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Imagem ilustrativa da imagem Londrina 86 anos - No ano da pandemia, um aniversário atípico

Londrina 86 anos

No ano da pandemia, um aniversário atípico

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No ano da pandemia, um aniversário atípico

Londrina completa 86 anos em 2020. O ano atípico que nos colocou em face de várias realidades cujo enfrentamento postergamos com o acelerado do relógio, uma delas é que a cidade é feita por pessoas e as pessoas são de carne, osso e fragilidades. O ano parou as pessoas. Sem circulação, sem contato físico, sem rotina e com todos os planejamentos dos indivíduos abalados, a cidade se viu antropomorfizada, na figura da mãe natureza, que acolhe, que salva, mas insegura e contaminada.

A terra mãe desse londrinense encasulado, guerreiro, que teve de tomar decisões difíceis, como ficar em casa, abrir mão de projetos, de sonhos, de convívio social, de investimentos; muitos ainda se despediram de entes queridos e abriram mão de uma despedida.

É ainda mãe do mesmo londrinense que se reinventou, enxergou outros nichos para empreender, que acelerou inovações dentro de suas universidades, escolas e casas, que superou a Covid, que mudou hábitos e tradições para agregar o “novo normal” a seu cotidiano. É essa Londrina-mãe-natureza, orgulhosa, que abraçou os seus em 2020, entre as perdas e ganhos que chega em dezembro com um sentimento único de esperança. Ávida para chacoalhar a poeira do isolamento social, da quarentena, com seu povo de volta às ruas, às aulas, aos encontros com os amigos e parentes queridos, reavendo o tempo perdido e matando a saudade de seus festivais, da arte de rua, de galeria, de cinema, teatro e dança. Dos eventos desportivos e dos jogos do Tubarão; saudade de Expô, de Filo, de Estádio do Café, do Ouro Verde, dos shows na Concha Acústica.

E o octogésimo sexto ano de Londrina se completa, enquanto ela embriona em seu ventre a vontade da reconstrução e do reencontro e planeja um novo Marco Zero na sua história e de seus filhos. Junta as primeiras pedras para refazer os planos de futuro, com um olho na vacina e outro na ajuda mútua, amor ao próximo, olhando os aprendizados do passado recente e pronta para colocar a criatividade a serviço do renascimento cultural, social, econômico, político, da saúde, infraestrutura e esportes. O Especial Transmídia 86 anos de Londrina aborda com um olhar intimista de seus repórteres, os filhos, londrinenses de sangue e de coração que contam como as suas mudanças individuais de 2020 alteraram o relacionamento com a cidade.

E como pensam que os reflexos dessas íntimas transformações de rotinas podem mudar o coletivo social da cidade no futuro. A reportagem traz também um vídeo-poema em texto e voz de Celia Musilli, dirigido pelo cineasta Carlos Fofaun, no qual dança a ausência, no Cine Com-tour vazio em desmonte, o Ballet de Londrina. Em homenagem a todas as famílias das vítimas da Covid-19. Projetado para o grande público nas paredes do edifício Julio Fuganti na véspera do aniversário de Londrina pelo grupo do Rever A Volta como parte do festival Ciclos. As páginas da edição impressa e multimídia foram ilustradas por artistas do Graffiti de Londrina, Zulian, Amanda, Korneta, Kenia e Huggo, que trouxeram para dentro do caderno a arte na qual a tela costuma ser as ruas. A capa é uma obra de arte do grafiteiro, renomado internacionalmente, Carão, a convite da FOLHA.

Cinco artistas plásticos fizeram intervenções artísticas na cidade para o jogo interativo real Caça ao Tesouro e espalharam a arte de galeria pelas ruas de Londrina. São eles: Carlos Kubo, Cassio Onohara, Chico Santos, Dani Chineider e Danillo Villa. Além dos fotojornalistas Isaac Fontana, Gustavo Carneiro e Roberto Custódio, que dedicaram seus olhares mais sensíveis para capturar as fotografias que ilustram o quebra-cabeça dado como presente pela Caça ao Tesouro. As várias ações do Especial Transmídia GO uniram profissionais de diversos segmentos convidados pela FOLHA e foram viabilizadas pela parceria e apoio de empresas parceiras com o objetivo de levar para a público uma mensagem: a Londrina do futuro se constrói com união e o trabalho e envolvimento de todos. E a todos que se envolveram nessa homenagem a Londrina e seus filhos, nosso muito obrigada.

A reportagem da FOLHA segue nas próximas páginas essa trilha de esperança, de olho no amanhã, com a bagagem de ontem, a coragem de hoje e a certeza que “ali logo em frente a esperar pela gente a vacina está”, parafraseando Toquinho. Obrigada por ler a FOLHA. Aproveite a edição especial.

(Patricia Maria Alves, Editora na FOLHA)

LONDRINA ESQUADRADA PELO 11º ANDAR

Deveria ser mais uma segunda-feira normal. Em frente ao computador, a missão era duelar com a página em branco e debelá-la após entrevistas por telefone e longas sessões de escrita. Ao longe, o canto estridente de um pássaro roubou a atenção. A corrida para a janela e a busca pelo autor daquele show foi inevitável. Em meio aos prédios, em cima de um para-raios, estava lá o bicho. De penas marrons, olhos mais escuros, um sabiá do campo entoou um repertório curioso.

De asas levantadas, saltava, gritava e, ao fundo, um bem-te-vi o respondia. A impressão é que aquela movimentada avenida JK, ao lado, estava em silêncio.

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A bateria da câmera fotográfica logo foi para a carga na tentativa de capturar aquele momento inédito. Felizmente deu tempo. O cantor fez várias poses e permitiu guardar um registro daquele espetáculo. Acabou que, com a máquina funcionando, as vistas das janelas se tornaram irresistíveis. Companheira de todo o período de isolamento, a Londrina do alto do 11º andar para a Londrina lá de baixo nunca pareceu tão bonita coberta pelo céu azul e infinito.

Ao longo dos últimos oito meses, as imagens do mundo externo são apenas aquelas que a rotina de Londrina mostra nas suas ruas vizinhas ao prédio. A exceção são a tela da TV e as que trazem notícias pelo computador ou celular. A rotina na quarentena impõe a descoberta da resiliência e da paciência àqueles incluídos no grupo de risco. Já a um jornalista oferece a capacidade de ser um observador voraz da vizinhança que até então era pouco percebida pela rotina do que hoje chamamos de “antigo normal”.

A avenida movimentada ao lado, que já foi a pequena rua Jacarezinho, agora funciona como uma espécie de estatística particular sobre o movimento durante a pandemia. Nos primeiros dias, gradativamente, o movimento caía, o som dos carros cruzando o asfalto desapareceu e as arrancadas se tornaram cada vez mais raras. Logo carros de polícia circulavam com o alerta para que as pessoas não deixassem suas casas. Era perigoso. Quando caía à noite, ninguém era visto nas ruas, motorizado ou a pé. A flexibilização cresceu com os meses, mesmo antes do relaxamento dos decretos municipais, e o fluxo do trânsito já parece o normal. Será?

