Dois pesquisadores que se formaram na UEL (Universidade Estadual de Londrina) têm se destacado no ramo da astrobiologia, estudo da origem, evolução, distribuição e futuro da vida no universo. Um deles é Ivan Glaucio Paulino Lima, primeiro biólogo brasileiro graduado no Brasil a desenvolver pesquisas na Nasa. Hoje é cientista do Blue Marble Space Institute of Science no Centro Ames de Pesquisas da Nasa, onde atua como microbiologista. Já Rubens Duarte, que fez três expedições pelo Programa Antártico Brasileiro e participou da Expedição Antártica da Rússia, atualmente integra o LEMEx (Laboratório de Ecologia Molecular e Extremófilos) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Ambos os pesquisadores atuam na área da astrobiologia e com micro-organismos extremófilos, que conseguem sobreviver ou até necessitam de condições geoquímicas extremas para sobreviver. Eles foram colegas de turma no curso de Biologia da UEL.

"As coisas acontecem em um ritmo muito mais acelerado do que no Brasil”, destaca Lima
"As coisas acontecem em um ritmo muito mais acelerado do que no Brasil”, destaca Lima | Foto: Ricardo Chicarelli/23-3-2011

Atualmente a Nasa possui três perguntas fundamentais na astrobiologia. Como a vida começa e evolui? Existe vida além da Terra e, em caso afirmativo, como podemos detectá-la? Qual é o futuro da vida na Terra e no universo? Mesmo mirando na vida espacial, o estudo de micro-organismos extremófilos pode contribuir para o nosso cotidiano em solo terrestre. Você sabia, por exemplo, que a enzima utilizada no teste PCR (reação em cadeia da polimerase), para identificar a Covid-19, foi descoberta por meio de estudos desses micro-organismos?

Lima faz parte da equipe da dra. Lynn Rothschild, e atualmente a equipe trabalha em um projeto de construção de estruturas utilizando o micélio, um tipo de fungo. De 200 candidaturas dentro da própria Nasa, apenas seis projetos foram selecionados para a fase dois, e esse em que Lima trabalha foi um deles. “O tijolo biológico é um material bem resistente e leve e pode representar uma resistência à radiação e ser produzido em série”, destaca. O conceito é de que as missões espaciais não precisam ser como tartarugas que carregam suas próprias casas nas costas. “Esse processo está sendo otimizado para conseguir melhores resultados, mas acho que o tempo para a construção com o micélio é de alguns meses”, aponta.

Ele também trabalha no desenvolvimento de um mecanismo para a purificação utilizando fungos como filtros de metal para eventual plantação no local. “A gente conseguiu resultados muito promissores com o cobre e a gente está pensando em expandir agora para outros metais”, destaca.

Segundo Lima quando se fala na Nasa se pensa que é tudo futurista. “Mas na verdade é um monte de prédio antigos e normais e os equipamentos que a gente utiliza lá são semelhantes aos de instituições pelas quais eu estive no Brasil. A diferença é a abordagem dos problemas e a mentalidade”, aponta. Um exemplo disso são as reuniões mais curtas e objetivas que as realizadas no Brasil. “A longo prazo isso acaba afetando o desempenho e a eficiência. Claro que eu estou falando no aspecto geral, mas existem bons exemplos no Brasil”, afirma.

“A infraestrutura de colaboração com o setor privado é muito mais sólida do que no Brasil. Não se perde tempo por falta de reagente. Nesse sentido é muito eficiente. As coisas acontecem em um ritmo muito mais acelerado do que no Brasil”, destaca.

Rubens Duarte foca o seu trabalho com bactérias e com o ecossistema de microrganismos extremófilos na Antártica
Rubens Duarte foca o seu trabalho com bactérias e com o ecossistema de microrganismos extremófilos na Antártica | Foto: Acervo Pessoal

Rubens Duarte, por sua vez, foca o seu trabalho com bactérias e com o ecossistema de microrganismos extremófilos no continente gelado, incluindo vírus e fungos. “São microrganismos que vivem em um ambiente de falta de água líquida e de temperatura muito baixa. Além disso, tem muita radiação ultravioleta por conta da latitude baixa. A gente tem na prática seis meses de luz sem parar.” O estudo desses microrganismos, aponta, permite que se estude substâncias presentes neles que sejam resistentes à radiação e possam ser usadas em cosméticos como bloqueadores solares, por exemplo.

Algumas pesquisas identificaram que alguns fungos produzem substâncias com atividade antitumoral. “São substâncias que podem ser usadas no tratamento de câncer. Outras produzem substâncias que podem ser usadas para o tratamento de malária”, enumera.

Duarte explica que a Antártica é como um laboratório a céu aberto na Terra, cujo ambiente é o mais parecido com o que se encontra fora do planeta. “Esses microrganismos podem dar indícios de como pode ser vida em Marte, que também não possui muita água líquida e tem muita radiação ultravioleta.”

Questionado sobre a importância dessas pesquisas, Duarte explica que algumas bactérias da Terra auxiliam no crescimento de plantas, como as utilizadas na soja para promover a fixação de nitrogênio. "Alguns desses microrganismos já foram testados no espaço com plantas e mostraram que são eficientes também na microgravidade. No entanto, algumas bactérias se comportam de forma diferente em ambiente de microgravidade, como a Escherichia coli. Nos testes feitos aqui, a Escherichia coli não sofreu tanta alteração, mas no espaço expressou muito os genes de virulência. É um fator que pode afetar a saúde dos astronautas, já que a gente carrega essas bactérias no intestino. Então é uma preocupação de sobrevivência”, ressalta.

“Tenho um projeto que acabou de ser aprovado na Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) com bactérias da Antártica. Existem bactérias que produzem proteínas que a gente pode utilizar na agricultura para evitar que a planta morra da geada. Também podem ser usadas na conservação de vacinas”, destaca.

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