O Estatuto da Criança e do Adolescente completa 11 anos no próximo dia 13 numa atmosfera de anonimato. Mais de uma década depois de ter sido criado, seu conteúdo é praticamente ignorado pela população. O resultado são interpretações equivocadas, como a idéia de que o estatuto é um instrumento que favorece a criminalidade, em vez de estabelecer mecanismos de proteção e garantir os direitos infanto-juvenis.
Esse desconhecimento gera uma dúvida: a legislação atende as necessidades de seus beneficiários ou é preciso ser reformulada a uma nova realidade que se articula –a de que cada vez mais crianças e adolescentes cometem crimes se amparando num conjunto de leis que os desobrigam de serem penalizados?
Para a socióloga Ana Luisa Fayet Sallas, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), antes de pensar numa revisão do estatuto, é preciso buscar mecanismos para divulgá-lo e implementá-lo, fazendo com que seu conteúdo chegue até a população. ‘‘O estatuto é um instrumento incompreendido’’, enfatiza Ana Luiza. A socióloga assina, com mais oito autores, a publicação mais recente sobre os jovens curitibanos. O livro ‘‘Os Jovens de Curitiba: Esperanças e Desencantos’’, foi lançado pela Unesco no ano passado e foi durante a pesquisa para a obra que Ana Luisa concluiu que falta informação sobre a legislação. O trabalho revelou que quem mais conhece o estatuto são policiais. ‘‘Professores praticamente ignoram seu conteúdo’’, diz a socióloga.
Na opinião de Ana Luisa, essa é a principal falha na divulgação do estatuto, pois atualmente nem professores nem a família –principais pontos de referência para crianças e adolescentes– conhecem a legislação e tampouco sabem como definir limites para os jovens. ‘‘Se há um jogo na sociedade, os jovens querem saber quais são as regras. E isso não está sendo colocado.’’
Teoricamente, o estatuto tem o objetivo de definir essas ‘regras’. O estatuto ratifica a proteção dos direitos individuais da população infanto-juvenil previsto no capítulo dos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal. Determina, por exemplo, que os jovens até 18 anos não podem ser presos, e sim submetidos a medidas sócio-educativas. Esse –paradoxalmente– talvez seja o ponto mais polêmico e divulgado do estatuto.
Enquanto os jovens cometem infrações, acreditando que não serão punidos por serem ‘‘menores’’, adultos culpam a legislação por não tratar com ênfase os infratores, o que –teoricamente– seria o principal motivo de reincidência na criminalidade entre os jovens.
Pesquisa feita pela Prefeitura de Curitiba no ano passado apontou que a maioria dos jovens infratores são de classe econômica desfavorecida, tem escolaridade baixa e tem pouco contato com a família. Como garantir o direito desses jovens ao estudo, à saúde, à escola, à profissionalização e à liberdade, previstos no estatuto, numa realidade pouco favorável ao desenvolvimento social e econômico? Esse talvez seja um dos principais desafios da sociedade na tentativa de se fazer cumprir o Estatuto da Criança e do Adolescente.