A debandada que fez com que os três comandantes das Forças Armadas deixassem nessa terça-feira (30) seus postos é um fato inédito da História. O general Edson Leal Pujol, o almirante Ilques Barbosa e o brigadeiro Antônio Carlos Bermudez colocaram seus cargos à disposição do general da reserva Walter Braga Netto, novo ministro da Defesa, numa nítida resposta à demissão de Fernando Azevedo e Silva. A movimentação entre os militares foi minimizada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que disse ver com naturalidade as mudanças. “Houve a iniciativa da troca do comando e considero como uma mudança decidida por eles próprios”, afirmou Pacheco, em entrevista coletiva. O cenário é descrito como a maior crise na área militar desde a demissão do então ministro do Exército, Sylvio Frota, em 1977, pelo presidente Ernesto Geisel.

Imagem ilustrativa da imagem Senadores do PR criticam debandada dos chefes das Forças Armadas
| Foto: Sérgio Lima/AFP

A opinião de Rodrigo Pacheco não é conjugada por seus pares no Legislativo. Na bancada paranaense, há uma análise de que a decisão dos comandantes é a resposta à tentativa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em aproximar a política dos quartéis. Na visão do senador Oriovisto Guimarães (PODE-PR), o cenário era de ingerência e lembra o episódio em que o chefe do Executivo tentou mudar o comando da Polícia Federal, o que acabou culminando na demissão do então ministro da Justiça Sergio Moro. “Ocorre que o ex-ministro Azevedo e Silva entende e publicou claramente que as Forças Armadas são instituições que servem ao Estado e não a um governo. Dentro das regras da constituição, o presidente é o chefe supremo das forças, mas elas não são um brinquedo na mão dele. Vejo que temos uma crise grande”, avaliou.

CAXIAS

Na avaliação do parlamentar, o comportamento de Bolsonaro não condiz com a realidade do País. “A sensação que tenho é que o presidente não saiu de 1964. As condições sócio-políticas e econômicas do Brasil e do mundo, 50 anos depois, são completamente diferentes. Ele está anacrônico e repete coisas que não fazem mais sentido”, criticou Oriovisto à FOLHA. O senador ainda fez questão de elogiar a postura dos chefes do Exército, Marinha e Aeronáutica. “Vejo com muito bons olhos o que fizeram os comandantes das nossas três forças. É uma dura resposta ao Bolsonaro. Alguém já disse que nem Duque de Caxias, se voltasse à vida, chamaria o exército de meu, como o presidente fez”, lembrou.

Já o senador Flávio Arns (PODE-PR) disse avaliar com preocupação os últimos acontecimentos relativos aos militares. Ele ressaltou que as instituições republicanas devem ser apartidárias e que valer-se da estrutura do Estado para impor uma ideologia e subverter os poderes constituídos é um equívoco já cometido no Brasil em passado recente. “Devemos nos render à nossa própria História e nos valer de suas lições, muitas vezes duras, para consolidar uma atualidade democrática”, contextualizou.

CONSTITUIÇÃO

Há ainda a avaliação de Arns de que as Forças Armadas têm até agora mostrado que não estão dispostas a se envolver em debates políticos. Para ele, as manifestações dos militares são pautadas na sobriedade com o alinhamento com a Constituição, à qual eles se devem submeter. O senador vê o comportamento dos comandantes como a própria resposta aos flertes de Bolsonaro com um possível golpe militar. “Muitas vezes, o silêncio é a resposta mais contundente. Não ouvi de nossos comandantes militares, até o momento, qualquer menção que contrarie o estado democrático de direito vigente no país. Conto que continue assim”, concluiu em entrevista à FOLHA.

O respeito à Constituição foi a vertente que o senador Alvaro Dias (PODE-PR) seguiu para avaliar as trocas nos comandos militares. Para ele, não há diapasão externo para modular as partituras nas quais os militares são regidos. “Qualquer nota dissonante será devidamente rechaçada”, alertou. Dias defendeu que as mudanças não podem deixar de observar a lei. “As substituições dos titulares das pastas são uma prerrogativa inerente ao cargo. Todavia, não há nenhum respaldo constitucional para que o chefe de Estado possa promover trocas e ditar posturas que não estejam em plena sintonia com os sagrados mandamentos da nossa Constituição”, lembrou.

Dias ainda demonstrou total tranquilidade quanto à possibilidade da politização dentro das instituições militares. “Não há qualquer chance de as Forças Armadas se afastarem um milímetro sequer do seu estrito cumprimento do dever legal, do seu papel constitucional”, afirmou à FOLHA. O senador disse acreditar que o gesto conjunto dos três militares traduz a essência de cada uma das forças: o Exército de Caxias, a Marinha de Tamandaré e a Aeronáutica de Santos Dumont. “São sentinelas da pátria e a serviço da democracia do Brasil. Jamais se prestarão a qualquer missão que não esteja em harmonia e observância irrestrita aos preceitos constitucionais”, finalizou.