Perda auditiva é fator de risco para demência e depressão
Diagnóstico precoce e tratamento devolvem a qualidade de vida ao paciente, o que justifica a importância da conscientização sobre o problema
PUBLICAÇÃO
segunda-feira, 04 de novembro de 2024
Diagnóstico precoce e tratamento devolvem a qualidade de vida ao paciente, o que justifica a importância da conscientização sobre o problema
Reportagem local
De acordo com o estudo mais recente realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 10 milhões de cidadãos brasileiros têm algum grau de perda auditiva, o que pode ser um fator de risco para depressão, demência e até expectativa de vida. No entanto, com o tratamento adequado é possível viver bem, o que justifica a importância da conscientização sobre o problema, promovida em campanhas como o Dia Nacional de Prevenção e Combate à Surdez (10 de novembro).
Estudos da Universidade Johns Hopkins, de 2023, revelaram que pessoas com perda auditiva leve têm o dobro de risco de desenvolver demência, ou seja, a perda auditiva não provoca demência, mas pode aumentar o risco e acelerar a degeneração do cérebro, aumentando as chances de doenças cognitivas.
A fonoaudióloga Samar Fadel Azanki Abreu, especialista em audiologia do Centro Médico do Hospital São Francisco, de Cambé (Região Metropolitana de Londrina), explica que isso ocorre, em grande parte, porque o cérebro, ao compensar a falta de audição, se esforça mais para processar sons e acaba comprometendo outras funções cognitivas, como memória e raciocínio.
Outro estudo, conduzido pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e publicado em artigo na revista The Lancet Global Health neste ano, a partir de dados da Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Honduras, México e Peru, revela que 54% dos casos de demência na América Latina podem ser atribuídos a fatores de risco modificáveis. Entre 12 fatores pesquisados, um deles é a perda auditiva.
As causas vão de envelhecimento ao uso de fones de ouvido em volume elevado, de exposição de ruídos no trabalho sem proteção ao acúmulo de cerume, de infecções a traumas e de uso de medicamentos, tumores e causas hereditárias a congênitas.
Segundo Abreu, felizmente, como se trata de fator modificável, há tratamentos que podem melhorar tanto a audição quanto o curso de outros impactos na saúde. Tecnologias como aparelhos auditivos modernos, alguns que podem ser até conectados ao celular, e implantes cocleares são cada vez mais acessíveis e efetivos.
“As intervenções não apenas restauram parte da capacidade auditiva, mas também ajudam a manter o cérebro estimulado, reduzindo os riscos de declínio cognitivo. O uso precoce de tecnologias auditivas pode fazer toda a diferença na saúde mental e cognitiva de pessoas com perda auditiva. Há casos em que medicamentos podem ser utilizados, por isso um check-up anual é recomendado”, destaca.
A especialista reforça a importância de buscar avaliação assim que os primeiros sinais de perda auditiva surgirem, seja dificuldade para entender conversas em locais ruidosos ou a necessidade de aumentar o volume de aparelhos eletrônicos. Ela ressalta que, quanto antes a perda auditiva for tratada, maior é a chance de se preservar a saúde mental e a qualidade de vida do paciente.
INTERAÇÃO SOCIAL
A perda auditiva também pode desencadear quadros depressivos, porque limita a interação social. Em situações como reuniões familiares ou eventos sociais, o esforço de ouvir e entender o que é dito pode ser exaustivo, o que faz com que muitos prefiram se afastar, ampliando a solidão e o risco de depressão.
Esse isolamento, frequentemente ignorado, é uma das maiores razões de quadros depressivos, com prevalência em idosos, embora a perda auditiva e suas consequências possam afetar indivíduos de faixas etárias distintas.
De acordo com o psiquiatra do Hospital São Francisco, Rafael Haber, ainda que nem todas as pessoas com perda auditiva desenvolvam transtornos mentais, existe uma probabilidade maior de que sofram com sintomas de ansiedade e depressão.
“A perda auditiva pode limitar a interação social e a participação em atividades cotidianas, gerando um sentimento de inadequação e incapacidade. A adaptação a essas mudanças envolve desafios que, em muitos casos, elevam os níveis de ansiedade e depressão”, esclarece.
O tratamento da saúde mental nesses pacientes envolve um cuidado multidisciplinar. De acordo com o médico, além de tratar o déficit auditivo, o apoio psicológico é essencial, especialmente com profissionais capacitados para atender pacientes com limitações auditivas, como os psicólogos que utilizam Libras e outros métodos de comunicação. Em casos mais intensos, o acompanhamento psiquiátrico e o uso de medicamentos podem ser recomendados.
DEPRESSÃO E TRISTEZA
O psiquiatra chama a atenção para um fenômeno comum entre idosos, que é quando a perda auditiva pode ser confundida com sintomas de demência. “Às vezes, a família percebe esquecimentos e dificuldade de compreensão, mas isso pode ocorrer pela incapacidade de ouvir adequadamente. Em casos assim, uma triagem auditiva é essencial antes de considerar um quadro de demência”, sugere. Mas, ele acrescenta que a perda auditiva pode acelerar a progressão de demências, por isso a importância do diagnóstico e tratamento precoce.
O especialista esclarece critérios que ajudam a diferenciar um quadro de depressão de uma tristeza comum. Segundo ele, sentir-se triste ocasionalmente é normal, mas a depressão se caracteriza pela persistência dessa tristeza na maior parte do dia por mais de duas semanas. Os sintomas incluem desinteresse por atividades anteriormente prazerosas, alterações de sono e apetite, além de baixa autoestima e sentimentos de inutilidade e culpa.
(Com informações do Hospital São Francisco)