Não bastassem os números alarmantes de vítimas, infectados, hospitais lotados e da crise econômica provocada pela pandemia da Covi-19, a política nacional ainda é capaz de produzir novas crises diariamente. O telefonema do senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), uma conversa de cerca de seis minutos, é um apanhado de temas explosivos. O assunto central é a instalação da CPI da Covid-19 no Senado, mas passa por pedido de impeachment de ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e até por ameaça de agressão ao líder da oposição, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP). O conjunto de informações expostas no diálogo foi recebido com espanto pela bancada paranaense no Senado, que é formada por parlamentares do Podemos.

Imagem ilustrativa da imagem Senadores do PR criticam conversa de Bolsonaro e Kajuru
| Foto: Pedro França/Agência Senado

Oriovisto Guimarães afirmou ter tomado conhecimento da gravação com muita tristeza. Principalmente por causa da atitude tomada por Kajuru. “Ele se prestando a esse tipo de coisa, gravar uma conversa com o presidente e divulgar. Diz que o fez com a autorização, mas, ao mesmo tempo, já há uma notícia de que Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) vai representar contra Kajuru no Conselho de Ética. Será que Kajuru está mentindo? Acho estranho”, comentou. Guimarães ainda foi duro ao criticar a forma que Bolsonaro se expressou. “Ele usou aquele palavreado, jogou um poder contra o outro, além de ter se referido a outro senador de forma que não tenho coragem de repetir. Uma linguagem que não é própria da vida social, o que dirá de um presidente da república. É um espetáculo dantesco”, disparou.

A conversa telefônica foi elencada como inusitada e surreal por parte do senador Alvaro Dias. Ele, no entanto, não demonstrou surpresa com a atitude de Kajuru, considerada como uma “atividade do seu estilo”. “O que agrava o cenário é a postura de Bolsonaro. Ele não considerou a liturgia do cargo, não teve estatura de presidente, apequenou-se numa discussão sem mérito, demonstrando, inclusive, desconhecer o funcionamento de uma CPI. Ele atirou para vários lados procurando atingir o STF. Uma conversa lamentável, mas que desenha bem o perfil do nosso presidente”, afirmou Dias à FOLHA.

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| Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

A gravidade do conteúdo do diálogo é o que chamou mais a atenção de Flávio Arns, que viu a tentativa de intervenção do chefe do Executivo com um representante do Legislativo, visando atingir a um membro do STF. “Isso me deixa aturdido. Isso vir a público demonstra a danosa precariedade com que estão sendo conduzidas as relações institucionais entre os Poderes na atualidade”, definiu. O parlamentar afirmou que tais relações devem seguir as vias constitucionais. “Se há algum processo pendente no Legislativo que seja de interesse para o País, a intervenção do Executivo deve ser por meio do líder do governo e de sua base junto às instâncias apropriadas, e jamais dessa forma”.

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| Foto: Roque de Sá/Agência Senado

PRÓS E CONTRAS

Os três senadores concordam que a instalação da CPI da Covid-19 já contava com exigências necessárias – número de assinaturas, fatos e prazo – e que apenas cabia ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), acatar. O entendimento é que a comissão é uma das ferramentas da minoria para fiscalizar o governo. “Como houve um vácuo entre a apresentação do requerimento e a decisão do presidente Pacheco, com a postulação feita por meus colegas no Supremo, é correta e a decisão não poderia ser outra”, opinou Dias. Oriovisto Guimarães concorda com a ideia, apenas criticou que a sentença tenha sido monocrática e não do pleno da corte.

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| Foto: Beto Barata/Agência Senado

Já a inclusão de estados e municípios como alvo da CPI também divide os senadores. Tanto Dias como Arns acham que a possibilidade não criará problemas. “Não haverá esvaziamento, uma vez que, de fato, os governos estaduais e municipais receberam verbas da União para enfrentar a pandemia. Nós aprovamos esse apoio no Congresso. Prestar contas desses valores é uma obrigação”, opinou Arns. Já Guimarães disse achar que abranger o tema pode acabar por enfraquecer a apuração sobre o Governo Federal. “A possibilidade dá margem a manobras políticas que não têm fim. Quando amplia muito o objetivo de uma CPI, ela não dá em coisa nenhuma. E é o que vai dar com essa: em nada”, concluiu.