SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma estrela do arsenal aeroespacial russo sofreu sua primeira baixa em combate neste fim de semana na guerra da Ucrânia: ao menos um avião de ataque e caça-bombardeiro tático Sukhoi Su-34 foi abatido ao norte de Kiev.

Não é uma perda casual, e também indica que a guerra aérea sobre a Ucrânia está entrando em uma nova fase —e isso não deverá trazer boas notícias nem para quem está no solo, nem para as forças de Vladimir Putin.

O avião estrelou um vídeo amplamente circulado no sábado (5), que o mostrava caindo sobre uma área residencial de Tchernihiv, nordeste da capital, sob aplausos de moradores. As fotos dos destroços permitiram identificar a aeronave com precisão.

Trata-se do Su-34 número 24 Vermelho, que foi entregue à Força Aérea em 2018, sendo baseado em Tcheliabinsk (Sibéria). Na sexta (4), houve o relato da derrubada de outro modelo desses em Volkhonava, perto de Kiev, mas não foram apresentadas ainda provas.

Segundo a imprensa ucraniana, o avião foi derrubado por um míssil disparado pelo lançador portátil russo de origem soviética Igla-S, que é usado no Brasil. Isso significa que ele estava voando a menos de 5 km de altitude, e há uma implicação militar clara.

O Su-34 é um potente bimotor de longo alcance, equipado para ataques de precisão a alta altitude. Se ele voava baixo e, pelas imagens disponíveis carregava bombas de queda livre FAB-500, supunha ser possível fazer um ataque próximo ao solo sem oposição.

Desde o começo da guerra, em 24 de fevereiro, a Rússia vem degradando as defesas aéreas ucranianas. Mas lançadores portáteis e antigos sistemas móveis soviéticos são quase impossíveis de erradicar. Aí entram duas considerações.

Primeiro, que os russos pode ter abusado da soberba na ação. Mais importante, contudo, é que eles estão dispostos a expor as joias de sua coroa nessa nova fase. Até aqui, o grosso dos ataques aéreos de Putin foi conduzido com mísseis de cruzeiro Kalibr, balísticos Iskander, e antirradar Kripton.

Ao empregar a aviação tática, os riscos de perdas sobem no ar, mas principalmente na terra. Sendo alvos de bombas "burras" como a FAB-500, civis ucranianos vão enfrentar áreas maiores de destruição, o que condiz com a ideia de que Putin quer agora pressionar Kiev a se render por meio de uma campanha mais intensa e com cercos a grandes cidades.

O próprio Ministério da Defesa da Rússia fez questão de marcar a inflexão com um vídeo, publicado no YouTube neste domingo (6), mostrando um Su-34 e um caça-bombardeiro Su-25 levantando voo com bombas para atacar a Ucrânia.

Há um preço de prestígio a pagar. Além do Su-34, há relatos não confirmados que só no sábado outras sete aeronaves foram abatidas, incluindo caças multimissão Su-30SM e helicópteros de ataque Mi-24/35M.

Um dos últimos protagonizou outro vídeo que viralizou no fim de semana, sendo derrubado próximo ao solo. Ali, a curiosidade adicional é sobre qual lançador de míssil portátil foi usado, se o Stinger americano, cuja entrega foi anunciada por países europeus e pelos EUA, ou se foi um Starstreak britânico —a rapidez e o rastro de fumaça sugerem o segundo, que até agora não se sabia estar em mãos de Kiev.

Analistas militares ocidentais vinha mostrando surpresa pela falta de ação da Força Aérea no conflito e com o fato de que os ucranianos ainda operam, aparentemente, seus aviões e defesas de forma algo limitada. Agora será a hora de aferir se o fiasco da aviação russa na guerra de 2008 contra a Geórgia, que levou à reorganização e modernização das Forças Armadas de Putin, realmente deu certo na prática.

No caso do Su-34, o piloto ejetou e sobreviveu, mas seu navegador ficou preso no cockpit e morreu. O aviador foi capturado e sua imagem começou a circular, causando espanto pela notoriedade da figura: trata-se de um certo major Krasnorutchev, que em 2016 posou ao lado de Putin e o ditador Bashar al-Assad na base russa de Hmeimin, na Síria.

Com outros pilotos e aviões russos ao fundo, celebrava-se a intervenção militar promovida por Putin em 2015 para salvar o aliado na brutal guerra civil iniciada em 2011. Moscou teve lá a oportunidade de experimentar suas aeronaves e táticas em combate real, e o Su-34 ganhou rapidamente fama de avião implacável.

Seu desempenho foi tão elogiado que a produção, tímida desde sua entrada em serviço em 2014, foi acelerada e até a guerra havia 122 unidades distribuídas por três regimentos, segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (Londres). Com velocidade máxima de 1.900 km/h, ele carrega até oito toneladas de bombas e mísseis, em diversas configurações.

O Su-34 é um redesenho do clássico Su-27, cujo primeiro protótipo voou em 1990, no ocaso soviético. Ficou anos em desenvolvimento. Ele tem uma cabine amplamente modificada: maior, com o fundo mais achatado e toda blindada. Os dois pilotos vão lado a lado, enquanto em versões bipostas de variantes modernas como o Su-30 eles ficam um atrás do outro.

Seguindo uma tendência de forças modernas, ele deverá substituir outros modelos mais antigos, como o venerando avião de ataque a solo Su-25 e o Su-24, ambos em ação na Ucrânia, dos dois lados do conflito.