Oncologista londrinense Rafael Sato teve o nome usado indevidamente nas redes sociais para embasar falso tratamento
Oncologista londrinense Rafael Sato teve o nome usado indevidamente nas redes sociais para embasar falso tratamento | Foto: Ricardo Chicarelli



Era domingo de manhã, no dia 22 de abril, quando o telefone ‘notificou’ a chegada de uma nova mensagem pelo WhatsApp. Mas dessa vez, o cirurgião oncológico Rafael Onuki Sato não podia acreditar no arquivo que havia recebido. "Era um minicurrículo meu seguido de um arquivo de áudio. Não consegui identificar de quem era a voz, mas a pessoa defendia o consumo de folhas e do fruto da graviola para o tratamento e prevenção do câncer, além de outras informações infundadas", afirma.
A mensagem foi compartilhada por uma colega de trabalho para alertar Sato sobre a falsa notícia que estava veiculando em seu nome. "Em pouco tempo, comecei a receber muitas mensagens e e-mails até de pessoas que não me conheciam, inclusive de outros Estados", comentou Sato, lembrando que o conteúdo chegou até um colega que reside atualmente no Líbano. "Foi quando percebi a proporção que isso estava tomando."
O conteúdo do áudio não condiz com a postura clínica de Sato. Ele defende que a medicina alternativa não tem comprovação científica. "Em alguns casos, até já se comprovou que não funciona, como ocorreu com a fosfoetalonamina. Já a graviola, sei que foram iniciados alguns testes ao longo de 2015, mas que não avançaram. Não existem dados que possam embasar essa prescrição", cita.
O fato é que essas "receitinhas" dão o que falar. "Um amigo falou que ia me ajudar no tratamento do câncer e eu estava tomando o suco de graviola, mas não é uma fruta fácil de se encontrar", contou Redimir Marcomini, de 57 anos. Ele é morador de Ibaiti (Norte Pioneiro) e está fazendo quimioterapia no HCL (Hospital do Câncer de Londrina) para tratar um tumor na região do pescoço. "Palpite tem um monte. Já me falaram para passar babosa na garganta e tomar chá de camomila. Minha mulher também sempre procura algumas dicas na internet", lista.
Esse universo de informações ao alcance das mãos – são 116 milhões de usuários de internet no Brasil - tem os prós e contras em temas de saúde, especialmente em câncer, a doença mais temida pela maioria dos brasileiros. E não é à toa. O Inca (Instituto Nacional de Câncer) estima somente neste ano, 600 mil novos casos de neoplasias. "O câncer envolve um cenário ainda desconhecido, que causa muito medo nas pessoas. Na busca por respostas, a população acaba encontrando muita desinformação e as fake news (falsas notícias) são um gatilho para isso", observa Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia.
Ela comenta que tempos atrás, um vídeo que associava o exame de mamografia com o câncer de tireoide circulou nas redes sociais, atribuindo o conteúdo ao médico Drauzio Varella. "Ele teve até que se posicionar publicamente sobre tal absurdo", lembrou. Holtz afirma que para as fake news oncológicas, não há limites, principalmente na linha de receitas caseiras. "É noni, graviola, suco de uva. Tem muita confusão em relação a esses alimentos tanto em prevenção quanto nos efeitos colaterais dos tratamentos. Já vimos coisas absurdas, que não fazem sentido, como por exemplo, não usar sutiã preto para prevenir o câncer de mama", completa.
O oncologista clínico Carlos Eduardo Stecca, confirma isso na prática. Ele atua no HCL e cada vez mais se depara com questionamentos de pacientes sobre tratamentos alternativos divulgados nas redes sociais e aplicativos de mensagens. O risco é o paciente abandonar o tratamento convencional que é baseado em cirurgia, quimioterapia e radioterapia, em busca de um milagre em terapias alternativas que não têm embasamento científico", ressalta.
Ele conta que já atendeu pacientes que abandonaram o tratamento e voltaram para o hospital porque não conseguiram os efeitos desejados. "Infelizmente, muitos voltam com um estágio avançado da doença, justamente porque não estavam tratando corretamente", afirma.