A Igreja Presbiteriana Central de Londrina pediu apoio dos fiéis para a formação do Aliança Pelo Brasil, o partido que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) quer fundar após desembarcar do PSL, pelo qual foi eleito. Um ônibus plotado com o logotipo do pretendido partido foi estacionado no pátio do templo no fim de semana e, durante o culto, o pastor Emerson Patriota “desafia” os fiéis a conhecer o estatuto e os valores da futura legenda.

Imagem ilustrativa da imagem Pastor cria polêmica ao pregar apoio a partido de Bolsonaro em Londrina
| Foto: Reprodução/Google Maps

Para a fundação de um partido político, são necessárias cerca de 500 mil fichas de apoiamento, com assinatura reconhecida em cartório, que precisam ser validadas pela Justiça Eleitoral. Em Londrina, o principal nome ligado à Aliança Pelo Brasil é o deputado federal Filipe Barros (sem partido), que também foi citado no pedido de apoio durante o culto.

O culto é transmitido ao vivo pelo Facebook e o discurso do pastor Emerson Patriota viralizou nas redes sociais. Aos fiéis, ele explica várias vezes que o futuro partido ainda precisa do apoiamento – as assinaturas para formação –, que não se trata de filiação e, inclusive, comenta a presença de cartorário para reconhecer firma nas assinaturas.

Também cita o deputado londrinense, frequentador da igreja, e exalta os valores do partido pretendido. “Na verdade, eu estava conversando com algumas pessoas e disseram que é mais difícil entrar nesse partido do que em alguns igrejas por aí, sabe? Tem que ter mais vida idônea, do que algumas igrejas exigem. Isso é muito bom, porque tem valores familiares”, diz o pastor.

VEJA O TRECHO EM QUE O PASTOR PEDE APOIO AO FUTURO PARTIDO

REAÇÃO NA INTERNET

A manifestação pró-partido provocou reações nas redes sociais, com comentários na página oficial da Igreja Presbiteriana Central de Londrina no Facebook. Um internauta pergunta: “Esse culto foi antes ou depois de pedirem (sic) pra se filiarem (sic) a um partido político?” “Uma vergonha!”, critica outro.

Outro internauta reclama dos princípios do partido e de comentários já feitos pelo maior expoente da Aliança Pelo Brasil, o próprio Presidente da República. “A legenda do partido foi desenhada com BALAS de [calibre] 38, o encontro marcado por pessoas gritando ‘quero assinar, e assassinar a esquerda’. Seguindo seu líder que já (sic) disse mais de 10 vezes que tem que matar a esquerda, indígena é inutil (sic), MST deve ser morto... Grandes cristãos!!!”, digitou.

Em outro comentário, um internauta reclama: "Eles estão apagando os comentários com questionamentos e não estão respondendo no inbox. Belíssima transparência e honestidade cristã”, protesta.

Por meio da conta oficial da Igreja Presbiteriana do Instagram, a Apecom (Agência Presbiteriana de Evangelização e Comunicação) afirma que a Igreja Presbiteriana do Brasil não é apolítica, mas ressalta que a instituição religiosa é apartidária "e em nenhum momento apresentou ou apresenta apoio a qualquer partido político". A nota também afirma que "a opinião pessoal de membros ou pastores da IPB sobre questões político-partidárias não refletem a opinião oficial da instituição sobre o assunto". (Leia a nota na íntegra ao fim da reportagem)

A FOLHA tentou entrar em contato por telefone com a Igreja Presbiteriana Central na tarde de terça-feira (28) e por meio de mensagem pelo Facebook tanto com a instituição religiosa quanto com o pastor, mas não obteve retorno até o fechamento. O espaço permanece aberto caso queiram se manifestar.

BARROS DIZ QUE ADESÃO É ESPONTÂNEA

Em uma transmissão ao vivo em seu Facebook, o deputado federal Filipe Barros reclamou da repercussão em sites de notícias que ele chama de “chapa branca” e explicou que o ato já havia sido programado anteriormente. “Eu vi eles (sic) criticando essa ação que nós fizemos nesta semana (...) um ato na minha igreja em que as pessoas poderiam sair do culto e, aquelas que quisessem, poderiam assinar o apoiamento ao Aliança Pelo Brasil. Aquelas pessoas que voluntariamente acreditam no presidente Bolsonaro, no Aliança pelo Brasil, estavam no estacionamento da igreja voluntários coletando assinaturas para o Aliança Pelo Brasil”.