Da esquina próxima, num bar conhecido que antes oferecia um amplo repertório de vozes e músicas aos fins de semana agora passou se registrar o silêncio.

As portas foram cerradas pela falência imposta pela necessidade de manter os clientes afastados. Marretas, picaretas e enxadas substituíram os acordes da música ao vivo e das gargalhadas na calçada. Aquela placa com o nome sacro do estabelecimento foi arrancada e tudo pintado de vermelho. Nem uma nova placa de “aluga-se” foi posta.

Com o passar do tempo, o movimento foi mudando de endereço. Os pontos de encontro passaram a ser as varandas. Cada uma mais iluminada que a outra, mais cheia que outra, mesmo quando as autoridades alertavam para a necessidade de manter firme a solidão das casas. O reencontro com as famílias e amigos para muitos era impossível de evitar. De longe, dava para ver as garrafas de cerveja e, à noite, o brilho da ponta dos cigarros. Gargalhadas para todos os lados.

A VIDA LONDRINENSE PULSA NO PARTICULAR.

A mudança de hábitos foi imperativa. A comida da rua virou artigo de raríssima ocasião – nem precisa se falar do ato de sentar-se numa mesa servida por um garçom. Os passeios de fins de semana viraram saudade, os serviços de streaming se tornaram o principal motivo de diversão – até novos gêneros cinematográficos favoritos surgiram – e as conversas por telefone com os mais íntimos passaram a ser intermináveis. O hábito alterado mais estranho dos tempos de quarentena foi o de jogar o lixo na caçamba. Antes feito em horário nobre, foi convertido em programa da madrugada. Horário de elevador vazio. Aliás, os vizinhos evitados também não são mais os mesmos. Pelo som que atravessa paredes, as chegadas e partidas dos novos moradores do prédio podem ser acompanhadas: um adeus, ou um até logo de forasteiros que aqui estavam por negócios ou estudos que foram suspensos.

Ausente do vai e vem das ruas de Londrina, conectar-se ao mundo pelos meios eletrônicos é imprescindível. É uma Londrina na tela, uma Londrina na janela. Saudades dos que estão longe e mesmo dos mais próximos. Perdas sem despedidas, férias sem viagens, datas sem comemoração. Passaram-se tufões, passaram-se eleições, mas a mudança que mais importa próxima da janela é a descrita pela meteorologia.

(Pedro Moraes, repórter da FOLHA)

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ASSISTA AGORA O DOCUMENTÁRIO COM ZICO, O EX-ATACANTE GARCIA, EX-ZAGUEIRO MARCIO ALCÃNTARA, O EX-GOLEIRO SERGINHO QUE FIZERAM HISTÓRIA NO ESTÁDIO DO CAFÉ E NO LONDRINA ESPORTE CLUBE, ALÉM DE OUVIR AS HISTÓRIAS DO RADIALISTA J.MATEUS QUE NARROU O PRIMEIRO GOL NO CAFÉ EM 1976:

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Ao deus das pequenas coisas

Às vezes penso no deus das pequenas coisas.

Aquele nos ajuda a encontrar sapatilhas, a boneca da infância, o chaveiro de sininho eternamente pendurado nas portas das casas dos pais e dos avós, mesmo quando elas já não se abrem.

Encontrar pequenas coisas perdidas nos alegra.

Quanto alívio ao ver que um copo de vidro não se quebrou.

Mas aí aparecem as grandes perdas que precisam de um deus muito grande que nos console.

2020 foi o ano do grande Deus para nos consolar de mais de 1 milhão e 300 mil mortes pela covid no mundo; mais de 160 mil no Brasil; 377 em Londrina até o momento em que escrevo esta “crônica das mortes anunciadas”, ainda sem ponto final

Pedro e José, Ruth e Solange, dezenas de Antonios e Ritas enquanto rezávamos “Ave Maria, cheia de Graça…agora e na hora da nossa morte, amém.”

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E chegamos a um culto ecumênico abençoando almas e lugares de Londrina.

O homem de 85 anos que não será visto mais pelas ruas. Balanços tocados pelo vento já não recebem mais crianças no Bosque Central. Há um mutismo de vozes infantis em cada parque e as mães às vezes não sabem como explicar aos pequenos que “vô João subiu aos céus, como um balão azul.”

Também há perdas materiais e menos nobres, lugares de celebração da alegria mais vulgar e necessária.

O restaurante que fechou as portas e pelo qual a gente disfarça as lágrimas dobrando a esquina do velho Rodeio que hoje anoitece vazio, com as cadeiras empilhadas. Um rótulo de Brahma ainda resiste no vidro da parede lateral, sujeito ao olhar de quem passa.

Depois foram outros bares, o das Meninas e os de algumas vilas distantes. Pior foi o Cine Com-Tour, onde assistimos há décadas Nasce Uma Estrela e , mais recentemente, Parasita, de Bong Joon-Ho, com aqueles personagens isolados dentro de casa, exatamente como ficamos o ano todo, atentos a notícias de perdas, perdas, perdas e mais perdas.

É preciso um deus para as coisas pequenas e um deus para as coisas grandes,

quando o planeta reza por mais de 1 milhão de pessoas que não tiveram uma “gripezinha”.

Pequenino é o vírus que a olho nu nem se vê, enorme é a dor que a gente sente mesmo sem lupas.

O vírus é um caso de laboratório, a morte é um caso insolúvel, cortado a lâmina.

Mas como os deuses também regem o tempo, reencontramos por um instante as sapatilhas e as bonecas perdidas para dançar a VIDA. Um passo entre a perda mais dolorida e a eternidade com um enorme sorriso de sílabas gritando: até breve, até breve, até breve.

(coro)

“Ave-Maria, cheia de graça, o senhor é convosco, agora e na hora da nossa morte, amém!”

(Célia Musilli, escritora e editora da Folha 2)

A FORMAÇÃO DO ‘NOVO LONDRINENSE’

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Mudanças significativas de comportamento durante a pandemia poderão reger mudanças fundamentais no composto humano de Londrina num futuro próximo?

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Em março, as histórias eram outras. Começamos acreditando no que nos diziam, eventos que vinham de longe. Outros continentes, tudo distante da nossa realidade aqui nesse pedaço de chão no Norte do Paraná. E o que era tão longe, ficou perto. Quem estava tão perto, precisou ficar longe. Tudo mudou. Era o isolamento, em suas inúmeras variáveis. Algo muito novo para uma Londrina cujo povo estava acostumado a fazer quase tudo grudado. O silêncio imposto virou uma orquestra desafinada dentro de cada um, mandando em descompasso o coração, como diria o Alceu. Solidão! Além de ouvir, passamos a escutar. Como está o outro? Dessa escuta, surgiram relatos. Uma tentativa de, através do outro, começar a tentar entender o que será de nós depois que tudo isso acabar. De uma rede emaranhada de contatos que continuamos a colecionar sem saber como vamos nos relacionar novamente. Nos reconheceremos?

