PF liga tentativa de golpe ao caso da 'Abin paralela'
Relatório do indiciamento de Bolsonaro e outros 36, aponta que inteligência serviu de apoio no plano para matar Lula, Alckmin e Moraes
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 22 de novembro de 2024
Relatório do indiciamento de Bolsonaro e outros 36, aponta que inteligência serviu de apoio no plano para matar Lula, Alckmin e Moraes
Caio Crisóstomo - Folhapress

Brasília - A Polícia Federal aponta, no relatório final em que indiciou Jair Bolsonaro (PL) e outros 36 aliados, a relação entre pessoas envolvidas com a tentativa golpe de Estado e o caso da chamada "Abin paralela". A estrutura paralela na Abin (Agência Brasileira de Inteligência) é alvo da Operação Última Milha e mira ao menos quatro dos indiciados pela PF na apuração sobre a trama golpista e o plano para assassinato de Lula (PT), Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).
São eles: o ex-diretor da Abin e deputado Alexandre Ramagem (PL); o general da reserva Augusto Heleno, ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), a quem a agência estava vinculada; o policial federal Marcelo Bormevet e o subtenente do Exército Giancarlo Gomes Rodrigues.
Ao divulgar o indiciamento no inquérito do golpe, a PF afirma que as investigações "apontaram que os investigados se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas" e a descoberta de núcleos. Um deles, o de inteligência paralela.
Os outros cinco núcleos seriam o de desinformação e ataques ao sistema eleitoral, o responsável por incitar militares a aderirem ao golpe de Estado, o jurídico, o operacional de apoio às ações golpistas e o operacional para cumprimento de medidas coercitivas.
Militares são maioria entre os suspeitos - 25 de um total de 37 indiciados. O indiciamento aponta suspeita dos crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.
Ramagem é investigado sob suspeita de comandar a Abin paralela na época em que era diretor da agência. Mas, no fim de outubro, ele foi incluído no inquérito sobre a trama golpista.
A reportagem apurou que os investigadores teriam encontrado indícios de que Ramagem participou dos preparativos para a tentativa de golpe. Procurada, a defesa dele não respondeu.
A reportagem não conseguiu contato com as defesas de Augusto Heleno, Bormevet e Giancalo.
O subtenente Giancarlo Rodrigues, que é investigado no caso da "Abin paralela", também foi incluído e intimado para depor à PF em 5 de novembro. Em oitiva na superintendência da corporação na Bahia, negou saber da existência de um plano de golpe.
De acordo com as investigações, Bormevet e Giancarlo Rodrigues estavam em "completo desvio da finalidade institucional da Abin".
A polícia também interceptou troca de mensagens do final de 2022 em que dois investigados falam, segundo a investigação, sobre "minuta do decreto de intervenção" para o "rompimento democrático".
"O Nosso PR imbrochável já assinou a porra do decreto?", questiona o policial Bormevet, segundo os documentos. Giancarlo Rodrigues responde, ainda de acordo com o relatório: "Assinou nada. Tá foda essa espera".
Como mostrou a Folha de S.Paulo, em junho os investigadores pediram o compartilhamento das provas da apuração sobre a "Abin paralela" com os inquéritos das fake news e da tentativa de golpe.
O pedido se deu após a PF encontrar as conversas entre Bormevet e Giancarlo e também arquivos em que Ramagem fazia pregações contra a lisura do processo eleitoral brasileiro e favoráveis a rupturas, além de um dossiê de procuradores da República que seriam contrários ao governo Bolsonaro e familiares.
A corporação achou e-mails produzidos por Ramagem que serviriam para subsidiar Bolsonaro de informações para contestar as urnas eletrônicas, como revelou o jornal O Globo. A informação foi confirmada pela Folha de S.Paulo.
As apurações sobre tentativa de golpe de Estado em 2022 foram encerradas nesta quinta pela PF, que concluiu que Bolsonaro participou de uma trama para impedir a posse de Lula (PT).
A PGR (Procuradoria-Geral da República) deverá avaliar os indícios para decidir se denuncia o ex-presidente. Se a denúncia for apresentada, o passo seguinte será a Justiça decidir se torna Bolsonaro réu.
Declarado inelegível pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até 2030 por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral, o ex-presidente foi indiciado neste ano pela PF em três inquéritos: sobre as joias, a falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19 e, agora, a tentativa de golpe de Estado.
PRÓXIMOS PASSOS
Por enquanto, Bolsonaro e os outros indiciados são tratados apenas como suspeitos. Agora, a PGR (Procuradoria-Geral da República), órgão máximo do Ministério Público, deverá avaliar os indícios levantados e decidir se apresenta denúncia, arquiva o caso ou pede mais investigações à PF.
Se a denúncia for realizada, os ministros do STF precisam julgar se a aceitam. A partir daí, os acusados passam à condição de réus e começam a responder ao processo penal. Eles só são considerados culpados se houver decisão definitiva ou não existir mais possibilidade de recurso.
Caso Bolsonaro fosse condenado nessas condições em 2025, por exemplo, ele ficaria inelegível até 2061, quando teria 106 anos de idade. Hoje o ex-presidente não pode disputar eleições até 2030, segundo decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), por ataques e mentiras que proferiu sobre o sistema eleitoral.
OUTRO LADO
Bolsonaro criticou Moraes: "O ministro Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei", disse ele na quinta (22) ao site Metrópoles.
O ex-presidente afirmou ainda que "tem que ver o que tem nesse indiciamento" e que vai esperar o seu advogado analisar o relatório. "Isso, obviamente, vai para a Procuradoria-Geral da República. É na PGR que começa a luta. Não posso esperar nada de uma equipe que usa a criatividade para me denunciar", disse.

