O corregedor do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Benedito Gonçalves, e o ministro Floriano de Azevedo Marques votaram ontem (26) para declarar a inelegibilidade por oito anos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por campanha eleitoral com dinheiro público no 7 de Setembro do ano passado. Já o ministro Raul Araújo manifestou-se pela rejeição das ações contra Bolsonaro e Walter Braga Netto (PL), que foi candidato a vice na chapa derrotada do ex-presidente à reeleição.

O corregedor votou para aplicar uma multa de R$ 425 mil a Bolsonaro e de mais de R$ 212 mil a Braga Netto. Relator, Benedito, apesar da multa, se manifestou contra a inelegibilidade de Braga Netto. Já Floriano votou a favor de tornar o então candidato a vice inelegível. Após o voto de Floriano, a sessão foi suspensa e será retomada na próxima terça-feira (31). Ainda faltam os votos de quatro ministros, inclusive o presidente da corte, Alexandre de Moraes.

Bolsonaro já foi declarado inelegível por oito anos pelo TSE em junho, no julgamento de uma ação que tratava de reunião com embaixadores na qual ele fez ataques e divulgou mentiras sobre o sistema eleitoral. A condição dele não muda caso seja condenado também nessa ação. As ações afirmam que houve abuso de poder político e de poder econômico nos atos do ano passado.

Em seu voto, Benedito relembrou que a comemoração cívica vinha sido tratada como evento eleitoral pelo ex-presidente em eventos políticos, com instigações do ex-presidente instigação "a um combate decisivo contra pessoas imaginárias" - quando Bolsonaro disse, por exemplo, para seus apoiadores irem "às ruas pela última vez".

"O que se viu nas manifestações feitas nas convenções partidárias em julho do ano passado e na propaganda eleitoral veiculada em seis de setembro do ano passado foi a inequívoca difusão de mensagens associando a comemoração do bicentenário [da Independência] e todo o seu simbolismo à campanha do investigado [Bolsonaro]", disse Benedito. O relator afirmou que houve "apropriação simbólica" da data cívica e dos símbolos da República para transformá-los em ato eleitoral, com uso de recursos federais.

Já Raul Araújo afirmou que não houve gastos públicos nos comícios, feitos após os atos oficiais, e que os advogados que entraram com ação contra Bolsonaro tentaram "confundir e misturar os eventos oficiais e os atos de campanha", que, segundo ele, foram "acontecimentos bem distintos".

Floriano, o terceiro a votar, entendeu que, pela atuação de Braga Netto como coordenador da campanha e participante das supostas irregularidades, ele deve ser declarado inelegível.

O julgamento, que começou na terça-feira (24), analisa ações apresentadas pelo PDT e pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), que questionam a participação de Bolsonaro nas comemorações do bicentenário da Independência, em 2022, em Brasília e no Rio de Janeiro.

DEFESA DE BOLSONARO

O advogado da chapa de Jair Bolsonaro nas eleições do ano passado, Tarcísio Vieira, voltou a se queixar da celeridade das ações que podem resultar em condenação de inelegibilidade contra o ex-presidente. Tarcísio disse que pedidos que fez para ouvir três testemunhas foram negados, e que isso é prejudicial ao processo. "Celeridade é importante, mas a certeza jurídica é ainda mais", afirmou.

Em julgamento anterior, o advogado já havia dito que as ações que analisam condutas adotadas pelo seu cliente tiveram "rito anômalo" no TSE, o que foi rebatido pelo corregedor e relator das ações, Benedito Gonçalves, que defendeu "dinamismo" na tramitação dos processos.

Tarcísio, ao se manifestar, questionou o motivo de o julgamento não tramitar em conjunto com uma ação apresentada pela coligação de Lula (PT), que também tratava de temas como o uso de tratores no evento.

A defesa de Bolsonaro afirmou que as comemorações do evento cívico ocorreram de forma aberta e institucional, com a presença de autoridades e convidados no palco oficial.

Só após o encerramento da agenda oficial, o então presidente, "já sem a faixa presidencial, se deslocou a pé na direção do público e discursou, na condição de candidato".

Antes de Tarcísio, se manifestaram o advogado do PDT, Walber Agra, e de Thronicke, Marilda Silveira. Agra disse que as condutas de Bolsonaro nesta ação "são bem mais graves" do que as analisadas anteriormente.

"Nós temos aqui um caráter sistêmico de infrações", disse Agra, afirmando que o objetivo era "matar a democracia", por meio da tentativa de burlar o processo eleitoral e deslegitimar o TSE.

Já Marilda disse que, no evento, "o que se viu foi um uso, com todo respeito, descarado da posição de chefe de Estado", no maior e mais importante evento cívico daquele ano e com "o objetivo claro de impulsionar campanha".

Gonet reiterou manifestação na qual defende a declaração de inelegibilidade de Bolsonaro em ações que acusam o ex-presidente de ter usado as comemorações do Sete de Setembro para fazer campanha eleitoral com dinheiro público.

"O quadro do Sete de Setembro de 2022 expunha à população a imagem de afinidade que a ordem jurídica quer evitar entre o agente político em campanha para a reeleição e as Forças Armadas. Chamava as Forças Armadas ao palanque dos embates eleitorais", disse Gonet.

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OS 7 DE SETEMBRO SOB BOLSONARO

Em 2022

Bolsonaro promoveu atos de campanha, em Brasília e no Rio de Janeiro, além de repetir insinuações golpistas. No TSE, é acusado de abuso de poder político e econômico e de uso indevido dos meios de comunicação

Em 2021

Fez ataques ao STF, ameaçou desrespeitar ordens judiciais e disse que só sairia morto da Presidência. A forma como inflamou apoiadores é um dos exemplos da escalada na retórica golpista do ex-presidente —considerado pela CPI do 8/1 como mentor intelectual dos ataques às sedes dos três Poderes em janeiro em 2023.

Em 2020

Na pandemia e sem vacinas, houve cerimônia curta na frente do Palácio da Alvorada, de 16 minutos. Bolsonaro ficou sem máscara e cumprimentou a plateia

Em 2019

O primeiro desfile de Bolsonaro na Presidência ocorreu ante a erosão de sua popularidade e constrangimentos entre o então presidente e o à época ministro da Justiça e agora senador, Sergio Moro (União Brasil-PR)