Teodoro Santos Bellinello tem treze anos de idade, é um londrinense na idade da adolescência e a pessoa que mais levou a sério os protocolos de saúde de que tenho notícias. Torcedor fervoroso do Tubarão, coleciona camisas e toda vez que o encontrava, tinha uma bola de futebol por perto. Além do esporte, com treinos sérios de futebol duas vezes por semana, o Teo (é assim que todo mundo o conhece) ainda fazia outras atividades: aulas de informática, inglês e todos os compromissos do colégio; já começava a andar sozinho de bicicleta com os amigos por aí. Nem deu tempo para iniciar o campeonato de futebol e veio a pandemia. O Teo ficou em casa – está em casa, há mais de oito meses.

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“O que eu mais sinto falta é de ver as pessoas”, me diz.

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De todos os amigos que povoam a vida de um adolescente, só ficaram dois com quem ele ainda conversa, por telefone. “Com os outros não falo mais. Não tenho o que falar”, confessa. Ele também acreditou que a pandemia ia durar pouco tempo e assim como muitos, não conseguiu fazer aquela programação mental para ficar tanto tempo em casa.

A maneira que o Teo encontrou para passar por tudo isso, o fez desenvolver uma grande dificuldade em se aproximar das pessoas tanto que ele acha que esse será o maior desafio daqui para frente. “Chegar tão perto… Não vou mais conseguir fazer isso por causa da pandemia. Não é mais uma coisa normal. Quando eu saio de casa, fico mal. Hoje sinto medo e fico reparando nos outros; quando vejo alguém sem máscara, que não está se cuidando eu fico longe e fico meio bravo. Por que eles não se importam? Assim isso não vai acabar nunca!”, desabafa.

Durante esses meses, me diz que redescobriu a casa, que fica o tempo todo no computador, joga muito online e essa é a interação cotidiana com outras pessoas: nos chats dos jogos e nas gargalhadas que ecoam pelo apartamento. O assunto das conversas com os companheiros de jogo nunca é sobre a pandemia, que tanto incomoda e assusta o Teo.

Ele também nem pensa em voltar a ter aulas presenciais. “Isso não vai dar certo. As pessoas vão continuar adoecendo”, diz. Entre logins e estratégias de jogo, o Teo continua crescendo. Em março, a chuteira era 40 e agora, precisa de uma número 43; tem muita roupa que não serve mais. Na última foto de família, no dia do seu aniversário, tem um rapazinho mais alto que mãe (que já é alta). Conto que vi a foto e fiquei impressionada e ele acha graça, não se dá conta de como tudo continua mudando e se transformando.

No final da nossa conversa, me revela que até gostaria de estar enfrentando tudo isso de outro jeito. “Eu queria conseguir sair um pouco de casa. Eu sinto medo e daí fico triste. Quando acabar a pandemia, vou precisar de um tempo para me adaptar”. Acho que todos nós vamos precisar…

Um dia, recebo uma mensagem de um amiga. A cada áudio, fico mais e mais consternada. Pessoas importantes para mim passando por situações difíceis sem eu nem ficar sabendo, sem poder fazer nada, sem poder estar presente. Ela me conta do que tinha passado com a filha de 22 anos. Na sua amorosidade, já me anunciava o final feliz antes de entrar nos detalhes. “Agora está tudo bem”. A Luiza Felix tem 22 anos, está no quarto ano de psicologia da Unifil.

O 2020 dela começou com o vigor dos “vinte”, cheio de atividades, compromissos, voluntariado e uma viagem para Vitória, no Espírito Santo, com uma amiga. Foi no avião que leu sobre a Covid-19 pela primeira vez, a doença estava na China. O primeiro pensamento foi para o pai, que mora no Vietnam, mas o que veio a seguir mostrou que, no fim das contas, o pai estava no lugar mais seguro. “Minha vida antes da pandemia estava cheia de compromissos, tão sem tempo e esgotada que fui buscar terapia e meu único horário disponível era de sábado às 8h da manhã”, conta rindo.

Dos planos para esse ano, voltar para a psicoterapia foi o único que se concretizou. Depois de três meses de quarentena, no início de junho, tudo ia bem. A Luiza estava namorando e estudando espanhol online, cheia de trabalhos e provas da faculdade. Até que se sentiu mal no fim de uma tarde de domingo. Dores no estômago, fortíssimas e tremedeira, pressão baixa, tosse e cansaço. “Podia ser Covid-19 e como moro com minha avó que é do grupo de risco, os médicos acharam melhor internar”. Foi uma semana de hospital. “Foi angustiante. Estava isolada, sozinha no meio de uma pandemia. Uma experiência que nunca imaginaria viver. Isso porque ainda tenho o privilégio de ter um plano de saúde, de estar internada em um hospital privado, de não ter sentido sintomas graves e receber muito afeto do meu círculo de convívio. O afeto da minha família, amigos e do meu ex-namorado foram muito importantes para mim”, me diz enquanto recorta flores e mexe com a cola. Tudo isso para o exame dar negativo para a doença.

Um alívio. Mas a experiência mostrou para a Luiza que, além dos cuidados para não ter contato com o vírus, é preciso estar perto das pessoas que são importantes. “Mudar os hábitos de lazer e bem-estar é um processo de constante aprendizado. Não tive nenhuma sequela física, mas emocionalmente, voltei mais atenciosa aos meus autocuidados e prioridades. Foi um momento de desaceleração da vida frenética, de readaptação. Incertezas são importantes porque abrem portas para novas possibilidades. Como você enfrenta essas possibilidades é que faz a diferença”. A pandemia deu de presente para a família uma artista, a terceira de uma geração de mulheres com o olhar treinado para a beleza. “Comecei a tentar explorar esse lado artístico em mim, pintando alguns quadros e a fazendo colagens; tornando esse um momento de conexão aos meus sentimentos e redescoberta. Quando surge inspiração também tento fazer uma receita diferente, mas ainda é algo mais raro”, revela se divertindo com isso e com os jogos eletrônicos que também se tornaram uma alternativa de entretenimento.

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No começo da pandemia, os idosos viram o mundo todo se interessar pelo estilo de vida deles. De uma hora para a outra, eles também tiveram que ressignificar toda uma existência, rever os hábitos construídos ao longo de uma vida e descobrir um modo de usar o bom tempo. Escutar o que eles têm a dizer sobre isso poderia revelar um outro olhar a partir dos olhos de quem já viu de quase tudo na vida.

Julio Gentil, tem 88 anos e quis conversar com ele quando vi uma foto sua, com a filha na piscina, num dia de sol. A legenda era: “uma segunda-feira ensolarada, sem vontade de sair do seu lado; nosso paraíso”. Lógico que quis saber que paraíso era esse! Você vai conversar com a pessoa mais otimista desse universo, me alerta a filha e era a mais pura verdade.

Para o Sr. Gentil, a vida depois da pandemia se resumiria a poder voltar a andar nas ruas de Londrina sem máscara e a chegar perto das pessoas sem ter medo de morrer. “Acho que vai ser bom”, me diz sendo muito objetivo. Isso talvez porque ele se adaptou muito bem a esse período e afirma que não sente falta de nada que tenha sido tirado pela pandemia.

