Imagem ilustrativa da imagem Apoio multiprofissional ajuda portadores de TDAH



Muito se fala das implicações que o Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade têm na vida dos portadores durante a infância e a adolescência, mas o TDAH pode persistir também na fase adulta, trazendo prejuízos à vida pessoal e profissional, com dificuldade de organização e concentração, instabilidade profissional e problemas de relacionamento. Aprender a lidar com essas dificuldades é fundamental para quem sofre do transtorno poder cumprir as tarefas diárias e levar uma vida plena.

"As pessoas que têm TDAH sofrem com um dilema constante. Elas são inteligentes, com um QI alto, às vezes acima da média, sentem que têm a capacidade de fazer as coisas, mas não conseguem desempenhar porque não conseguem manter a atenção nas tarefas. Elas têm problemas de relacionamento, problemas na questão das emoções e isso danifica profundamente a inserção da pessoa na sociedade e, por consequência, a autoestima delas vai lá para baixo", explica o neurologista Roger Soares, membro da Academia Brasileira de Neurologia e da American Academy of Neurology.

O TDAH é caracterizado por pequenas alterações na parte frontal do cérebro, responsável pela inibição do comportamento e do controle da atenção. O transtorno acomete entre 5% e 7% das crianças e entre 2,5% e 4% da população adulta no mundo. No Brasil, mais de 2 milhões de casos são diagnosticados a cada ano, embora a subnotificação ainda seja alta, de acordo com o neurologista.

Entre os adultos, afirma Soares, tão importante quanto o diagnóstico correto e o apoio médico é contar com o auxílio de uma rede composta por outros profissionais que podem ser bastante úteis na organização de vários setores da vida. "Se a pessoa tem um diagnóstico e um apoio profissional, alem do médico, ela consegue entender quais são suas capacidades, suas dificuldades e organizar isso da melhor forma possível", garante Soares.

Ainda escassa no Brasil, a disponibilidade de auxilio não medicamentoso a portadores de TDAH é maior nos Estados Unidos e na Europa, segundo o neurologista, que participou recentemente da 28ª Conferência Anual Internacional do Children and Adults with Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder (CHADD), nos Estados Unidos. "Uma pessoa com TDAH que está bem adaptada pode ser de grande valor em uma empresa porque ela vai ter formas de enxergar as coisas de uma maneira diferente e vai gerar soluções criativas. Aí a pessoa bem tratada, ao invés de ter uma baixa autoestima, passa a ser valorizada pela característica peculiar dela. Então, esse apoio faz toda a diferença para o seu bem-estar profissional e para o seu sucesso na vida."

Essa rede de apoio vai desde coach profissional especializado em TDAH até conselheiros matrimoniais que só tratam casais em que um dos parceiros é portador da doença. Também há profissionais preparados para organizar a casa destes pacientes. "Os organizadores profissionais vão até a casa do portador de TDAH arrumar e deixar as coisas com uma funcionalidade que favoreça o seu dia a dia. A forma como o cérebro de uma pessoa com TDAH funciona é diferente da forma como funciona o cérebro de uma pessoa que não tem o problema."

No Brasil, a rede de apoio ainda é formada, basicamente, de um terapeuta cognitivo comportamental e de um psicopedagogo, no caso de pacientes mais novos, para ajudar no desempenho escolar. Ainda assim, nem sempre os pacientes têm acesso a esses serviços. "Fora dos grandes centros, a quantidade de psicólogos que faz especificamente terapia cognitiva comportamental utilizando os protocolos do TDAH é muito pequena", reconhece o neurologista. "No nosso país, a maior parte das pessoas não está tratada nem com medicamento. Na verdade, poucas pessoas estão sendo bem tratadas, tanto do ponto de vista medicamentoso quanto não medicamentoso."

AMPARO NA INFÂNCIA
Psicóloga clínica do ambulatório de TDAH da Policlínica Municipal de Londrina, Alessandra Mara Batista de Souza entende que em cada fase da vida o portador do transtorno deve receber um atendimento específico, mas afirma que quando o paciente recebe o amparo adequado na infância e na adolescência, fica mais fácil organizar a vida na fase adulta. "Neurologicamente, a gente precisa das organizações de base para poder ir colocando coisas mais complexas. Se essa criança teve um tratamento legal, provavelmente ela vai ser um adolescente mais tranquilo e um adulto mais consciente."

Na rede pública, reconhece a psicóloga, ainda é difícil contar com o apoio de uma equipe multiprofissional da qual fazem parte fonoaudiólogos, psicopedagogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e médicos. "Se a gente estiver falando de tratamento de TDAH só com medicação, a gente não está falando de tratamento. O tratamento multiprofissional demanda um quadro de cinco ou seis profissionais, mas como eu mantenho isso financeiramente?" Por isso, ressalta Alessandra, na rotina diária das instituições públicas, na qual os recursos são determinantes para a qualidade do tratamento, o papel da família torna-se fundamental. "Eu falo que um dos maiores terapeutas da criança é a família. Muitas vezes, esse holding da família acaba dando conta de muita coisa."

Com a ajuda do medicamento, nos casos em que se fizer necessário, e também da terapia cognitiva comportamental, esse respaldo familiar propicia à criança e ao adolescente adquirirem uma maior consciência acerca da doença e essa consciência associada à maturidade que o tempo traz, afirma a psicóloga, ajuda o portador de TDAH, na fase adulta, a ter mais disciplina. "Para todos os transtornos você tem que fazer uma reprogramação cerebral. E reprogramar o cérebro a medicação não faz. Ela organiza a sinapse, ela dá um nível de atenção maior, mas a programação e a reprogramação são feitas com a terapia e com a equipe em volta."