Com a convocação de sessões extraordinárias na CML (Câmara Municipal de Londrina), a LOA (Lei Orçamentária Anual) de 2024 deve ir à pauta na próxima semana. O texto já foi aprovado em primeira votação, em outubro, e discutido em uma audiência pública com a comunidade. Agora, como é de praxe, vários vereadores propuseram emendas ao projeto.

Três das propostas visam retirar recursos do Promic (Programa Municipal de Incentivo à Cultura). A Emenda 4, assinada pelos vereadores Jessicão (PP), Mara Boca Aberta (sem partido) e Santão (PSC), retira R$ 1,2 milhão do programa e R$ 1,8 milhão da Secretaria de Cultura para destinar à Secretaria de Defesa Social, responsável pela GM (Guarda Municipal).

Santão e Jessicão ainda assinam a Emenda 5, que retira mais R$ 1 milhão do Promic e destina ao programa “Obras e equipamentos para Atenção Básica” do Fundo Municipal de Saúde, e a Emenda 6, que destina mais R$ 1 milhão do programa para aplicar no orçamento da FEL (Fundação de Esportes de Londrina). No total, caso as emendas sejam aprovadas, o Promic pode perder R$ 3,2 milhões dos R$ 5,3 milhões previstos na LOA; já o orçamento estimado para a pasta de Cultura é de R$ 17 milhões.

À FOLHA, o vereador Santão afirmou que o Promic não é um programa importante e que há muitas pessoas “solicitando melhorias na infraestrutura, no esporte, porque existem projetos sociais muito importantes, e muita reclamação na área da segurança”. Ele também conta que já recebeu “inúmeras mensagens” com reclamações relacionadas à saúde.

“Eu penso que o dinheiro público tem que voltar para a população de forma prioritária, emergencial. Se sobrar dinheiro, aí se coloca em situações supérfluas”, dizendo que é contra a “política do Pão e Circo”. “Por isso, não vou mudar meus princípios e vou tentar alocar esses recursos justamente na área da saúde, da segurança e do esporte.”

O parlamentar diz que tem muitas pessoas com projetos no Promic “realmente têm bons interesses, mas não existe programa de incentivo à padaria”. “Se você tem uma padaria boa, você prospera; se não tiver, não prospera. Se você é um artista bom, você prospera e não precisa de dinheiro público; se você é um 'artista porcaria', não vai prosperar, simples assim.”

A vereadora Jessicão lembra que esse é o terceiro ano com tentativa de realocar recursos da Cultura para outras áreas. Também, cita uma arrecadação menor no município e que os recursos da Cultura podem aumentar em outro momento, “mas agora precisamos de mais dinheiro no setor da saúde.”

“Existem muitas filas que estão atrasadas, que precisam ser colocadas em dia, e precisa de dinheiro. Por exemplo, uma das filas que eu tenho brigado muito são as filas de cirurgias de varizes”, pontuando que gostaria de, com a emenda, zerar a fila de espera.

Jessicão afirma não acreditar que a redução de recursos vai inviabilizar o Promic, e aponta que já participou de reuniões do Conselho de Cultura e que “existem projetos excelentes”.

“Vai diminuir um pouco do dinheiro e fazer com que o conselho foque naqueles que têm um alcance maior com a população, e que não fique sobrando dinheiro só para ‘encher linguiça’ de produtor cultural”, completa.

‘POLÍTICA PÚBLICA IMPORTANTE’

A vereadora Lenir de Assis (PT) acredita que a apresentação de emendas ao Orçamento é uma questão complexa, já que demanda retirar recursos de uma área para aplicar em outra. Mas ressalta que, no caso das emendas 4, 5 e 6, é retirada a verba de uma política pública importante para Londrina.

“É o Promic, que é direcionado a produtores culturais do município, e nós sabemos como a questão da cultura e da arte é importante para o conhecimento das pessoas, para educação de crianças, jovens, adultos e idosos”, dizendo que o orçamento da Secretaria de Cultura e da FEL, por exemplo, é pequeno. “Retirar recursos dessas pastas sociais, dessas políticas que justamente são onde a população pode participar, pode promover, pode produzir cultura, é muito ruim. Nós faremos esse debate.”

O agente cultural Sílvio Ribeiro afirma que “soa como um absurdo” destinar dinheiro da Cultura para outras secretarias.

“Entendo que não é uma questão de que as outras secretarias precisam desse dinheiro. Me parece mais uma retaliação à cultura. O direito à cultura é constitucional para todos os cidadãos e me impressiona saber que a secretaria já é bastante desprovida de verbas, e ainda as pessoas querem tirar”, disse.

“É realmente um projeto de retaliar a cultura sabendo que, uma população em contato com a cultura, é uma população que vai pensar, que tem condição de fazer melhor as suas escolhas. Realmente, é muito triste saber que existem vereadores que fazem propostas assim”, completa.

‘MODELO DE INVESTIMENTO’

O secretário de Cultura, Bernardo Pellegrini, diz que a pasta “respeita profundamente” a Câmara e os vereadores, “que expressam e representam os desejos da comunidade de Londrina”. “Um grupo de vereadores está colocando esse debate. São pessoas que não têm nenhum apego pelas artes, pela cultura, pela literatura, pela dança. Se colocam e acham que esse dinheiro seria melhor investido na segurança, na saúde, como já aconteceu ano passado, em contradição ao que a gente pensa. Mas quem decide de fato são os vereadores e estou deixando esse debate”, diz.

Pellegrini afirma que, mesmo com poucos recursos, a Cultura tem realizado muito “pela saúde, pela educação, pela assistência [social], pelo idoso, pela mulher, pelo esporte e por todas as secretarias com quem a gente trabalha”.

“O Promic está fazendo 20 anos, dando exemplo para o Brasil. É um modelo de investimento na cultura como projeto de política pública, que beneficia a comunidade. Se a Câmara decidir que esse trabalho não tem relevância, que pode se tirar dinheiro para investir em outras áreas, a decisão é dos vereadores. Espero e tenho certeza que a grande maioria sabe da importância da cultura na vida da cidade”, completa.