Insisto na parte que falta e ele me conta que sente pelos amigos, um em especial, que faleceu há três meses. “Era um amigão”. Antes de se refugiar na chácara, o endereço do paraíso, ele morava em área movimentada. “Comecei a seguir esse história da pandemia na China, fiquei admirado. Não demorou muito e chegou aqui. Por sorte, posso viver na chácara, em contato com a natureza, sem máscara e só isso já vale um monte”, conta.

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Durante todos esses meses, teve que voltar a Londrina algumas vezes e o estranhamento veio na hora de reconhecer a Cidade onde vive há mais de trinta anos. “Achei que estava entrando numa cidade diferente. Para mim, de repente, ficou grande. Como tudo é longe! As pessoas todas de máscara, foi ficção científica”. Mesmo avisada que o Sr. Gentil é otimista, me emociono ao ouvir ele usar a poesia de Gonçalves Dias para dizer se existe um lado positivo em toda essa situação:

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“A vida é combate,

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos

Só pode exaltar”

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Para ele, quem conseguiu sobreviver a uma calamidade como essa tem que se dar por satisfeito. “Viva a vida intensamente, porque na realidade, a vida não é tão longa quanto a gente acha que vai ser”, ensina. É evidente que a pandemia ainda não acabou e vamos mudar muito. A psicóloga comportamental Denise Matoso me explica que “a principal dificuldade é o medo do desconhecido”. Ela ainda me diz que numa situação como essa, as pessoas tendem a ficar mais ansiosas e com dificuldade em aceitar as mudanças que se fizeram necessárias.

“Cada um está acostumado com a sua vida e está tentando acomodar as modificações de acordo com o que já existia”, completa. Não é possível, de acordo com a psicóloga, traçar um perfil generalizado. São tantas as realidades e elas podem ser muito diferentes entre si. “Não podemos esquecer que muita gente deixou ter renda durante esta fase, isso provoca uma mudança grande na rotina. Algumas pessoas conseguem manter sua saúde mental outros podem desestabilizar. As mudanças foram significativas e as pessoas tiveram que conviver com situações difíceis”, explica. Talvez a empatia seja um sintoma positivo.

Mudanças de comportamento deixam marcas mas é sempre bom saber que temos para onde voltar. Talvez esse lugar era aquele que costumávamos chamar de “comum”. Quando isso tudo passar quero voltar ao Estádio do Café com o Teodoro. “Eu vou conseguir, vai ser normal de novo”, me diz em tom reconfortante.

Talvez a pandemia tenha nos obrigado a criar uma Londrina particular, onde continuamos vivendo de arte e admirando a beleza do céu colorido no fim da tarde. Uma cidade sempre pronta a ser reconhecida, mesmo com as mudanças no olhar impostas por algo que ainda vamos entender um dia. O nosso lugar comum.

(Janaína Ávila, especial para a FOLHA)

UM REENCONTRO QUE NÃO SAI DA CABEÇA

No Samba da Bênção, Vinicius de Moraes declama sobre o violão sereno de Baden Powell:

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“A vida não é de brincadeira, amigo/A vida é a arte do encontro/ Embora haja tanto desencontro pela vida”.

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Vinícius de Moraes · Samba da bênção (Remastered)

O ano – no qual um sul-americano citou outro em um encíclica papal, a Fratelli Tutti – se precipita em sequências de alvoradas febris, anunciando falsamente que o verão chegou.

E, como há mais de oito décadas, esta é aquela parte do ano que guarda o doce compromisso de celebrar Londrina. A terra prometida, o ponto de encontro de sotaques e etnias, de idiomas e sinergias, de conexões e sintonias.

Um vírus letal provocou o divórcio da cidade com seus moradores. É tempo de clausura. Mas do alto da sua maturidade de 86 anos, Londrina alivia as coisas à base de reconfortantes fantasias. A imaginação fértil de uma cidade inventiva garante que a vida será novamente bela nesta terra depois que tudo isso passar

Mas este é o pior ano da história, garante a revista Time, e as coisas não estão ao modo londrinense e seu inveterado talento pelo encontro.

Na escuridão de 2020 e das suas tristes histórias de luto, privações e incertezas, quem vive aqui ficou mais sujeito a mergulhos introspectivos, nos quais foi possível tatear sentimentos ocultos e confirmar a própria identidade.

A Londrina presencial, vigorosa, de braços e abraços fortes, a Londrina do bate papo regado a café e cerveja ou das baladas infinitas dos universitários, das festas pagãs ou religiosas, dos cultos fervorosos ou dos festivais culturais abandonou a realidade e se abrigou no imaginário.

Desaglomerada,

à cidade restou a fantasia do pós-pandemia.

É como se no aniversário de 86 anos, os quase 600 mil convidados estivessem convictos de que é necessário renovar os votos dos pioneiros: a cidade há de continuar pegando no pesado, transpirando, vibrando, criando, articulando, se divertindo, reivindicando, acariciando, reverenciando, barulhenta e inquieta, ranzinza e ambiciosa.

“O que eu mais sinto falta é caminhar. Naquele burburinho da Sergipe, naquela agitação do centro, mas também andar pelos bairros e seus movimentos próprios. E, quem sabe, pegar um ônibus sem olhar o destino dele e seguir até o ponto final, só para observar a cidade passando pela janela”, conta Maurício Arruda Mendonça, dramaturgo e professor de teatro.

Para ele, é preciso fantasiar o futuro para suportar o presente, um tempo de traumas e apreensão. “Estes dias sonhei que estava com meus filhos no supermercado e todo mundo estava sem máscara. Acordei assustado”, conta de forma tragicômica.

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Homem das artes, Mendonça luta para que os fantasmas da pandemia não comprometam a idealização do seu reencontro triunfal com a cidade.

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“Sabe aquele motorista que bate o carro e que depois fica com medo de dirigir? Quero tirar isso da cabeça e imaginar apenas o alívio de viver de novo, aquela respirada profunda de quem estava sufocado”.

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É claro, que não falta o universo da arte cênica nos devaneios confinados, a montagem de um espetáculo, a angústia de divulgar, de encher a casa, a adrenalina de viver uma estreia. “No fundo, o que comove é imaginar a entrada num teatro lotado”. Provavelmente, profetiza, um encontro marcado por novos temas e olhares, com textos que ajudem a digerir esta dolorosa travessia. “O sofrimento coletivo vai subir aos palcos”.

Amanda Cordeiro Higuchi precisa do ambiente urbano vivo para que a mensagem da sua arte seja recebida pelo público. Quando o coronavírus chegou à esquerda do Rio Tibagi, os rituais do grafite foram interrompidos e os sprays silenciaram. Sem eventos para colorir, Narizinho, como é conhecida na comunidade hip hop, se recolheu. Se a arte liberta, a ausência dela aprisiona. “É uma fase muito triste”.

Ainda mais difícil porque a quarentena chegou num momento muito especial, onde o grafite de Londrina ganhava cada vez mais visibilidade e respeito, com obras que ajudavam a entender melhor a importância deste tipo de componente na paisagem urbana.

