A oposição ao governador Ratinho Junior (PSD) na Assembleia Legislativa do Paraná (AL) está tentando obter informações do governo a respeito da contratação de um software da mesma empresa israelense que teria fornecido o sistema de espionagem para a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) durante o governo de Jair Bolsonaro. Firmado em março de 2019, o contrato entre o governo do Paraná e a Suntech S/A (empresa que mudou de nome para Cognyte) é no valor de R$ 6,2 milhões, com dispensa de licitação, e prevê a utilização do programa pela Polícia Civil.

O pedido de informações foi protocolado na semana passada pelo deputado estadual Requião Filho (PT), com base na Lei de Acesso à Informação. Ele ainda encaminhou pedidos de providência para o ministro da Justiça, Flávio Dino, para a Procuradoria-Geral da República e para o Grupo Especializado na Proteção ao Patrimônio Público (Gepatria), do Ministério Público do Paraná. De acordo com o deputado, depois dessa aquisição foram firmados outros contratos para fins semelhantes, todos com a empresa Techbiz Digital.

No documento, o deputado questiona se o software fornecido pela Cognyte ao governo do Paraná é o First Smile, o mesmo adquirido pela Abin durante o governo Bolsonaro. A espionagem no governo passado foi alvo de uma operação da Polícia Federal no dia 20 deste mês, quando dois servidores da agência foram presos e outros três, afastados. A suspeita é que opositores, advogados e jornalistas tenham sido monitorados. O First Smile fornece a localização do investigado e dá acesso a ligações e a mensagens de texto. É possível monitorar até 10 mil pessoas simultaneamente.

Controladoria do Estado

Requião Filho disse ainda que “há indícios” de que a ferramenta vem sendo utilizada pela Controladoria Geral do Estado, órgão que assessora diretamente o governador Ratinho Junior. “Não questionamos o uso de tecnologia para grampear, rastrear, acessar dados com autorização judicial pela polícia. Coloco em questionamento a criação de uma central de inteligência dentro da Controladoria do Estado, com capacidade de grampear pessoas sem autorização judicial”, afirmou.

No pedido de informações, Requião Filho questiona se houve a criação de uma “Diretoria de Inteligência” na CGE. “Queremos saber se houve uso político desta ferramenta no Paraná. Quem, quando, como, e por que foi monitorado ou grampeado? Teriam sido grampeados deputados de oposição? Juízes, promotores, atores políticos que discordaram em algum momento do governo?”, questionou o parlamentar. O contrato com a Suntech foi assinado pela Secretaria de Estado da Segurança, à qual está subordinada a Polícia Civil.

Governo nega

Em nota, o governo do Paraná afirmou que o sistema é utilizado de forma legal. “A Polícia Civil do Paraná esclarece que a ferramenta tecnológica é utilizada por forças policiais do mundo inteiro, colocando o Paraná na vanguarda da segurança pública. A utilização da ferramenta sempre se deu com observância das normas legais. A construção de uma segurança pública de primeiro mundo é alicerçada na existência de uma polícia moderna, profissional e bem equipada”, diz a nota.

A assessoria do governo negou que a CGE tenha acesso ao sistema. “Essa ferramenta é usada exclusivamente pelas forças policiais, somente com autorização da Justiça”. Pela lei federal 8.666, a lei das licitações, há inexigibilidade de licitação quando um fornecedor ou prestador de serviços tem características e habilidades que o tornam exclusivo e único no mercado. Ou em casos de emergência, como calamidades, guerra e desastres naturais.

A Cognyte é um braço da empresa de tecnologia israelense Verint Systems e teria fornecido produtos para outros nove estados brasileiros, além da Abin: Alagoas, Amazonas, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Pará, Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Sul.