Enquanto grupos se mobilizam nas redes sociais para tentar impedir a criação do Conselho LGBT, a Câmara Municipal de Londrina deverá debater um projeto abrangente que trata do futuro da cidade de Londrina ao menos nos próximos 10 anos. No entanto, como é uma matéria que não traz viés ideológico ou não abrange um tema que estica a corda já polarizada da política, acaba não ganhando apelo na internet, tampouco está no radar de alguns vereadores. Trata-se da audiência pública do PD (Plano Diretor) marcada para esta sexta-feira (24), às 19 horas, para discutir emendas apresentadas na Lei Geral (projeto de lei 207/2018).

Imagem ilustrativa da imagem População discutirá 107 emendas que alteram Plano Diretor Participativo
| Foto: Roberto Custódio

Até agora apenas 129 pessoas estão inscritas, para participação presencial ou on-line. Ao todo, foram ofertadas 623 vagas para garantir a ampla participação popular. Mas, no momento, são 79 pessoas inscritas para participar na sede da Câmara e nos centros de apoio e outras 51 para participar pelo aplicativo Zoom.

O projeto foi protocolado pelo Executivo no final de dezembro de 2018 e tem mais de 2,6 mil páginas. De lá para cá, a matéria já foi discutida em duas audiências públicas anteriores e recebeu parecer de inúmeras entidades de classe, instituições e movimentos sociais.

ALTERAÇÕES SIGNIFICATIVAS

O projeto original foi elaborado pelo Ippul (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina) e teve várias sugestões da sociedade civil. Entretanto, como foram apresentadas 107 emendas pelas comissões permanentes, a realização de uma terceira rodada de audiências foi considerada necessária pelo jurídico da Casa, que entendeu que as emendas alteram de forma significativa o texto original do projeto de lei.

A maioria das emendas foi apresentada pela Comissão de Política Urbana e Meio Ambiente, cujo relator foi o vereador Eduardo Tominaga (DEM). Muitas dessas emendas foram fruto de sugestões de entidades de classe como o Sinduscon Norte (Sindicato da Construção Civil), Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina) e Sociedade Rural do Paraná (SRP), entre outras. "A Câmara fez um trabalho muito republicano ao colocar o tema em discussão. As emendas resultam do trabalho apresentado por mais de 30 entidades que manifestaram suas sugestões. Numa leitura geral, as emendas atendem nossos apontamentos, corrigem essa legislação como uma série de divergências que nós entendemos ser a necessidade de desenvolvimento e de geração de emprego e renda em Londrina com sustentabilidade", avalia o vice-presidente do Sinduscon Norte, o engenheiro civil Gerson Guariente.

Por outro lado, especialistas em Direito e planejamento urbano enxergam que parte significativa das emendas alteram as regras do jogo, abrindo brechas para negociações políticas. É o caso da emenda que retira a obrigatoriedade do município desapropriar imóveis que, após 5 anos de cobrança de IPTU progressivo, continuem desocupados ou sem construção. Para o doutor em planejamento urbano Gilson Bergoc, a emenda que altera o termo “deverá” por “poderá” deixará o artigo totalmente ao critério político do momento em vez de um teor técnico. "Nesse sentido, perde eficácia, pois poderá ou não ser aplicado o artigo, de acordo com interesses que muitas vezes não são explicitados, abrindo inclusive a possibilidade de 'negociatas' para aplicar ou deixar de aplicar o instrumento". Segundo ele, o texto original força os proprietários a darem destinação ao imóvel e, se não o fizerem, somente neste caso o poder público deverá assumira a tarefa, iniciando com a desapropriação. Ou seja, não trará efetividade para romper os vazios urbanos e evitar que donos de imóveis os deixem subutilizado.

VAZIOS URBANOS

Outra discussão está em torno do texto do aumento ou não do perímetro urbano dentro da lei geral. Quatro emendas (49, 55, 57 e 64) retiram do texto original a palavra "proibição" da expansão urbana dentro da Lei Geral do PD. Para o representante do Sinduscon, a questão deve ser objeto de uma lei específica de perímetro urbano. "Dentre desse espírito, defendemos ampliação do perímetro para destinação de ampliação de áreas industrias ou comerciais para geração de emprego e renda. São áreas específicas para desenvolvimento e de grandes empreendimentos e também ampliação do sítio aeroportuário", avalia Guariente.

Já o urbanista que faz parte do Movimento Participa Londrina considera que os vazios urbanos são uma afronta à economia popular e só geram espaço para especulação imobiliária. "Toda a manutenção da infraestrutura urbana encarece. A passagem de ônibus fica o dobro do preço, por exemplo, pois o veículo tem que se deslocar muito mais para chegar aos bairros mais distantes. Não tem sentido, para o interesse da população em geral, permitir qualquer expansão, pois ela sempre aumenta os custos", diz Bergoc.

O vereador Eduardo Tominaga afirma que há apenas uma mudança de verbo no caso do perímetro urbano para que o projeto não fique "engessado". "Estamos lidando ainda com a lei geral. Estamos mudando apenas o verbo 'coibir' o aumento do perímetro urbano para 'desestimular'. Ninguém está liberando a expansão urbana de forma generalizada. Mas, também entendemos que o município terá custos, por isso não podemos fazer isso de forma incisiva para não ser um problema para cidade no futuro."

DESENVOLVIMENTO X PRESERVAÇÃO

Bergoc considera que algumas emendas apresentadas pela Comissão de Política Urbana podem acarretar em sérios danos ambientais. Entre elas está a que retira a proibição de agricultura transgênica nas bacias e mananciais de abastecimento e a que retira a responsabilização de proprietários rurais que não controlam o uso de agrotóxico. "É preciso proibir esse tipo de agricultura, principalmente nas bacias de mananciais de abastecimento porque a agricultura transgênica está associada ao uso de agrotóxicos, comprovado cientificamente como causadores de doenças. Para manter Londrina, uma cidade saudável, é importante proibir esse tipo de agricultura."

Para Tominaga, a lei geral dá apenas uma diretriz para o Código Ambiental. "O Código Ambiental irá tratar de forma mais direta essa política pública. É muito estranho colocar a prefeitura de Londrina para coibir essa questão. Já existem órgãos estaduais responsáveis para fazer essa fiscalização. Acredito que esse artigo é desnecessário dentro do Plano Diretor." O mesmo ele argumenta sobre o artigo do "uso de agrotóxico". "A Secretaria de Agricultura do município não tem como fiscalizar essas questões. Fizemos essas alterações ponderando, mas não há objetivo nosso de degradar o meio ambiente."

PRÓXIMOS PASSOS

Após a realização da audiência pública, a Comissão de Justiça avaliará a constitucionalidade e a legalidade das emendas. Se receberem voto favorável, estarão liberadas para serem votadas em plenário, juntamente com o texto original do projeto. Além da Lei Geral do Plano Diretor, serão revisadas posteriormente nove leis específicas. São elas: Perímetros Urbanos; Parcelamento do Solo; Uso e Ocupação do Solo; Sistema Viário e Mobilidade Urbana; Código de Obras; Código de Posturas; Código Ambiental; Preservação do Patrimônio Cultural; e Instrumentos Urbanísticos.