Na mente de uma grafiteira, a quarentena se parece mais como a interrupção de uma brincadeira abastecida com livros de colorir. “A gente fica pensando naquele muro, naquela parede, no que poderíamos estar fazendo”, explica. No imaginário, a região onde cresceu, a zona sul, em especial o Conjunto São Lourenço e o Jardim União da Vitória. “Mas eu penso muito no centro também, onde gente de todos os bairros transitam”.

Ela acha meio inevitável que sua arte pós pandemia expresse elementos que marcaram 2020. “Acho que vai rolar muito personagem com máscara nos desenhos”, antecipa. Narizinho também tem imaginado como seria bom o despertar de uma cidade mais solidária. “Acho que em algum momento deste tempo todo confinado, as pessoas pensaram de como é bom ter uma casa, de como é importante ter um abrigo quando as coisas não vão bem lá fora”, afirma. “Acho que é preciso então pensar em quem não tem. Eu realmente gostaria que as pessoas retomassem suas vidas com mais consciência dos problemas sociais que a cidade vive”. Aos filhos, ela quer um dia contar que este aniversário da cidade foi vivido em meio a uma guerra, com uma vida reinventada durante as batalhas, mas que muitos resistiram, como resistiram os pioneiros naquele cenário. “Vou dizer a eles: e agora estou aqui para contar a história. Não é bacana?”.

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A atriz Danieli Pereira da Silva, coordenadora do Festival de Dança de Londrina e produtora do Ballet de Londrina, teve uma monumental reversão de rumo quando o isolamento social chegou no primeiro trimestre. O ano da empreendedora cultural seria de muitas viagens, com turnês do Ballet e do seu grupo de encenação contemporânea Agon Teatro, uma jornada que incluía dezenas de cidades. “Francamente, imaginei que seria uma pausa de um mês e que tudo retornaria. Mas quando percebi já estava trabalhando meses de forma remota, recolhida na minha casa e trabalhando muito”.

Como produtora cultural que percorre rotineiramente os espaços culturais e os pontos de encontro mais icônicos da cidade, Danieli lembra que sempre foi dependente deste olhar sobre a urbe para se inspirar

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“Como eu posso ocupar este espaço? Como posso trazer as pessoas para que vivam este lugar? Como eu posso transformar aquele outro com algum espetáculo? Sempre enxerguei a cidade assim”, relata a atriz.

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.Ela sente falta da vista do Igapó, do trajeto até a Funcart, de caminhar pelo Calçadão. “Eu vim pra cá para estudar Artes Cênicas na UEL e eu amo esta cidade, tenho uma relação muito forte com ela e uma saudade muito grande de circular por aí”, confessa.

Quando o trabalha duro, enfim, acaba – nestes tempos de microfone, fone de ouvido e olhar fixo na tela – e, no caso dela isolada e sozinha (ao menos no universo físico), Danieli faz os exercícios de imaginação que são fundamentais para sua saúde mental. “Além das obras concluídas que ainda não vi, eu imagino o pós pandemia com ruas carregadas com muita energia, aquela sensação do voltamos, do sobrevivemos. Com áreas públicas vibrantes, cheia de gente, com muitos espetáculos e gente alegre e com saúde”.

O produtor Bruno Gehring também transita no ambiente cultural e sempre foi uma figura presente nas aglomerações mais concorridas da cidade. Seja nos sets de filmagens, nas festas que promove ou nos eventos de cinema que ajuda a organizar, o pai de família fora dos estereótipos sempre precisou de gente ao lado para tirar seus projetos da cabeça e de gente na frente para que eles fossem bem sucedidos.

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“Foi uma mudança radical. Tudo ficou online de uma hora para a outra. Nosso setor foi o primeiro a parar e, com certeza, será o último a voltar.”

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Ele reconhece que o baixo astral tomou conta da cidade, do Brasil e do mundo com a pandemia, mas lembra que algumas coisas não vão mudar. “Eu faço muitos trabalhos sobre a história da cidade, tenho muito orgulho dela, gosto muito de ser londrinense, de fazer coisas por ela. E isso nós continuamos a fazer e vamos continuar expressando estes sentimentos em projetos que um dia serão realizados, mais cedo ou mais tarde”, conta.

“Muita obra de arte que está sendo feita agora vai ser consumida como representação deste tempo no futuro. Este é um dos aspectos importantes da cultura, que já passava por um momento muito difícil antes da pandemia, com a má vontade governamental”, pondera.

Como em outras cidades, muitos artistas de Londrina sucumbiram com a pausa de 2020. Muitos foram fazer outras atividades. Alguns serão bem sucedidos nos novos ofícios e empreendimentos, enquanto outros vão continuar imaginando quais oportunidades o futuro reserva. “Acho que a volta das aglomerações, da vida cultural da cidade vai ser aos poucos. Não vai ser no fim de semana. Quando todo mundo tiver imunizado, a gente vai entender melhor como será a próxima fase”, aposta Gehring.

De algum modo, uma montanha de dúvidas ainda faz sombra na cidade e dentro de cada confinamento, tão iguais e tão diferentes, florescem fantasias, um sentimento demasiado humano, imagens que ainda seriam pintadas nas pedras das cavernas, se a tecnologia não tivesse tomado conta de tudo de uma forma tão menos singela.

A Londrina que vai chegar aos 87 anos em 2021 já vai sentir os efeitos destes sonhos, que individuais passarão a ser coletivos. E se depender da força e do talento de uma gente que imaginou que aquele sertão seria o melhor lugar para estar no futuro, sonhos não são apenas sonhos. O projeto de uma nova cidade já está sendo desenhado. Que começa a ser concretizado a partir deste ensolarado reencontro que não tarda chegar.

(Lúcio Flávio Moura, especial para a FOLHA)

REPENSANDO O FUTURO

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Como ações em meio ao caos podem contribuir para a construção do amanhã

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Professores saem em busca de alunos na zona rural. Trabalhadores triam materiais recicláveis na luta pela sobrevivência. Profissionais da saúde enfrentam o vírus do negacionismo enquanto pesquisadores se desdobram e apostam na valorização da ciência.

Nas ruas, uma população invisível grita por socorro. Graffitis nos muros exaltam a importância da cultura. Grupo fortalece famílias vulneráveis e dialoga em respeito às diferenças. Mulheres se unem no futebol e partem rumo à Libertadores. Universitário quebra barreiras e desenvolve aplicativo gratuito para a comunidade escolar.

Os fatos listados ocorreram em Londrina em meio a pandemia da Covid-19. A convite da FOLHA, protagonistas do atual momento histórico da cidade fazem reflexões sobre os desafios e as perspectivas para o futuro. Trabalhadores de diversos setores relatam experiências e avaliam juntos como deve ser o engajamento social para a construção do amanhã.

