Entidades e senadores veem com reservas o projeto que institui o Código Eleitoral, que começará a ser analisado pelo Senado. Aprovado na Câmara dos Deputados em setembro do ano passado, o projeto com 898 artigos consolida toda a legislação que trata do funcionamento dos partidos e das eleições e está em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.

Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária semipresencial destinada à apreciação de autoridades e de outras matérias. 

Mesa:
senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP); 
senador Davi Alcolumbre (União-AP);
presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG);
secretário-geral da Mesa do Senado Federal, Gustavo A. Sabóia Vieira. 

Bancada:
senador Omar Aziz (PSD-AM); 
senador Izalci Lucas (PSDB-DF); 
senador Reguffe (União-DF); 
senador Nelsinho Trad (PSD-MS); 
senador Marcelo Castro (MDB-PI).

Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária semipresencial destinada à apreciação de autoridades e de outras matérias. Mesa: senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP); senador Davi Alcolumbre (União-AP); presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG); secretário-geral da Mesa do Senado Federal, Gustavo A. Sabóia Vieira. Bancada: senador Omar Aziz (PSD-AM); senador Izalci Lucas (PSDB-DF); senador Reguffe (União-DF); senador Nelsinho Trad (PSD-MS); senador Marcelo Castro (MDB-PI). Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Na semana passada, 21 entidades da sociedade civil ligadas à transparência e à fiscalização de gastos públicos encaminharam uma carta ao presidente da CCJ do Senado, senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pedindo a realização de audiências públicas sobre o assunto. Entre outras medidas, o projeto permite que partidos contratem empresas de auditoria para elaborar as prestações de contas e proíbe a divulgação de pesquisas de intenção de voto perto das eleições.

A carta, assinada por entidades como Transparência Brasil, Instituto Não Aceito Corrupção e Observatório Social do Brasil, avalia que o projeto tem “aspectos gravemente controversos” em relação a temas como “acesso à informação de interesse público, transparência, integridade e financiamento partidário”. As entidades destacam que propostas e sugestões foram ignoradas durante o trâmite na Câmara dos Deputados e pedem para a matéria não ser colocada em votação no Plenário do Senado.

Outro alerta foi feito pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edson Fachin, na semana anterior. Em ofício ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), Fachin alertou que o Código pode esvaziar as funções da Justiça Eleitoral, ao deixar a cargo dos partidos as prestações de contas e dificultar a fiscalização dos gastos.

Para o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que presidirá o TSE até agosto, a aprovação do projeto pelo Senado ainda pode gerar insegurança jurídica e afetar a relação entre os Poderes, já que o Legislativo estaria interferindo em uma atribuição constitucional do Judiciário, a análise e as prestações das contas dos partidos.

Fim da transparência

Para as entidades signatárias da carta enviada ao Senado, o PL 112 representa o fim da transparência na prestação de contas dos partidos. O cientista político e advogado Marcelo Issa, diretor do movimento Transparência Partidária, explica que, caso o projeto seja aprovado, as prestações de contas referentes ao Fundo Partidário deixarão a base de dados da Justiça Eleitoral e passarão para a Receita Federal sem acesso público e com critérios diferentes dos atuais. A fiscalização também seria dificultada.

“O projeto acaba com o Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA), criado em 2018, e permite que os partidos contratem empresas para fazer relatórios dos gastos. A Justiça Eleitoral só poderia fazer conferências contábeis, formais, checar se as contas batem, não poderia avaliar, como é feito hoje, se um valor pago foi dentro do preço de mercado”, afirma o cientista político.

Isso poderia abrir as portas para os partidos gastarem de forma indiscriminada os recursos do Fundo Partidário. “É cerca de R$ 1 bilhão por ano que engorda o caixa dos partidos, e não das campanhas”, diz Marcelo Issa. “Teve o caso de um dirigente partidário que mandou instalar ar condicionado e comprou mantimentos para uma chácara, tudo com recursos do Fundo Partidário”.

A justificativa do projeto é que o trabalho da Justiça Eleitoral seria “simplificado” com a contratação de empresas privadas. “O que querem de fato é permitir a utilização dos recursos do Fundo Partidário para qualquer finalidade. O projeto prevê que as despesas ficarão a critério da direção executiva do partido”, aponta Issa.

Além disso, não seria considerado irregular o uso de menos de 20% do valor do Fundo Partidário para outros fins. “Mesmo que a Justiça Eleitoral identifique alguma irregularidade, se não superar 20% do valor que o partido recebeu, não caracteriza irregularidade. Tem partido recebendo R$ 200 milhões”, destaca Marcelo Issa. Ele lembra ainda que a proposta reduz de 5 para 2 anos o prazo de prescrição das irregularidades detectadas e limita em R$ 30 mil as multas aos partidos.

O cientista político avalia que o projeto pode ser considerado inconstitucional ao tocar em uma atribuição da Justiça Eleitoral. “Certamente vai ser questionado, porque a Constituição diz que a análise das contas dos partidos é competência da Justiça Eleitoral, não pode privatizar isso. O projeto amarra as mãos da Justiça Eleitoral”.

"COISA DO CENTRÃO"

O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) diz não acreditar que a votação ocorra neste ano. “Quem está por trás disso é o centrão. O projeto traz uma série de afrouxamentos para os partidos, notadamente na prestação de contas do dinheiro público que os partidos usam. Acho que esse assunto não vai ser discutido agora, até porque eles queriam apressar no ano passado para aplicar nas eleições deste ano. Isso não vai ser decidido agora”.

Guimarães diZ ter um substitutivo para o projeto. “Precisa reformar sim, ter uma lei eleitoral mais clara, uma lei partidária mais clara, juntar tudo isso em uma peça única e sobretudo acabar com essa bagunça que é esse número de partidos que temos. É um escândalo que de certa forma torna o país ingovernável”. A reportagem da FOLHA entrou em contato com os outros dois senadores do Paraná, Alvaro Dias e Flávio Arns (ambos do Podemos), mas eles não se posicionaram sobre o assunto.

Alguns senadores estariam tentando passar rapidamente a proposta na CCJ, para que ela seja aprovada pelo Plenário sem alterações e não precise retornar à Câmara. O relator do projeto é o senador Alexandre Silveira (PSD-MG). Na semana passada, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que caberá ao presidente da CCJ pautar a votação quando achar conveniente.

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