Na transmissão, Barros disse que o partido é “o único que reconhece a autoridade de Deus” em seu estatuto, que também defende os valores cristãos, as famílias, as crianças e a contrariedade ao aborto e à “ideologia de gênero”.

Ainda afirmou que a coleta de assinaturas dentro de uma igreja é a manifestação do “estado laico”, que não pode interferir dentro das igrejas e no qual as pessoas podem se associar a qualquer partido. Em seguida, criticou o suposto silêncio destas mídias sobre o PT. “Eu não vejo essa mídia suja falar do PT. O Partido dos Trabalhadores surgiu dentro das comunidades católicas de base da Igreja Católica”, disse. "Que preconceito é esse que esses sites têm dos cristãos participarem da política? Isso é preconceito. Isso é cristofobia. Eles querem justamente impedir os cristãos de participarem da política", acrescentou.

Procurado pela reportagem, Filipe Barros afirmou que a Igreja Presbiteriana Central de Londrina tem regras em comum com a Igreja Presbiteriana do Brasil, mas que existe a liberdade do pastor local tomar determinadas decisões. "A igreja evangélica é infinitamente mais flexível que a católica. Dificilmente tenha algum fiel que seja contrário à criação do partido (Aliança pelo Brasil) na Presbiteriana Central de Londrina. A Igreja Presbiteriana sempre participou na política, não só na cidade como no Brasil todo", aponta. "Assinar ou não é um ato voluntário. Assina quem quer", conclui.

NÃO HÁ IMPEDIMENTOS, DIZ ESPECIALISTA

Especialista em Direito Eleitoral, o advogado Guilherme Gonçalves não vê ilegalidade na estratégia de busca por apoiamentos da Aliança Pelo Brasil, que tenta conquistar afiliados nas igrejas evangélicas, reduto de Bolsonaro. “Para que gerasse algum tipo de impedimento ou obstáculo, teria de provar que houve pessoas coagidas a assinar”, explica.

Por outro lado, ele afirma que pedidos de votos a candidatos em períodos eleitorais nos púlpitos de templos religiosos configurariam abuso de poder religioso, uma derivação do abuso de poder econômico.

CONFIRA A NOTA OFICIAL DA APECOM

Por conta de recentes acontecimentos e questionamentos, esclarecemos mais uma vez publicamente que a Igreja Presbiteriana do Brasil não é apolítica e faz parte da construção de uma sociedade digna a todo cidadão brasileiro, consciente da sua herança judaico-cristã-reformada, tem um compromisso histórico e ideológico com a democracia, entendida como a participação direta do povo nos seus destinos através do voto, de apoia-la e contribuir positivamente para o seu desenvolvimento no Brasil e no Mundo. Tem também um compromisso, fundamentado no amor ao próximo, (Lv.19.18) com a justiça social, com o bem estar do povo, com a eliminação da miséria e da pobreza, (Dt.15.4) com a igualdade dos homens em todos os lugares, níveis, situações, independentemente de sexo, idade, ou condição social individual. (Dt.16). Além do compromisso com o desenvolvimento e a manutenção da paz entre os homens, a promoção da harmonia e da concórdia, tanto no seio da Igreja, como da comunidade nacional. (Mt.5.9). Todavia a IPB é apartidária e em nenhum momento apresentou ou apresenta apoio a qualquer partido político. Em resolução de sua reunião ordinária em 1990, o Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil orienta seus concílios em geral que evitem apoio ostensivo a partidos políticos e que as igrejas não cedam seus templos ou locais de culto a Deus para debates ou apresentações de cunho político. Lembramos ainda que a opinião pessoal de membros ou pastores da IPB sobre questões político-partidárias não refletem a opinião oficial da instituição sobre o assunto.

APECOM - Agência Presbiteriana de Evangelização e Comunicação

(Atualizada às 18h55)

(Colaborou Fernanda Circhia)