“Tivemos que percorrer estradas para motivar nossos alunos e lembrá-los que não estavam sozinhos. Foi um ano de muitas barreiras, mas o que fica para os professores é que nós estamos em um outro momento da história da humanidade. Quando voltarmos às aulas presenciais, não poderemos ser quem éramos no começo de 2019. A nossa metodologia e a nossa concepção do que é prioridade em cada área de conhecimento foram revistas. Nós aprendemos juntos a importância do outro. Não trabalhamos só as disciplinas, trabalhamos a construção do ser humano.” – Vera Lúcia Moura, pedagoga no Colégio Estadual do Patrimônio Regina. Após vencer as etapas estadual e regional, a escola é finalista na categoria nacional do Prêmio Gestão Escolar 2020, promovido pelo Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação).

“O nosso trabalho é importante porque não só a gente se beneficia, mas ajuda o meio ambiente. A gente está aqui até hoje por causa dos moradores e eles têm se conscientizado sobre a importância da reciclagem. Esperamos que Londrina possa crescer cada vez mais e que os moradores se conscientizem sobre a importância do nosso trabalho. A gente precisa que os governantes não se esqueçam de nós porque muitas famílias dependem disso aqui para o futuro.” – Izabel Santos e Rita de Cássia Souza, trabalhadoras da Cooper Região, cooperativa de reciclagem de Londrina que comercializa, em média, 280 toneladas de material reciclável por mês.

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“Tem sido uma jornada exaustiva. Às vezes, um paciente está bem e tem uma piora muito rápida. Tem funcionários aqui trabalhando dezoito horas direto. Alguns precisam se afastar por apresentar sintomas da doença e outros dobram, triplicam a jornada para tentar atender da melhor maneira possível. O HU [Hospital Universitário] tem recebido muitas doações. Vira e mexe, chega alguma cartinha em agradecimento aos atendimentos. Isso tem sido muito importante para nós. Espero que a vacina apareça logo e que a população, nesse momento e no futuro, se conscientize. Estamos aqui de prontidão, fazendo o nosso melhor, mas dependemos da ação de cada um.” – Thaís Mastellini, enfermeira no Hospital de Retaguarda da Covid-19 no HU de Londrina.

“Todos os setores do município precisam fazer uma aliança para desenvolver ações conjuntas para a população em situação de rua. Os efeitos negativos dessa população afetam diretamente a sociedade como um todo. A população de rua estando bem, toda a sociedade vai se sentir melhor. Espero que, num futuro próximo, as famílias tenham uma moradia, uma condição digna para viver.” – André Luis Barbosa, coordenador municipal do Movimento Nacional da População em Situação de Rua. Segundo ele, cerca de 1.200 pessoas vivem hoje nas ruas de Londrina. André permaneceu nessa realidade por 25 anos. Há três conseguiu o apoio necessário para se restabelecer. Concluiu o ensino médio e vai prestar vestibular para Serviço Social.

“A cultura mudou a minha vida. Se ela mudou a minha vida, pode mudar a vida de qualquer pessoa. Eu tenho a temática de retratar a população preta. A gente não se vê por aí, sabe? Então quando as pessoas passam pelas ruas, elas se identificam, me marcam nas redes sociais e pensam ‘alguém tá me vendo’. Isso é demais. Mas sou produtor cultural e os produtores culturais, no geral, precisam do mínimo de apoio e de incentivo. Isso que eu espero para Londrina. A arte resgata. Só falta o estado entender isso como ponto primordial.” – Tadeu Fernandes Lima Júnior, conhecido como Carão, participa do coletivo Capstyle criado há 17 anos. Em uma das intervenções realizadas em 2020, o artista acrescentou uma máscara de proteção à personagem retratada no Bosque Municipal.

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“O que eu espero para Londrina é que a cultura de paz tenha cada vez mais espaço e que o diálogo seja uma importante ferramenta na solução dos conflitos. No meio da pandemia demos início ao projeto Corre em família. A palavra ‘corre’ significa companheirismo, ressignificação, respeito e empatia. É uma iniciativa do Conselho Tutelar com o apoio de vários representantes da sociedade civil. As famílias que procuram o conselho por vezes trazem angústias e situações que precisam de apoio para garantia da proteção social a crianças e adolescentes. Com a ajuda de facilitadores, os diálogos e círculos restaurativos buscam soluções para essas questões. Muitas vezes o poder público parte de um olhar de que o estado é que sabe o que é melhor para a comunidade, mas é a comunidade que precisa ser ouvida.” – Claudia Catafesta, juíza da Vara de Adolescentes em Conflito com a Lei em Londrina e facilitadora da Justiça Restaurativa.

“Foi um ano muito difícil. Não sabíamos se iria ter campeonato. Aí graças a Deus teve e a gente chegou lá. O que eu espero é um reconhecimento maior, uma colaboração maior na área do esporte.” – Thuany Siridakis, atleta da equipe feminina de Fut7 do Colégio Tsuru Oguido/Londrina Esporte Clube. A equipe foi a terceira colocada no Campeonato Brasileiro de Fut7 Feminino e garantiu uma vaga na Copa Libertadores da América que será disputada em 2021, no Rio de Janeiro.

“Por conta da pandemia, a gente teve uma série de restrições e isso foi gradualmente sendo superado com a ajuda da tecnologia. Eu espero para os próximos anos uma Londrina forte na inovação e desenvolvedora de soluções nessa área. Acredito na importância dos jovens, no empenho para mudar a realidade para melhor. Esse empenho aliado à tecnologia consegue um impacto muito maior. A extensão que eu criei, achei que era uma coisa simples para ajudar um professor que estava com dificuldades, mas isso acabou impactando bastante os professores em geral.”, João Vitor Andrade, Aluno Tutor certificado pela Google e graduando do curso de Ciências da Computação na UniFil. O estudante desenvolveu um aplicativo disponível gratuitamente para facilitar a visualização de perguntas dos alunos durante as aulas on-line pelo Google Meet.

“Para as cidades terem um futuro condizente com a qualidade de vida que se espera é necessário que as administrações assumam uma postura técnica, uma postura de incentivo à pesquisa para que haja a possibilidade de inovação. Que as cidades possam evoluir e absorver os conhecimentos gerados pelas fontes de pesquisa que são as universidades e os institutos técnicos que nós temos. A valorização desses órgãos é fundamental para todos os setores. Precisamos dar voz para que haja efetividade no planejamento urbano.” – Teba Silva Yllana, professora de arquitetura e urbanismo da UEL (Universidade Estadual de Londrina) e coordenadora do Labdoc (Laboratório de Documentação Arquitetônica e da Construção Civil – Luiz César da Silva). O Labdoc foi criado após dissertação de mestrado defendida por ela em 2001 sobre os pioneiros da arquitetura em Londrina: Ivan Jekoff, Léo de Judá Barbosa e Luiz César da Silva.

“Um dos impasses da cidade hoje é a inserção de indústrias. Se a gente olhar o PIB mais recente do município, a indústria tem participação inferior a 18%. A média do Brasil é entre 23% ou 25%. No Paraná está em torno disso também. Ao longo da história, não há uma continuidade para se inserir indústria em Londrina. Em 1962, um observador atento, assessor jurídico da Associação Comercial, já dizia na época que Londrina precisava se concentrar na industrialização porque o café, que era a fonte principal de renda, uma hora iria parar. Mas, se a gente olhar, desde então não houve continuidade. Tivemos passos importantes e retrocessos. Os representantes da cidade precisam fazer uma retrospectiva da história de Londrina para ver o que já foi feito ou planejado para então pensar no futuro da cidade.” – Widson Schwartz, jornalista e pesquisador da história de Londrina há mais de 40 anos.

