Violência política contra a mulher impacta candidaturas femininas
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sexta-feira, 10 de dezembro de 2021
Francielly Azevedo - Especial para a FOLHA
Muito se fala sobre a violência praticada contra a mulher, principalmente na esfera doméstica, mas as agressões não se restringem a esse meio. Atos hostis, às vezes, passam despercebidos em um outro cenário: o político. Em campanha ou eleitas, mulheres relatam que sofrem ameaças, xingamentos e são desmerecidas, somente, por serem do sexo feminino.
De acordo com uma pesquisa do Observatório da Violência Política Contra a Mulher, quase metade das mulheres (43,8%) já sofreu violência política no Brasil. Foram ouvidas candidatas de municípios de até 200 mil habitantes que registraram maior número de mulheres na disputa a cargos majoritários.
Conforme o relatório, a violência política contra o sexo feminino é um dos principais fatos que afastam as mulheres de disputar cargos eletivos. A professora de direito parlamentar e eleitoral e coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil, Ana Claudia Santano, explica que mulheres são submetidas a questionamentos sobre a vida privada, forma de vestir e aparência física, por exemplo. Questões que não têm qualquer relação com o cargo público ocupado ou pretendido.
“A violência política acontece quando afeta os direitos políticos da mulher, os direitos políticos em sentido amplo, ou seja, não é só votar e ser votada, é também quando a mulher quer participar dos assuntos públicos, da esfera de tomada de decisões. Não é só no âmbito eleitoral e parlamentar, vai muito além”, diz ela à FOLHA.
JORNADA ÁRDUA
A deputada federal paranaense Christiane Yared (PL) está no segundo mandato e cita que as dificuldades sempre existiram e existirão. A parlamentar acredita que para as mulheres a jornada é sempre mais árdua. “A preocupação de nos apresentarmos bem, ouvir, aconselhar, apaziguar e, se estiver na política, trabalhar em dobro pois sempre somos cobradas e muito sobre nossa atuação como parlamentares”, considera. Na Câmara, as mulheres não chegam a 80 em uma Casa com 513 parlamentares.
Para a deputada estadual Mabel Canto (PSC), que ocupa o primeiro mandato na Assembleia Legislativa do Paraná, estar na política sendo mulher é um desafio. Segundo ela, os projetos apresentados por parlamentares femininas ou em prol das mulheres têm mais dificuldade de aprovação. “A violência política é real, ela existe, ela é diária. Eu, por exemplo, já pude experimentar algumas, infelizmente. Em plenário, ao defender um projeto de minha autoria, em favor das mulheres paranaenses, que havia sido vetado pelo governador, eu fui chamada de hipócrita no meio dessa discussão. E sem contar nas campanhas eleitorais”, relata. Ela é uma das cinco deputadas na Assembleia, que conta com 54 parlamentares.
A professora Elza Correia, ex-deputada estadual e ex-vereadora de Londrina, destaca que quando uma mulher consegue romper a barreira da sociedade e ocupar um cargo político, imediatamente percebe que muitos homens que estão nesse meio tendem a delimitar o espaço dela. “São inúmeros os desafios, afinal o parlamento reproduz a sociedade brasileira, que é machista, misógina e bastante preconceituosa em relação às mulheres. Hoje, nós somos 42% da população economicamente ativa e ainda vivemos esses grandes desafios, porque o modelo cultural que prevalece na sociedade define que lugar de mulher não é na política, não é nos espaços públicos”, analisa.
CÓDIGO ELEITORAL
Em agosto deste ano, o governo federal sancionou a lei 14.192, que alterou o Código eleitoral e passou a definir e punir a violência política contra a mulher. Estão proibidas a discriminação e a desigualdade de tratamento por gênero.
Ana Claudia Santano acredita que o caminho ainda é longo e denúncias precisam ser feitas, porque a política continua a ser a área onde se verificam menos progressos até o momento.
“O que a gente precisa fazer primeiro é desnaturalizar a prática, ou seja, a gente precisa parar de pensar que ter o couro duro, que é o que muitas vezes dizem das mulheres, não faz parte da política. Que o maltrato por ela ser mulher não tem que fazer parte da política. Então as mulheres precisam ser tratadas como qualquer outra pessoa pública e não ser estigmatizadas por causa do gênero”, ressalta.