RIBEIRÃO PRETO E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Quase quatro meses após ter decretado lockdown, Araraquara (a 273 km de São Paulo) novamente terá restrições totais depois de superar, pelo terceiro dia consecutivo, os índices estabelecidos de contaminação pela Covid-19 para manter o comércio aberto.

O anúncio foi feito na manhã desta quinta-feira (17) pela secretária da Saúde, Eliana Honain, por meio das redes sociais da prefeitura. O novo lockdown em Araraquara terá início às 12h de domingo (20) e prosseguirá até as 23h59 do dia 27.

Nesta quinta, foram recebidos os resultados de 856 exames, dos quais 202 foram positivos, o que representa 23,59% do total.

Decreto publicado pelo prefeito Edinho Silva (PT) estabelece que, se a taxa de positividade passar de 20% nos testes em geral (sintomáticos e assintomáticos) ou 30% nos sintomáticos por três dias seguidos ou cinco alternados em uma semana, as atividades econômicas serão fechadas por no mínimo uma semana.

A reabertura ocorrerá após três dias consecutivos com taxas abaixo de 20% (sintomáticos) ou 15% (na testagem em geral).

Na quarta-feira (16), a testagem geral indicou 20,04% de casos positivos (199 de 993 exames) e, na terça (15), 22,97% (91 casos em 396 amostras). Segundo a prefeitura, o decreto foi construído com especialistas em epidemiologia e participação da Opas (Organização Pan-Americana de Saúde).

A alta de casos positivos, atendimentos na UPA (Unidade de Pronto Atendimento), internações e mortes nas últimas semanas já indicava que novas restrições seriam adotadas, como a Folha mostrou no início do mês.

Na noite desta quinta, Edinho disse acreditar que será a última vez que a cidade tomará medidas do tipo e que a decisão foi tomada como forma de evitar o colapso na rede hospitalar.

“Seguramos a pandemia até o mês de maio, mas é evidente, se não tem barreira imunológica, toda vez que flexibiliza, permite a circulação de pessoas, a contaminação volta a crescer. E estamos vendo no Brasil inteiro aquilo que se chama de terceira onda. A contaminação cresceu em todo o Brasil”, afirmou Edinho.

Na primeira quinzena de junho, a cidade registrou 2.588 casos de Covid-19, ante os 2.780 do mês inteiro de março, após a aplicação do primeiro lockdown.

“Historicamente, 20% dessas pessoas [dos 202 casos positivos desta quinta] vão demandar leitos hospitalares, portanto 40 pessoas. Pela média histórica, dessas 40 pessoas, por volta de 10 vão precisar de leitos de UTI. Nenhuma cidade do porte de Araraquara pode ter 10 pacientes/dia demandando leitos de UTI”, disse.

Na região de saúde de Araraquara, 88 pessoas morreram em maio sem conseguir vagas em UTI.

Primeira cidade a decretar lockdown após a aceleração de casos com a detecção da variante brasileira, Araraquara viu despencar os índices nas semanas seguintes e passou a ser utilizada por pacientes de mais de 30 municípios que, sem leitos, foram internados em seus hospitais.

Porém, o número de moradores da cidade internados voltou a crescer. No início do lockdown, eram 209, número que despencou para 69 em abril, mas que já está em 116, conforme dados desta quarta-feira.

No total, são 212 internados atualmente, dos quais 96 são moradores de outras cidades —49 deles estão em UTIs.

A cidade acumula 483 óbitos em decorrência do novo coronavírus, com 24.071 casos. Desse total, 281 foram registrados no último dia 10, o dia com mais casos em toda a pandemia.

“Nós só chegamos a esse número porque tem transmissão em Araraquara e só se evita a transmissão com distanciamento social. Nós viemos avisando a população que a situação estava complicada, que nós estávamos observando o não cumprimento das regras e a população infelizmente fez a escolha”, disse a secretária.

Um dos problemas que a cidade enfrenta é com a realização de festas clandestinas até mesmo em meio a lavouras de cana, alvo de uma força-tarefa criada em Araraquara.

A UPA da Vila Xavier, polo de triagem para casos na cidade, registra nas últimas semanas índices próximos aos de fevereiro, quando fez lockdown, com até 369 atendidos num dia. O pico foi em 8 de fevereiro, com 417.

O primeiro lockdown de Araraquara começou em 21 de fevereiro, com restrições mais severas nos sete primeiros dias, que incluíram o fechamento até de caixas eletrônicos de bancos e postos de combustíveis.

Barreiras também foram implantadas nas principais vias da cidade para frear a circulação de pessoas.

Houve protesto de um grupo de comerciantes contra as restrições e clientes arrombaram as portas de quatro bancos no primeiro final de semana do lockdown, para sacar dinheiro nos caixas eletrônicos.

A cidade, e mais especificamente Edinho, também viraram alvo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que usou a distribuição de alimentos da Ceagesp na cidade para atacar o lockdown.

“Nesse momento, comboio parte da Ceagesp rumo a Araraquara/SP, levando alimentos para aqueles vitimados pela política do ‘fique em casa que a economia a gente vê depois’”, escreveu o presidente numa rede social. Edinho disse que o presidente poderia fazer isso sem "humilhar as pessoas".

Nesta quinta, após a prefeitura afirmar que faria novo lockdown, um grupo de ao menos 50 pessoas foi à sede do governo protestar contra Edinho.

O prefeito disse que enfrenta a pandemia com transparência, sem maquiar números e sem omitir informações.

"Não podemos aceitar a disputa político-partidária em relação à pandemia, porque nós estamos diante de um fato que é inquestionável. A pandemia se caracteriza porque é uma doença mundial. Não adianta acharmos que é a disputa partidária que vai construir saídas para esse momento. Ao contrário", afirmou.

Até esta quarta, 38.121 dos 238.339 habitantes de Araraquara receberam as duas doses da vacina contra a Covid-19, o que representa 15,99% da população. A primeira dose foi aplicada em 75.227 pessoas.

A cidade vai manter normalmente nos dias de restrições a vacinação. Nesta quinta, iniciou a imunização de pessoas de 58 e 57 anos e, na sexta (18), será a vez de quem tem 56 e 55 anos. Sábado haverá vacinação de pessoas com 54 anos ou mais.

“Só temos dois caminhos: vacinação e distanciamento social. Infelizmente, Araraquara escolheu um remédio amargo para controlar a pandemia”, disse a secretária da Saúde.

De acordo com ela, municípios da região deverão ser procurados para tentar uma estratégia comum no enfrentamento da alta de casos de Covid-19.

“Para ver o que a gente consegue de parceria em relação aos municípios da região para a gente enfrentar, porque o problema não é só em Araraquara, mas na região como um todo.”