“A partir do que conheço Londrina, mas sem comparar as gerações, posso dizer que a cidade teve aspectos que teve que superar desde a chegada dos ingleses. O mais importante exemplo foi em 1975, com a geada negra. A principal cultura da cidade ficou destruída e aquilo abalou muito, mesmo assim Londrina conseguiu voltar a crescer. Vejo o futuro com muito otimismo, com a cidade se reencontrando e as relações humanas sendo o pivô desse processo. O londrinense é amável, gosta de abraçar de apertar as mãos. Há o espirito de se importar com o outro e esse será a razão do impulso para retomarmos a normalidade.” – Ailton Nantes, presidente da Câmara Municipal de Londrina

“Do ponto de vista da saúde pública temos um ensinamento para que tenhamos outra postura para os cuidados com nós mesmos. Creio que a crise trará uma mudança de hábitos e atitudes em todas as áreas. Um exemplo é que as pessoas ficaram muito acostumadas a fazer as reuniões de forma remota. Já do ponto de vista econômico a cidade é muito forte, mesmo durante o período de pandemia a cidade teve um salto de abertura de empresas: mais de 5.000, segundo dados da Junta Comercial. Estamos no quarto mês seguido com saldo positivo, no Caged, na geração de empregos. As grandes indústrias voltaram a vir para a cidade. Mesmo num ano difícil. O trabalho que tem sido feito a curto, médio e longo prazo. Vejo um futuro muito promissor. A cidade vive um momento muito especial, que não vivia há muitos anos. A cidade se reorganizou, fez um planejamento, diria que a cidade reencontrou o seu caminho.” – Marcelo Belinati, prefeito de Londrina

(Viviani Costa, repórter da FOLHA)

REDESCOBRINDO O MARCO ZERO

Localizado na Zona Leste, da cidade, onde hoje é a Avenida Theodoro Vctorelli, o “Marco Zero” é o ponto de partida da criação de Londrina. Em 21 de agosto de 1929 a Expedição Smith chegou ao que hoje é um lugar histórico. A comitiva era liderada pelo paulista George Craig Smith, que viajava acompanhado por mais 11 homens.

Na época, não havia ponte ou balsa sobre o Rio Tibagi, o que fez com que o grupo o atravessasse em canoas guiando seus burros pela água. Apesar de Smith ser o líder, foi o engenheiro agrimensor Alexandre Razgulaeff que determinou o exato ponto onde hoje é o marco.

As terras, denominadas de Patrimônio Três Bocas, já haviam sido mapeadas anteriormente, mas a Companhia de Terras do Norte do Paraná enviou essa caravana a fim de iniciar um empreendimento imobiliário e vender lotes. Passaram-se cinco anos até que o patrimônio fosse fundado como município e, por isso, o aniversário de Londrina é comemorado no dez de dezembro, e não no 21 de agosto.

O Marco Zero nem sempre teve esse nome. Ele foi assim batizado pela museóloga Maria Zuleica Scalassara. A placa que ornamenta o local também só foi erguida tempos depois, em 3 de dezembro de 1984, em uma celebração que contou com um coral escolar e a Banda Municipal. Quem cuidou da área verde do monumento por muito tempo foi um funcionário da Companhia, Pedro da Mata. Parte do território ficava em seu quintal, e ele se comprometeu a cuidar e preservar a natureza do local. A mata ocupa 39 mil m2 e abriga seis nascentes. Porém, não só de história vive um dos pontos mais icônicos da cidade. O empresário Raul Fulgencio é um dos protagonistas nesse novo momento da área. Segundo ele, a região que hoje abriga o Complexo Empresarial do Marco Zero ficou abandonada por muito tempo.

O local foi, por anos, uma zona industrial que abrigava a multinacional indústria Anderson & Clayton, depois Indústria Coimbra que beneficiava algodão, depois soja, já teve pool de combustíveis e uma linha férrea. Até, enfim, ser abandonado. Fulgencio pontua que a indústria trouxe desenvolvimento para a região, mas também muitos problemas. “Poluição do ar, sonora, trânsito intenso de caminhões nas avenidas Theodoro Victorelli e Dez de Dezembro e como era a 800 metros do centro da cidade começou a ficar difícil. A região também sofria com o tráfico de drogas, prostituição. Era uma área muito difícil ninguém queria morar ali. As casas eram vendidas a R$15 mil e ninguém comprava”.

Quando então o empresário soube que a área da indústria desativada estava à venda. Ele vendeu uma ideia.

“REDESBRAVANDO” A REGIÃO

“Quando eu fiquei sabendo que estava desativada a indústria, como corretor que sou fui conhecer o local e como muitos londrinenses, eu nunca tinha entrado lá. Quando entrei, fiquei abismado com o tamanho que tinha aquela área, caminhava, caminhava caminhava e aquilo não acabava, foi quando eu pensei ‘isso aqui não pode ser outro empreendimento qualquer’. O centro estava todo tomado, a cidade crescia para todos os lados, menos para a região leste. Era um vazio urbano. E o preço estava muito atraente, mas não estava encontrando comprador. Foi quando eu formei um grupo de empresários que estavam dispostos a investir. E assim, nasceu o Complexo Marco Zero. Nós adotamos o nome histórico para que de alguma forma passássemos adiante essa historia.

O Complexo Empresarial Marco Zero está localizado exatamente a 1,5 Km do centro da cidade em relação à Catedral e ao lado do Terminal Rodoviário José Garcia Villar. O complexo, ainda em construção, conta com o Boulevard Londrina Shopping inaugurado em maio de 2013, loja de materiais e acabamentos Leroy Merlin, hotel e a previsão de um centro de convenções, além da área destinada à construção do Teatro Municipal, a partir do projeto realizado mediante concurso nacional no ano de 2007.

“Nós acreditamos e vimos um futuro à nossa frente de progresso. Tanto que os resultados estão lá, mudou a cara da região. O Complexo Marco Zero democratizou o crescimento da cidade. Hoje ela cresce de norte a sul e leste a oeste. Tem a história de uma moça que me ligou quando da inauguração do shopping e disse que tinha vergonha de morar ali, que em entrevistas de emprego ela omitia o endereço por medo de perder oportunidade e que agora ela tinha orgulho”, conta.

Mas Raul Fulgencio ainda não está satisfeito. Para ele, o sonho só estará completo quando o Teatro Municipal estiver concluído e a Mata revitalizada e aberta ao público. “As pessoas precisam conhecer e viver aquele lugar, escolas levar seus alunos para aprender sobre natureza e história, com segurança. E o Teatro? Eu costumo dizer que Londrina tem os melhores artistas, mas não tem um palco por isso doamos a área do Teatro que é a única obra inacabada do Complexo, e não estarei satisfeito até vê-lo em pé”.

