Parlamentares e prefeitos de todo o país estão se mobilizando contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 110/2019, que altera o Sistema Tributário Nacional. Uma das medidas do projeto que está sendo analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado é a fusão do ICMS com o ISS em um único tributo. Na semana passada, senadores contrários à PEC agiram e a reunião da CCJ em que a matéria seria votada não teve quórum.

O ponto que gera mais desentendimentos é a criação de dois tributos com a adoção de um modelo dual do Imposto de Valor Agregado (IVA). O IVA Subnacional seria composto pelo Imposto de Bens e Serviços (IBS) — resultado da fusão do ICMS (imposto estadual) e do ISS (imposto municipal). Ele seria arrecadado por estados e municípios. Já a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) unificaria tributos federais (IPI, Cofins e Cofins-Importação, PIS e Cide-Combustíveis) arrecadados pela União.

A avaliação dos críticos da PEC 110 é que a mudança aumentará a carga tributária para o setor de serviços, que atualmente paga o ISS (Imposto Sobre Serviços), e poderá comprometer a arrecadação dos municípios, ao fundir o tributo com o ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), cobrado pelos estados. A reforma ainda traria imprevisibilidade, pois vários itens seriam definidos no próximo ano, pelos parlamentares que serão eleitos em outubro.

O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) é um dos que tem se posicionado contra a aprovação da PEC. "Se juntarmos esses dois impostos (ICMS e ISS), vai ter um aumento brutal da carga tributária para clínicas, escolas e todo o setor de serviços, que hoje responde pela maior parte dos empregos. Pula de 3% a 5%, que é o ISS atual, para algo em torno de 18% a 20%. Cria uma insegurança enorme para todo o setor", disse.

Para Oriovisto Guimarães, a aprovação neste momento ainda traria insegurança jurídica, já que muitos aspectos, como as alíquotas, serão definidos pela próxima Legislatura, a partir de 2023. "A Câmara dos Deputados que vai votar isso será outra. Os deputados vão se inteirar do assunto e votar quando?", questionou o senador. "Além disso, da entrada em vigor de uma reforma sem alíquota, o prazo de transmissão de alguns itens pode chegar a 40 anos".

Na sessão do dia 29 de abril, o senador paranaense pediu para os demais parlamentares conversarem com os prefeitos dos municípios de seus estados. "Conversem com os prefeitos antes de votar. Vão perceber que os prefeitos estão contra essa reforma. Estão tentando construir um clima para que ela seja aprovada, dizendo que quem é contra não entendeu. Uma reforma que prevê transição em até 40 anos vai aumentar o manicômio tributário, não vai diminuir".

No fim do mês passado, a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) emitiu uma nota em que manifestou preocupação com a arrecadação dos municípios caso a PEC seja aprovada. "Favoráveis a uma reforma tributária em etapas, dirigentes da Frente Nacional de Prefeitos (FNP) destacam que a busca por justiça tributária passa por simplificar os impostos sem desestruturar e comprometer a arrecadação dos municípios", diz a nota. "O ISS é uma base tributária promissora. Abrir mão desse imposto desequilibrará as finanças locais e comprometerá serviços públicos essenciais ofertados pelos municípios".

Entre outros pontos apontados como negativos estão a previsão de devolução de IBS a famílias de baixa renda, o que mostraria que a reforma elevará tributos para as famílias mais pobres; a criação de uma entidade suprafederativa, o Conselho Federativo; uma transição muito longa, com previsão de até 40 anos para o modelo de distribuição dos recursos.

Outro risco seria um aumento da complexidade tributária e dos custos para micro e pequenas empresas que não estão cadastradas no Simples, que precisarão de estrutura para controlar os débitos e créditos do IBS (o que não ocorre hoje com o ISS).

Sem consenso

A PEC é apoiada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-RO), que prometeu levá-la a votação em Plenário assim que for aprovada na CCJ. "É natural que, num ano de eleição, haja dificuldade de realizar grandes reformas nacionais. Precisamos apartar o interesse nacional pelas reformas para conter a crise da discussão eleitoral", disse Pacheco. O relator da proposta é o senador Roberto Rocha (PSDB-MA) e ainda não há uma data definida para a matéria voltar à pauta da CCJ.

O consenso parece distante. Líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM) disse discordar de alguns pontos e não julgar conveniente que PEC seja votada em um ano eleitoral. "Além de aumentar a carga tributária, penaliza setores como da zona franca de Manaus, que perderão competitvidade e vão desempregar, afirmou ele à TV Senado. "Existem questões a serem discutidas, estamos em véspera eleitoral e eu não acho oportuno em véspera de eleição estarmos discutindo uma reforma tributária que vai mexer inclusive com o pacto federativo".

Já o senador Esperidião Amin (PP-SC) avaliou que há espaço para aprimorar a proposta e votá-la ainda neste ano. "É preciso avançar. Já consertamos a questão do agro cooperativo, nós temos que estimular uma economia mais solidária, através de associações e cooperativas, e procurar uma tributação justa para o mercado digital. Essa modernização para nos dar competitividade no nível internacional exige que se dialogue e avance, o que não pode é ficar parado".

Para Oriovisto Guimarães, seria mais produtivo o Senado retomar a discussão a respeito do Simplifica Já, proposta elaborada por entidades representativas dos setores público e privado, apresentada em 2020 pelo falecido senador Major Olimpio (SP).

O senador também avalia que as iniciativas poderiam partir do governo federal e dos governos estaduais, sem depender de medidas legislativas. "Tem coisas que o governo pode simplificar. Já existe disposição para isso, o Confaz (Comitê Nacional de Secretários da Fazenda dos estados e do Distrito Federal) já se manifestou favorável à ideia. Desde 1988 o Congresso tenta aprovar uma reforma, não vai ser agora, esbarrando na autonomia de estados e municípios".

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