Na véspera de sessão do Congresso, o Palácio do Planalto aposta em uma vitória no Senado na briga pelo chamado Orçamento impositivo. Auxiliares do presidente Jair Bolsonaro, porém, temem retaliações da Câmara.

O veto de Bolsonaro a um trecho da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2020 deteriorou mais a tensa relação entre Executivo e Legislativo. Na queda de braço com o governo, deputados e senadores tentam ampliar o controle sobre os gastos públicos.

Estão em jogo R$ 30,1 bilhões. Sem base, Bolsonaro enfrenta novo desafio na relação com o Congresso.

O receio de senadores é entregar o comando do dinheiro a um deputado -no caso, o relator do Orçamento de 2020, Domingos Neto (PSD-CE)- e dar simbolicamente à Câmara a palavra final sobre os recursos. Senadores temem não ter demandas atendidas.

O destino do montante bilionário a ser gasto neste ano, de eleição municipal, quando congressistas buscam irrigar as bases, seria definido pelo relator do Orçamento. É justamente isso que Bolsonaro e senadores tentam barrar.

Nesta terça-feira (3), de forma conjunta, congressistas poderão decidir se mantêm ou derrubam o veto de Bolsonaro. A sessão está prevista para as 14h.

Aliados de Bolsonaro e parlamentares buscaram um acordo ao longo de toda esta segunda-feira (2). A negociação se estendeu até a noite.

O martelo só poderá ser batido nesta terça, quando interlocutores do Planalto devem se encontrar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ele voltou na segunda à noite de viagem à Espanha.

O trato anterior, costurado entre Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Paulo Guedes (Economia), garantia a devolução de metade do montante para o Executivo. Bolsonaro mandou congelá-lo.

O otimismo do presidente se dá em razão de um movimento crescente no Senado de manter a decisão de vetar trecho do Orçamento impositivo. Até esta segunda, o governo calculava ter no mínimo 35 votos para manter o veto no Senado e retomar o controle sobre o dinheiro.

Para derrubar a decisão de Bolsonaro, ambas as Casas precisam de maioria absoluta (41 senadores e 257 deputados).

O Planalto ganhou aliados inesperados nesta batalha. O senador Renan Calheiros (MDB-AL), por exemplo, anunciou no Twitter que votará para manter o veto.

"Sem planejamento ou organicidade, carece de lógica a terceirização para o relator. O Orçamento impositivo, lá atrás, foi um avanço. Mas isso que se discute é bem diferente e temerário", escreveu.

A presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), senador Simone Tebet (MDB-MS), também declarou apoio ao veto de Bolsonaro.

"Não é missão constitucional do Parlamento, em todos os níveis, a execução das ações constantes do Orçamento. O Poder Executivo não tem esse nome por acaso", escreveu ela.

Pela conta do Planalto, 22 senadores do chamado "Muda Senado" -grupo de congressistas que se declaram independentes do governo- vão votar a favor do veto. Somam-se a ele parlamentares do MDB, PSD, PP e PSDB.

Integrantes do governo avaliam que, se o Senado mantiver o quórum médio que registrou no ano passado durante análise de vetos -63 na conta de aliado de Bolsonaro-, seria possível manter os vetos.

O "Muda Senado" vai obstruir a votação desta terça. Segundo o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a intenção é impedir que haja votação no Senado se não houver a certeza de que eles têm voto suficiente para manter o veto.

Na Câmara, o cenário é oposto. Líderes de partidos do chamado centrão apostam que há maioria para derrubar o veto de Bolsonaro e assim garantir a Domingos Neto o controle sobre os recursos bilionários.

É justamente essa Casa que preocupa o governo, em razão de uma longa pauta prioritária econômica a ser discutida neste ano.

O Planalto ainda vai enviar, por exemplo, a reforma administrativa, que altera a estrutura do funcionalismo público, ao Congresso. Um receio é que os congressistas atrasem a análise da proposta.

Além disso, tanto na Câmara como no Senado, parlamentares ameaçam aplicar punições aos filhos de Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), nos processos que há contra ambos nos conselhos de ética das respectivas Casa.

Também há pressão dos congressistas sobre Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para que desengavetem projeto que altera tramitação de MPs (medidas provisórias).

Diante do receio de retaliação e com o argumento de que é necessário pacificar a relação entre Executivo e Legislativo, auxiliares de Bolsonaro ainda insistem em um acordo, mesmo que isso signifique uma mudança na divisão dos valores a serem distribuídos ao Executivo e ao Congresso.

Ou até mesmo que o governo se comprometa com as demandas do Legislativo no destino das emendas.

A aliados Alcolumbre relatou ter sentido que a conversa desta segunda com Bolsonaro, que durou quase duas horas, não foi muito produtiva.

Segundo seu relato a auxiliares, ele reclamou com o presidente da República de que não é informado de acordos firmados por ministros.

De acordo com quem conversou com o presidente do Senado, Bolsonaro relatou na conversa que não tinha conhecimento sobre o acordo e negou que ele tenha sido desfeito.

Alcolumbre criticou declarações e a divulgação de vídeo por Bolsonaro com convocação para atos contra o Congresso no dia 15.

As negociações em torno do acordo foram prejudicadas depois da divulgação de uma declaração do ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno.

Em diálogo captado com Ramos e Guedes, ele chama o Congresso de chantagista.

A situação piorou após Bolsonaro compartilhar com aliados, pelo WhastApp, um vídeo convocando para os protestos em 15 de março. Os organizadores carregam bandeiras contra o Congresso e o Judiciário.

O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, afirmou que o Orçamento impositivo vai demandar ajustes em normativos sobre a execução de despesas da União.