As propostas de reforma política analisadas pelo Congresso Nacional poderão significar um retrocesso em relação às candidaturas de mulheres. A opinião é da mestre em Direito pela UFRJ e pesquisadora Roberta Eugênio, que participou na semana passada do primeiro encontro de prefeitas do Paraná, promovido pela AMP (Associação dos Municípios do Paraná) em Curitiba. O encontro reuniu 31 das 39 prefeitas no estado.

Encontro promovido pela Associação dos Municípios do Paraná  reuniu 31 das 39 prefeitas no estado
Encontro promovido pela Associação dos Municípios do Paraná reuniu 31 das 39 prefeitas no estado | Foto: Gilson Abreu/AEN

Entre as propostas estão o fim da obrigatoriedade para os partidos reservarem um mínimo de 30% de suas candidaturas para mulheres, o retorno das coligações e mudanças na forma de gestão do fundo partidário. A Câmara dos Deputados e o Senado aprovaram projetos que alteram as regras eleitorais. Eles precisam ser analisados e aprovados pelas duas Casas e sancionados até o início de outubro para valerem já nas eleições de 2022.

“As medidas podem implicar em uma desvantagem concreta para a ampliação da participação das mulheres no parlamento”, afirma Roberta Eugênio, que é pesquisadora do Instituto Alziras, entidade que estuda a presença de mulheres na política. “Embora apresentadas como uma forma de organizar o acesso das mulheres, na prática estamos abandonando experiências exitosas e dando mais autonomia aos partidos, sem sanções em relação ao cumprimento das cotas”.

Ela lembra que na eleição de 2018 houve um aumento de 50% no número de mulheres eleitas para a Câmara dos Deputados em relação a 2014, de 55 para 77 — crescimento que pode ser atribuído às práticas adotadas nas últimas eleições, como a reserva de 30% das candidaturas e financiamento mínimo de 30% para as candidatas. Propostas aprovadas pelo Senado anistiam os partidos que não respeitaram as cotas nas últimas eleições e não preveem a manutenção do percentual de financiamento.

A reserva de vagas para candidatas também pode ser afetada pela volta das coligações partidárias, proposta aprovada pela Câmara. “A reserva pode ser pulverizada pelas coligações”, avalia Roberta Eugênio. Para ela, a medida pode distorcer a representação feminina dentro dos partidos. “Significa que não vai ter necessariamente 30% das vagas de candidaturas reservadas por partido, mas por grupos”.

Vagas no parlamento

Aprovada pelo Senado, a reserva de cadeiras nos parlamentos prevê que até 2038 as mulheres ocupem 30% das vagas — a regra começaria a valer em 2022, com a reserva de 18% das cadeiras. Para Roberta Eugênio, o índice de 30% pode se tornar um fator de bloqueio — além de mostrar que o país está atrasado em relação aos vizinhos. “Qualquer índice inferior a 30% geralmente tem uma perda de qualidade na composição. O Brasil está na lanterna da América Latina em relação à paridade na presença de mulheres”. Atualmente, as mulheres ocupam 15% das cadeiras na Câmara.

Um ponto considerado positivo é o projeto que dobra o peso de votos dados em mulheres e candidatos negros para fins de o cálculo do fundo eleitoral. Por outro lado, uma proposta também aprovada desobriga, na prática, os partidos de destinarem um mínimo de 5% do fundo partidário para promover a participação de mulheres na política.

Junior Weiller, presidente da AMP e prefeito de Jesuítas, no noroeste do estado, avalia que o percentual de 5% é insatisfatório. “Elas questionam o índice de 5%, já que há a reserva de 30% para as candidaturas nos partidos”, diz. “As prefeitas sentem que não foram chamadas para discutir. Elas querem participar das decisões, principalmente das que atingem a disposição de serem candidatas”.

Abaixo da média

O Paraná está abaixo da média nacional em relação ao número de mulheres prefeitas. O estado tem 39 prefeitas em 399 municípios, índice de 10%. A média nacional é de 12,5%. “As mulheres se sentem um pouco intimidadas, desfavorecidas pelo sistema”, analisa a prefeita de Pérola, Valdete Cunha (Progressistas), presidente do Conselho da Mulher da AMP. “É uma luta grande para compor uma chapa e ter candidatas. As mulheres se sentem pouco acolhidas, é preciso que os partidos formem mais”.

Segundo Tania Ziulkoski, fundadora do MMM (Movimento Mulheres Municipalistas), um levantamento da CNM (Confederação Nacional dos Municípios) indica que as cidades brasileiras geridas por mulheres registraram 43% menos mortes por Covid-19 que as demais. “Acho que a mulher tende a confiar mais na ciência, até porque começamos com aquilo de lavar as mãos em casa. A participação da mulher na política vem evoluindo aos poucos, mas vem evoluindo bem”.

Ex-vereadora em Londrina e derrotada na disputa pela prefeitura em 2016, Sandra Graça avalia que as dificuldades para as mulheres ainda são grandes na política. “A mulher ainda caminha a passos lentos nesse processo. A reforma política teve algumas alterações com relação às mulheres, mas é muito marketing, na prática as dificuldades ainda são grandes”.