Ainda segundo Roberta Eugênia, a importância do tema na agenda pública agora é incontestável.

A repercussão internacional do assassinato de Marielle permitiu a reativação, em dezembro de 2018, do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, graças à celebração de um termo de colaboração entre entre o Ministério de Direitos Humanos e o Centro dos Direitos Humanos de Nova Iguaçu, gestor do projeto. Desde 2013, o programa não operava no estado do Rio de Janeiro.

Coordenador-geral do programa, o advogado Felipe Carvalho afirma que o convênio atende a 78 pessoas no Rio de Janeiro, dez delas vítimas de violência política. O trabalho vai da instalação de câmeras de segurança e requisição de carros blindados ao encaminhamento para adoção de medidas protetivas, além de assessoria jurídica e psicológica.

"É necessário dar uma resposta à repercussão internacional do assassinato de Marielle", justifica ele.

Após recebimento de ameaças, a irmã de Marielle, Anielle Franco, é atendida pelo programa desde março de 2021. A vereadora Benny Briolly (PSOL), trans e negra, também é uma das defensoras de direitos humanos sob seu guarda-chuva.

O valor do convênio é de R$ 5 milhões em três anos. Entre os incluídos no programa, estão ainda quilombolas, indígenas, comunicadores e vítimas de intolerância religiosa.

Coordenadora-adjunta do programa, a psicóloga Larissa Chamarelli explica a necessidade de acompanhamento do processo psicossomático da pessoa cuja integridade física está sob ameaça, para evitar que vejam esse risco com naturalidade. Segundo ela, existem etapas perigosas --como a negação da ameaça e a naturalização da situação--, quando os protegidos relaxam as medidas de segurança.

"Existe o risco de o protegido aceitar sua condição e baixar a guarda", diz ela.

O programa conta com apoio de organizações como o IDMJRacial (Iniciativa Direito a Memória Justiça Racial), a ONG Criola e a Justiça Global.

Coordenadora da Criola, Mônica Sarmento ressalta a necessidade de oferecer uma rede de proteção às vítimas de violência política.

Também em resposta ao assassinato da vereadora, a Prefeitura do Rio criou, em julho, o Comitê Marielle Franco de Prevenção e Enfrentamento à Violência Política Contra as Mulheres. Segundo a secretária de Políticas e Promoção da Mulher, Joyce Trindade, é preciso impedir a repetição de crimes políticos contra mulheres. A meta é contar com ações concretas já no ano que vem.

O decreto que cria o comitê define as formas de violência política contra a mulher. Segundo o decreto, entende-se por violencia politica contra a mulher atos direcionados a candidatas, eleitas, nomeadas ou ocupando cargo político, durante ou após as eleições, ou, ainda, no exercício de outra natureza de representação política, com o intuito de cercear, impedir, encurtar ou suspender sua plena participação político-partidária nos Poderes Legislativo e Executivo.

Ainda de acordo com o decreto, de 23 de julho, "a violência política pode ser caracterizada por práticas como: perseguição, distinção, exclusão, restrição, assédio, ameaça, agressão física, psicológica ou sexual ou indução a tomar decisões contrárias à sua vontade".

Além das secretarias municipais, compõem o comitê: o Instituto Marielle Franco; o Movimento Mulheres Negras Decidem (MND); a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro; o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Rio de Janeiro; a Câmara Municipal do Rio de Janeiro; a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ); o Instituto Alziras e a Justiça Global.

DENUNCIE

Vítimas podem denunciar eventos de violência política nos Parlamentos em que atuam ou em delegacias de polícia.

Mulheres também podem reportar agressões pelo Ligue 180 (basta teclar 180 de qualquer telefone fixo ou celular). O serviço está disponível 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados.

A ligação é gratuita.