O projeto de lei que altera as regras de cobrança do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre os combustíveis deverá causar pouco efeito no bolso do consumidor, avaliam senadores que vêm participando dos debates e economistas. Após uma série de discussões sobre a forma de cobrança do imposto, a votação do PLP (Projeto de Lei Complementar) 11 de 2020 foi adiada para depois do carnaval no Senado. Se for aprovado, ele segue para análise da Câmara dos Deputados.

Em discurso, à tribuna, senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR)
Em discurso, à tribuna, senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) | Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

A principal discussão é sobre a forma da alíquota. O projeto prevê a utilização de uma alíquota ad rem (com o valor em reais por litro) ao invés do modelo usado atualmente, de alíquota ad valorem (percentual sobre o preço do combustível). Além disso, hoje cada estado possui uma alíquota. Muitos senadores argumentam que, com o modelo ad rem, o consumidor poderá ser prejudicado em caso de queda nos preços.

Um dos que questionam a ideia é o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). Ele lembra que, no caso da adoção da alíquota ad rem, o consumidor sairia prejudicado quando o preço do petróleo cai (o que depende do mercado internacional), pois sua carga tributária ficaria maior. “Como quem vai fixar esse valor é o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária), com os estados e o Distrito Federal, será fixado um valor alto, parecido com o de hoje”, diz. “A alíquota ad valorem seria melhor, porque a tendência é de queda do preço do barril”.

Para Oriovisto Guimarães, é importante fixar a alíquota, para evitar variações. “Que os governos vão continuar cobrando impostos eu não tenho dúvida, estamos estudando a melhor maneira de cobrar esse imposto e que prejudique menos o consumidor. Não tem outra ideia, ou cobra pelo preço ou cobra pelo litro. Isso é o que está se discutindo, aprove-se uma ou outra não vai mudar muito (nos preços)”. Por enquanto, segundo o senador, o único consenso na Casa é sobre a ampliação do vale-gás, que também é prevista no projeto.

CENÁRIO ECONÔMICO

O senador Flávio Arns (Podemos-PR) avalia que a alíquota ad rem parece a mais apropriada quando se analisa o atual cenário econômico, mas poderá causar problemas caso o dólar ou o preço do barril de petróleo caia. “Caso retornemos à situação de estabilidade do real, a sistemática ad rem pode se revelar desvantajosa para o consumidor a médio e longo prazo”, afirma Arns, que também prevê riscos para os estados. “Em caso de forte aumento de demanda, quando o preço sobe, as alíquotas ad valorem geram mais arrecadação do que alíquotas ad rem. No primeiro caso existe aumento de arrecadação pelo aumento tanto no preço quanto na quantidade. No segundo só há o efeito na quantidade, já que preço não entra na base. A solução não é tão simples quanto se pensa”

Arns não crê que o projeto resulte em uma redução significativa de preço e defende o investimento em refino e medidas a longo prazo. “Existem diversos fatores importantes que compõem o preço final do combustível. E o ICMS não é o único tributo incidente ao longo da cadeia de comercialização, pois também há a incidência de diversos tributos federais”. O senador lembra que outro projeto em análise no Senado (que também será votado logo após o carnaval) cria um fundo para estabilizar os preços de derivados de petróleo. “Seria uma espécie de ‘colchão’ para evitar as oscilações de preços dos combustíveis, mas ainda é preciso discutir melhor como abastecer e manter essa conta”.

Reforma estrutural e investimentos

Imagem ilustrativa da imagem Qual o impacto do ICMS sobre combustíveis no bolso do consumidor?
| Foto: Gustavo Carneiro - Grupo Folha

Para o economista Hugo Meza, o primeiro passo para se buscar um impacto positivo na forma de cobrança do ICMS sobre os combustíveis seria uma reforma tributária que reduzisse as diferenças entre os estados. “O buraco é mais embaixo e envolve uma reforma tributária que diminua as diferenças de tributação entre os estados. Mas estados produtores de petróleo, como o Rio de Janeiro, não querem abrir mão dessa arrecadação”, diz o professor da Universidade Estácio, em Curitiba. “Enquanto tivermos a reforma tributária apenas para fins políticos, e não para o bem-estar social, vamos ter esses impasses, tentando apagar o fogo aos poucos, sem nenhum tipo de política estrutural”.

Meza considera pouco útil a discussão sobre a alíquota fixa no PLP 11 em tramitação no Senado. “É uma política populista essa de tentar taxar algo que está sujeito a variáveis. Estamos vendo a variabilidade do Brent e agora temos a guerra. É imprevisível, não tem como controlar essa variável”, avalia. “Mexer em qualquer tipo de estrutura superficial não traz nenhum efeito positivo para a população. Quanto mais as questões de mercado forem regulamentadas dessa forma, maior o risco de alguém pagar a conta”.

Economista e professor da UTFPR, Marcos Rambalducci vê como ponto positivo do projeto a previsibilidade em relação à taxação, tanto para o consumidor quanto para os governos, que poderão planejar suas arrecadações. “Essa medida está muito mais ligada à previsibilidade. Uma elevação do preço se torna muito mais agressiva quando há o percentual de arrecadação sobre ela. A previsibilidade é sempre algo desejável em economia”.

O consenso é que o Brasil precisa investir em tecnologia e no refino. Atualmente o país precisa importar entre 20% a 30% do que é consumido internamente para que o combustível chegue às bombas, já que o petróleo brasileiro é muito grosso e precisa ser misturado. Desde 2016, durante o governo de Michel Temer (MDB), a Petrobras passou a atrelar o preço ao mercado internacional, o que aumentou o preço final. “O petróleo só é nosso quando está embaixo da terra. Toda vez que precisamos tirar, temos que usar plataformas pagas em dólares, engenheiros pagos em dólares, navio de cabotagem pago em dólares. O custo do petróleo é todo em dólar”, diz Marcos Rambalducci.

Segundo a Petrobras, o preço final da gasolina é composto por quatro fatores: os preços do produtor ou importador de gasolina tipo A, a carga tributária, o custo do etanol que obrigatoriamente deve ser adicionado ao combustível, e a margem de lucro dos distribuidores e revendedores.

Entre 7 de novembro de 13 de novembro do ano passado, de acordo com a Petrobras, o preço bruto de um litro de gasolina, sem os outros fatores, era de R$ 2,33. A isso se somavam R$ 0,69 referentes a Cide, PIS/Pasep e Confins; R$ 1,77 relativo ao ICMS; R$ 1,20 para a adição de etanol; e R$ 0,77, valor relativo à margem de lucro de distribuidores e revendedores.

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