Curitiba - A declaração do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) sugerindo "um novo AI-5" em caso de "radicalização" da esquerda brasileira repercutiu nos últimos dias fora e dentro do País. Não só partidos políticos, incluindo o próprio PSL, como magistrados e representantes de instituições da sociedade civil repudiaram a fala do filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL-RJ).

Depois da repercussão, Eduardo voltou atrás, pediu desculpas garantindo que não existe possibilidade de um novo AI-5
Depois da repercussão, Eduardo voltou atrás, pediu desculpas garantindo que não existe possibilidade de um novo AI-5 | Foto: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

Na avaliação do professor Clodomiro Bannwart, do departamento de filosofia da UEL (Universidade Estadual de Londrina), a reação é um bom sinal. O Ato Institucional número 5 foi o mais duro dos 17 grandes decretos assinados durante a Ditadura Militar no Brasil. Resultou na perda de mandatos de parlamentares e na suspensão de garantias constitucionais, que culminaram com a institucionalização da tortura.

"Essa repercussão negativa é positiva. É um sinal de que a sociedade não tolera nenhum tipo de retrocesso do ponto de vista democrático e constitucional no país. Esse tipo de fala por parte de uma pessoa que teve êxito de ser eleita como deputado federal com uma quantidade expressiva de votos, o mais bem votado, que chega ao mandato referendado pela legitimidade da soberania popular, é inconcebível; é um atentado contra o Estado democrático de Direito", opina Bannwart.

Ele diz não acreditar na repetição do AI-5 tantas décadas depois. "O Brasil caminhou, consolidou suas instituições e não permite mais nenhum retrocesso nessa linha. Por outro lado, esse tipo de argumentação como forma de tentar inviabilizar qualquer argumento de oposição ou de esquerda também é antidemocrático. Numa democracia, nós convivemos com todas as possibilidades de manifestações políticas, à esquerda ou à direita", comenta.

Ainda de acordo com o professor, dizer que, se a oposição intensificar determinadas críticas ou manifestações populares, o governo vai "endurecer" é, além de uma ameaça, uma chantagem, algo fora dos padrões democráticos. "Talvez a pergunta que deva ser feita é: 'e se fosse a esquerda no poder fazendo esse tipo de discurso? Não seria igualmente perigoso?," questiona. "Se queremos fazer política, devemos fazer dentro das regras estabelecidas", opina.

"FALA DETURPADA"

Em entrevista ao programa "Brasil Urgente", Eduardo voltou atrás da afirmação, pediu desculpas, garantiu que essa possibilidade não existe e argumentou que muitos estavam "propositalmente deturpando" sua fala. Na sexta-feira (1°), porém, escreveu no Twitter: "tem muito 'defensor da democracia e da liberdade' louco pra cassar parlamentar por falar (...) e também querem censurar a internet.".

O presidente também foi questionado pela imprensa, na saída do Palacio do Alvorada, sobre o posicionamento do filho. Primeiro respondeu que não tinha visto a entrevista. Depois declarou que o parlamentar é independente. "Não existe. AI-5, no passado, existia outra Constituição. Esquece. Não existe mais (...) Cobrem dele. Quem quer que seja que fale em AI-5 está sonhando".

Um dos principais defensores do governo no Congresso Nacional, Filipe Barros (PSL-PR) criticou a importância dada pelos meios de comunicação ao tema. "Ontem uma fake news escandalosa, fabricada pela #GloboLixo, foi revelada e ganhou enorme atenção. Hoje, uma frase hipotética sobre uma situação também hipotética ganha manchetes histéricas nos jornais. Será que querem desviar a atenção?", perguntou.

"Comparem a atenção que a mídia está dando à frase do @BolsonaroSP [Eduardo Bolsonaro] sobre uma situação hipotética com a preocupação da mesma mídia com a fabricação de uma Fake News abjeta, que tentaram usar para incriminar o presidente da república. Se todos os políticos e autoridades reagissem às ditaduras REAIS E ATUAIS da mesma forma como estão reagindo a uma frase sobre uma hipótese, a América Latina inteira seria um continente mais livre e democrático", completou.

NOVA DEFESA

Neste domingo (3), após participar de uma marcha contra a legalização das drogas no País, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, o deputado Eduardo Bolsonaro, em conversa com a imprensa, voltou a se defender das críticas recebidas por ter sugerido um novo AI-5 no caso de uma radicalização da esquerda no Brasil. "Qualquer pessoa com dois neurônios conseguiu entender o que eu falei ali, só os opositores que querem se aproveitar para dizer que eu tenho alguma coisa autoritária", disse.

"Eu não falei de resgatar AI 5. Falei sobre a possibilidade de uma medida enérgica. Talvez tenha sido infeliz por citar o AI-5. Se eu não tivesse citado o AI-5, não teria tido essa polêmica toda. No entanto, vão perguntar ao deputado Humberto Costa (senado do PT-PE) se ele quer realmente colocar fogo no Brasil, como ele quer fazer isso? Vão perguntar aos deputados do PT, como eles querem fazer essas ditas manifestações?"

Questionado que medidas poderiam ser tomadas, o deputado lembrou que o presidente da República citou, por exemplo, a análise de uma nova lei contra terrorismo. "O espaço é esse. Tem um projeto de lei na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN), que foi pautado e retirado de pauta, do líder Major Vitor Hugo", sinalizou ele, citando que está prevista a realização, neste mês de novembro, de um seminário, coordenado pelo deputado sargento Gurgel para discutir o tema ainda este mês de novembro. (Com Tânia Monteiro/Agência Estado)