SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O cruzamento entre o tatuzão e a galeria de esgoto na marginal Tietê, em São Paulo, deveria estar presente na análise de risco da construção da linha 6-laranja, com uma solução adequada para evitar o rompimento ocorrido nesta terça-feira (1º). Essa é a opinião de especialistas ouvidos pela reportagem, que ressaltam a importância de esperar a conclusão das investigações para saber o que, de fato, aconteceu.

O presidente do Instituto de Engenharia, Paulo Ferreira, afirma que as análises de risco são feitas justamente para evitar situações como a que aconteceu nesta terça. "O pessoal do tatuzão, quem fez o projeto e executou a obra, fez uma análise de risco. Se fosse um risco exagerado, poderia ser feito um escoramento naquele trecho, descobriria o interceptor [tubulação de esgoto] para verificar as condições", diz.

Por qual motivo então uma obra de escoramento ou outra solução não foi implementada, a partir do fato de que o tatuzão passaria a três metros da tubulação de esgoto, em uma área com terreno instável? "A análise de risco foi otimista. Se está certo ou errado, vai para o lado que você acha", afirma.

Segundo Ferreira, não há dúvida de que foi a passagem da toneladora que provocou a ruptura, "senão romperia um quilômetro à frente ou atrás".

Ferreira afirma que, diante de tudo o que aconteceu, é ainda um alívio o fato de ser uma galeria de esgoto, e não uma tubulação de fornecimento de água. "Se fosse uma adutora, seria um caos. Ali perto passa uma de 2,5 m de diâmetro, uma travessia do Tietê com alta pressão", explica.

O especialista diz que, da forma como aconteceu e sem entraves burocráticos, a retomada das obras no local deve ocorrer em, no máximo, dois meses e meio.

O presidente do Instituto de Engenharia diz que túneis são obras de risco, principalmente quando construídos em fundos de vales, onde há muita argila, como são os casos das marginais Tietê e Pinheiros. "Quando faz em rocha, não tem um grande drama. Agora, quando faz em cidade, em argila, o problema passa a ser muito mais complicado", diz. "São obras de risco elevado. Às vezes, tem um pouco de ousadia. Um colega ou outro que toma uma decisão equivocada."

Apesar de reconhecer que erros acontecem, Ferreira ressalta que as obras realizadas pelo metrô em São Paulo são seguras. "Pelo porte da cidade, pelo tamanho do metrô e a dificuldade que temos, os acidentes são pequenos", afirma.

O presidente do Instituto de Engenharia cita as obras da linha 1-azul, que passa sob a praça da Sé e parte do centro velho, debaixo de construções antigas, como um exemplo. "A engenharia brasileira é muito consciente, bem-feita, principalmente em obras pesadas, com grandes estruturas", diz.

Sócio da MMF Projetos e especialista em áreas de risco e geotecnia, Luciano Machado diz que, neste momento, qualquer afirmação é uma especulação. "É uma fatalidade, tem que identificar o que aconteceu. Se foi alteração no projeto ou algo que se deixou de prever, o que não acredito", afirma.

Apesar da cautela e de ressaltar que projetos do metrô têm um rigoroso controle de segurança, Machado afirma que a análise de risco deveria ter detectado problemas naquele ponto. "Isso deveria ter sido previsto em projeto ou obra, que a rede estava ali e poderia ter uma sobrecarga, ficar sem apoio", diz.

Segundo Machado, a característica do solo não pode ser apontada como fator determinante para o rompimento. "A gente está trabalhando em outras linhas do metrô e teve que desenvolver projetos de solução para solo mole recentemente. É totalmente previsível. A gente foi, fez investigação, viu o tipo de solo que existia, o tratamento e a obra segue normalmente", explica.

O especialista em áreas de risco diz também que a instrumentação geotécnica e estrutural foi fundamental para detectar a movimentação do terreno com antecedência e evitar uma tragédia. "Fez a interdição das marginais, tirou todos os trabalhadores de dentro do túnel. Foi possível prever antes de ocorrer o rompimento, a ponto de não ter vidas perdidas. Imagina se fosse de surpresa, com carros caindo?"

Machado afirma que também havia instrumentação na época do desmoronamento do canteiro de obras do metrô em Pinheiros, em 2007. Naquela ocasião, porém, quando sete pessoas morreram, não houve tempo para a retirada das vítimas, segundo o engenheiro.

O especialista em áreas de risco diz que o objetivo da engenharia é fazer a obra mais segura possível, com o custo necessário para ser viável, mas não vê uma redução de gastos como algo que possa ter concorrido para o desabamento desta terça. "Nesse caso, posso garantir que não foi economia. Imagina o custo excedente que se terá agora? Para resolver o problema do rompimento, estamos falando de dias, quem sabe meses", afirma.

A Secretaria de Transportes Metropolitanos e a Sabesp afirmaram durante a tarde que acompanham o incidente no poço de ventilação da linha-6 laranja e o rompimento de uma tubulação de esgoto ao lado das obras.

Segundo os dois órgãos, foi criado um comitê que investigará a causa do acidente e fará estudos com soluções técnicas para a realização de obras de drenagem, recuperação para a retomada das obras do metrô, conserto da tubulação e da marginal Tietê.

A obra é de responsabilidade da Linha Uni e da Acciona, que afirmam que estão no local dos fatos para apurar o que aconteceu. "Todas as medidas de contingência já foram tomadas. Parte do asfalto da marginal Tietê cedeu e, por questão de segurança, a pista está parcialmente interditada", disse, em nota.