Londrina tem uma história muito recente e nem todos a conhecem, por que boa parte dela não está nos livros e sim na memória viva de seus filhos que ainda trabalham por seu desenvolvimento, a exemplo de Raul, Pedro e José, Ruth e Solange, dezenas de Antônios e Ritas.

(Patrícia Maria Alves, editora da FOLHA e Lara Bridi estagiária)

CAÇA AO TESOURO E OS ARTISTAS PARTICIPANTES

A FOLHA preparou uma homenagem muito especial para Londrina, que completa 86 anos nesta quinta-feira (10), homenagem que se estende para o londrinense.

Um ano atípico, um aniversário atípico. A conjunção desses dois elementos não poderia resultar em um produto “comum”. Por isso, a FOLHA ousou e preparou não um caderno especial do aniversário de Londrina, mas uma edição especial para marcar os 86 anos da cidade. E ousou mais ainda. Preparou uma ação especial que tem o objetivo de permitir ao jornal interação com o público e reforçar a relevância da FOLHA, que durante a pandemia esteve ao lado dos paranaenses, desempenhando o papel importantíssimo de levar informação sobre a pandemia e mostrando como se prevenir do coronavírus – todo o conteúdo referente à doença teve o acesso liberado ao público.

A GENTE SABE QUE INFORMAÇÃO SALVA VIDAS.

Tudo isso foi possível graças ao trabalho em conjunto dos diversos departamentos da empresa. Todos deram uma grande contribuição para um projeto que ficará na história.

A edição especial que circula neste dia 10 tem 40 páginas, sendo 18 delas ocupadas pelo Especial Transmídia Londrina 86 anos.

Transmídia, vocês sabem, significa uma edição muito rica também no site, com vídeos belíssimos, como o vídeo poema gravado no Com-Tour e que mostra o Ballet de Londrina em uma apresentação especial e inédita para a cidade. Essa filmagem, inclusive, foi projetada na parede do Edifício Júlio Fuganti entre as 19 e 21 horas do dia 9 de dezembro, como parte da programação do Festival Ciclo.

Outro ponto alto do projeto é o Caça ao Tesouro, um jogo de descobertas e enigmas criado pela FOLHA especialmente para o aniversário da cidade. Cinco enigmas que decifrados mostraram onde encontrar a “chave que abre o tesouro”.

O prêmio para quem completou a prova é um quebra-cabeça com uma fotografia de um ponto icônico da cidade.

O participante teve das 9 às 14 horas do dia 10 de dezembro 2020 para fazer o circuito, conhecer alguns pontos de Londrina e ganhar o seu prêmio, que tem número limitado e por isso, não dá pra deixar para a última hora. Lembrando que é preciso ficar atento às medidas de prevenção ao coronavírus, utilizando máscaras de proteção e não formando aglomeração. Em cada ponto houve uma intervenção realizada por artistas plásticos convidados.

Ainda tivemos os artistas visuais que ilustraram as páginas impressas e multimídia do especial:

E todos que se dedicaram para que Londrina tivesse o nosso melhor! Abaixo o nome de todos:

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EXPEDIENTE
ESPECIAL TRANSMÍDIA LONDRINA 86 ANOS
10 de Dezembro de 2020
SUPERVISÃO GERAL
Adriana De Cunto (Chefe de Redação)
COORDENAÇÃO GERAL
Patrícia Maria Alves
EDIÇÃO IMPRESSSA E MULTIMÍDIA TEXTOS E PESQUISA
Bruno Codogno, Lara Bridi, Lucio Flávio Moura, Janaina Ávila, Patricia Maria Alves, Pedro Moraes, Viviani Costa; FOTOGRAFIA Isaac Fontana, Gustavo Carneiro, Pedro Moraes, Roberto Custodio, Arquivos Pessoais; EDIÇÃO DE FOTOGRAFIA Sergio Ranalli; ARTES Gustavo Padial, Gabriel Paiva; PARTICIPAÇÃO ESPECIAL GRAFFITI Roberto Junior Carão (Capa), Amanda Higushi, Huggo Rocha, Kenia Kuriki, Korneta, Matheus Zulian; DIAGRAMAÇÃO Anderson Mazzeo, Gustavo Andrade, Luciano Silva, Gilberto Soares; LAYOUT WEB Bruno Codogno;
FILME-POEMA “O DEUS DAS COISAS”
Direção Carlos Fofaun Fortes; POEMA E VOZ Célia Musilli; COORDENAÇÃO E PRODUÇÃO Patrícia Maria Alves; DANÇA Ballet De Londrina Direção Leonardo Ramos, Ensaiador Marciano Boletti, Produção Danieli Pereira, Elenco do grupo Alessandra Menegazzo, Ariela Pauli, Giovana Aversani, Higor Vargas, Ione Queiroz, Lucas Gabriel, Lucas Manfré, Marciano Boletti, Matheus Nemoto, Nayara Stanganelli, Thaisa Morais, Viviane Terrenta e Wesley Silva. Realização FUNCART – Fundação Cultura Artística de Londrina, Prefeitura Municipal de Londrina; Cena do espetáculo “Um Ex…” Coreografia Marcos Leão Música Cezar Frank Ensaiadores Leonardo Ramos e Marciano Boletti Bailarinos Ariela Pauli e Matheus Nemoto; IMAGENS MULTITV CIDADES – Cinegrafia Wilson Schimdt, Produção Giovana Oliveira, Edição Marcos Inocêncio; PROJEÇÃO REVER A VOLTA Realização Palipalan Arte e Cultura, Curadoria Ney Piacentini, Rogério Francisco Costa, Stela Fischer, Valmir Santos, Direção Artística Stefano Di Buduo, Roteiro Raquel Balekian, Produção João Viana Ribeiro, Operação técnica projeção Paulo Cesar dos Santos e Lucas dos Santos;
JOGO INTERATIVO – CAÇA AO TESOURO 86 ANOS
COORDENAÇÃO Patricia Maria Alves TEXTOS Bruno Codogno, Lara Bridi e Patricia Maria Alves PARTICIPAÇÃO ESPECIAL ARTES PLÁSTICAS Carlos Kubo, Cassio Onohara, Chico Santos, Dani Chineider, Danilo Villa; MARKETING Brunno Pirolo; ARTES Eric Grutzmacher Koch e Fernando Cacciolari; ASSISTENTE DE MIDIAS SOCIAIS Marlon Mota; ASSISTENTE DE PRODUÇÃO Filipe Barbosa; GERENTE COMERCIAL Carlos Maistro;
PROJETO JARDIM DOS DESEJOS
Danillo Villa, Julio Vida, Patrícia Maria Alves; Jardineiros
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS
Prefeitura de Londrina, SEMA, CMTU, DGBM, Secretaria Municipal de Cultura, Shopping Comtour, Companhia Sulamericana de Distribuição, Leite Chaves; Raul Fugêncio Empreendimentos Imobiliários. E aos amigos e parceiros que direta ou indiretamente colaboraram para que esse projeto pudesse ser realizado.
DEDICATÓRIA
Esta obra é dedicada à todas as vítimas da Covid-19 e seus familiares.