A tentativa da Prefeitura de, por meio do projeto de lei 66/23, atribuir à secretaria de Agricultura o dever de fiscalizar o parcelamento do solo rural do município segue motivando embates em Londrina. Agora foi a vez de o Ministério Público do Paraná (MP-PR) se manifestar em relação ao tema e classificar o PL como “essencial para otimizar a fiscalização” e “primordial para a construção de um sistema municipal de enfrentamento aos usos ilegais do solo”.

Em tramitação na Câmara Municipal de Londrina (CML), a proposta da gestão Marcelo Belinati (PP) também prevê multa de até R$ 10 milhões a quem abre loteamentos clandestinos na zona rural, como já noticiado pela FOLHA em junho.

A posição do MP consta em uma recomendação administrativa emitida na última quarta-feira (4) pela promotora Révia Luna, da área de meio ambiente. Em um dos trechos, ela pontua que, “nos termos do artigo 50 da lei 6.766/79, constitui crime contra a administração pública dar início ou de qualquer modo efetuar loteamento ou desmembramento do solo urbano sem autorização dos órgãos competentes”.

“A legislação municipal segue a mesma lógica da federal – que proíbe que o solo rural seja desvirtuado e parcelado irregularmente para fins urbanos (ou seja, em metragem inferior ao módulo rural) e permite a autuação dos empreendimentos instalados em zona rural que contrariem o seu teor”, prossegue Luna.

AMBIENTE E OBRAS DEVEM AGIR

A titular da 20ª Promotoria de Justiça alerta, no entanto, que há um “posicionamento incongruente” por parte da Prefeitura, já que, conforme a promotora, o Executivo declarou em ofícios ao MP que as secretarias de Ambiente e de Obras “não teriam atribuições para executar a fiscalização dos loteamentos ilegalmente instalados em zona rural”. Para a promotora, a eventual aprovação do texto “complementa a legislação vigente, mas não afasta as atribuições e competências já asseguradas nas normas municipais”.

“Admitir a ilógica competência para fiscalizar irregularidades apenas em zona urbana possibilita o descontrole das ocupações ilícitas, cria demandas desenfreadas e desordenadas por serviços públicos”, argumenta a recomendação administrativa.

45 INQUÉRITOS

Somente o gabinete de Luna concentra 45 inquéritos civis que apuram parcelamento ilegal do solo – desse número, 36 são só de áreas rurais. “Há outras diversas infrações, danos e riscos potenciais ambientais que decorrem da ocupação humana em desacordo com a legislação, como soluções de esgoto clandestinas ou inadequadas, queima de materiais, disposição irregular de resíduos, corte de vegetação nativa, movimentação do solo, intervenção em cursos hídricos”, aponta a representante do MP.

ENTIDADES APOIAM

Ao fim de setembro, quatro entidades da construção civil e do mercado imobiliário – entre elas, o Sindicato da Construção Civil do Norte do Paraná (Sinduscon) e o Sindicato dos Corretores de Imóveis de Londrina (Sincil) – escreveram uma carta aos vereadores para pedir a aprovação do PL 66. Segundo a manifestação, os loteamentos rurais “irregulares e clandestinos” estão sendo “abertamente divulgados e ofertados.”

“A irregularidade e a clandestinidade no parcelamento do solo e no comércio das referidas áreas, sempre acompanhados de aparente vantajosidade financeira, na realidade, acabam por prejudicar diretamente pessoas de boa-fé, profissionais, empresas e entidades geradoras de emprego, receita e renda”, afirma o setor.

CMPTG É CONTRA

Já o Conselho Municipal de Planejamento e Gestão Territorial de Londrina (CMPGT), em parecer dado em meados de junho, pediu a rejeição e arquivamento do texto por, conforme o colegiado, considerá-lo um “risco iminente” para os “chacareiros adquirentes de boa-fé e proprietários que venderam suas propriedades terem suas propriedades expropriadas em ação de dívida ativa fiscal”.

Para o CMPGT, “as situações de irregularidades só ocorreram pela inércia e ineficiência e incúria do município, que ao longo de décadas permitiu o crescimento desordenado e irregular de loteamentos”. O conselho também sugere que “antes da propositura de novo projeto de lei que vise penalizar proprietários de lotes ou loteamentos irregulares, seja desenvolvida política pública que busque regularizar as situações já existentes.”

AUDIÊNCIA NÃO É CONSENSO

Até mesmo a realização de uma audiência pública sobre a proposta não é consenso. A CML, por orientação dos parlamentares da Comissão de Justiça, votará na sessão desta terça-feira (10) o agendamento de um encontro aberto com a comunidade. Para a Prefeitura, porém, isso “não se faz necessário”, já que, de acordo com uma resposta do Executivo enviada à Casa, “não se observa no PL matéria que implique em qualquer alteração no ordenamento territorial londrinense”.