Mesmo com sessões remotas, ressarcimento a deputados estaduais no 1º trimestre supera 2020
PUBLICAÇÃO
sábado, 29 de maio de 2021
Rafael Costa - Especial para a FOLHA
A AL (Assembleia Legislativa do Paraná) gastou com verbas de ressarcimento no primeiro trimestre de 2021 cerca de 2,9% a mais do que entre janeiro e março de 2020 — período anterior à chegada da pandemia de coronavírus no estado.
Conforme consulta ao Portal da Transparência da instituição em 26 de maio, os deputados estaduais receberam, ao todo, entre janeiro e março deste ano, R$ 3.424.563,47 para cobrir despesas da atividade parlamentar como combustíveis, passagens aéreas e serviços de hospedagem para parlamentares e assessores.

No mesmo período há um ano — antes das restrições sanitárias a atividades presenciais e da instalação de sessões plenárias remotas, por exemplo —, os gastos somaram R$ 3.327.578,10. Mais da metade dos deputados (28) aumentaram seus gastos na comparação entre os dois períodos.
A diferença pode aumentar, já que os saldos não utilizados são acumulados para o mês seguinte, podendo ser usados dentro do mesmo exercício financeiro (o ano legislativo). Cada gabinete dispõe de R$ 33.047,86 mensais.
GASTOS
Os volumes de verbas de ressarcimento requeridas variam de parlamentar para parlamentar. No primeiro trimestre deste ano, a maior soma é do deputado Cobra Repórter (PSD): R$ 98.831,65, valor 55,45% maior do que o solicitado no mesmo período de 2020. A menor, de Luiz Fernando Guerra (PSL), um total de R$ 2.837. O parlamentar não fez requerimentos em janeiro e março de 2021.
Na avaliação do deputado Cobra, as incertezas em torno do novo coronavírus reduziram a atividade parlamentar no início de 2020, o que justifica a diferença. “Já no primeiro trimestre de 2021 (um ano depois), o trabalho foi retomado quase que normalmente. Isso voltou a exigir viagens mais constantes à capital”, diz uma nota encaminhada à reportagem via assessoria.
O parlamentar também atribui o aumento de gastos ao aumento de sua base política após as eleições de 2020, que estariam exigindo mais viagens. “Somado a isso, ele tem feito ações de divulgação na região Norte e Norte Pioneiro na condição de vice-líder do Governo e também como presidente da Comissão de Defesa da Criança, do Adolescente, do Idoso e da Pessoa com Deficiência (Criai)”, diz o texto.
Outro deputado que somou um dos maiores gastos no período, Boca Aberta Junior (Pros) atribui as disparidades entre despesas às diferenças entre os trabalhos dos deputados. No primeiro trimestre de 2021, seu gabinete requereu R$ 91.927,58 — 27,79% a mais do que os R$ 71.936,20 entre janeiro e março de 2020.
“A diferença nos gastos de verbas por parte dos parlamentares é referente à intensidade de atuação de cada um, uns mais outros menos”, justifica, em resposta por escrito via WhatsApp. “Gasta mais quem roda mais e trabalha mais. Eu sou um dos mais atuantes da minha região, consequentemente a despesa da minha atividade será maior”, argumenta.
MENOS VERBAS
Parlamentar com a segunda menor soma de despesas no período, Rodrigo Estacho (PV) afirma que assumiu o compromisso de gastar pouco com verbas parlamentares. O deputado, que pediu R$ 11.943,72 em ressarcimentos no primeiro trimestre deste ano, diz gastar “apenas o necessário” como forma de dar “bons exemplos” de zelo pelo dinheiro público.
“Durante a pandemia eu consegui diminuir ainda mais minhas despesas, devido ao teletrabalho e às restrições de circulação, que reduziram o número de viagens e eventos nos quais precisava participar. No mais, acredito que cada deputado deva ter a sua consciência sobre quanto e como usar o dinheiro da verba parlamentar, desde que tudo seja feito com transparência, ficando a critério dos órgãos responsáveis e da população exercer a fiscalização sobre esses gastos”, declara, por meio de assessoria.
Guerra (PSL) também fala em austeridade como linha de atuação. “Desde o início do meu mandato a proposta é gestão enxuta e econômica, mantendo uma média de gastos compatíveis com a necessidade de funcionamento do gabinete”, diz, por escrito.
O deputado avalia de forma diferente a intensidade das atividades na AL nos primeiros trimestres de 2020 e 2021. “Por conta da pandemia tivemos um período atípico, com a realização de sessões remotas e redução nas viagens e, mais atualmente, com o retorno dos trabalhos em forma híbrida. Nesta situação, acredito que a manutenção dos gabinetes deveria demandar menos despesas.”
Para Guerra, qualquer economia gerada retorna aos cofres públicos. “Por isso, defendo que é necessário se fazer mais com menos, ainda mais em um momento tão difícil como este que estamos vivendo”, diz.
ANÁLISE DEVE SER FEITA CASO A CASO, DIZ PROFESSOR DA UFPR
Na avaliação de Rodrigo Kanayama, professor da faculdade de Direito da UFPR, as chamadas verbas de representação, também presentes no Legislativo Federal, são necessárias para a boa atuação dos deputados, apesar de serem vistas como privilégios pela população. “O importante é que haja transparência das verbas que são utilizadas”, diz.
Segundo o pesquisador, mesmo políticos em início de carreira que usam a austeridade com este tipo de verba como diferencial eleitoral acabam percebendo que a atividade parlamentar demanda recursos que não cabem no salário de deputado, por exemplo — a não ser que se trate de alguém com grande patrimônio pessoal.
A utilização destas verbas para se aproximar da população e realizar audiências públicas, por exemplo, é positiva. “Cada caso é um caso a ser analisado com cuidado”, explica. “Não há uma necessária correlação entre gastar mais ou menos com ser um parlamentar melhor ou mais honesto”, defende.
Controle
Segundo o especialista, é possível garantir princípios como a eficiência e a impessoalidade nos gastos e na contratação de serviços por meio da correta prestação de contas e do controle social.
Iniciativas como a “Operação Serenata de Amor”, que mantém uma conta do Twitter (@RosieDaSerenata) que posta automaticamente suspeitas em gastos de deputados federais identificadas por um programa de computador, são bons exemplos de fiscalização por parte da sociedade.
Para Kanayama, contudo, é possível aprimorar o sistema atual por meio de planejamento e processos licitatórios concentrados pela AL ou por meio da exigência por contratações pelos menores preços. “Porém, criar amarras muito fortes pode causar um efeito negativo”, avalia.
Boca Aberta Junior (Pros) avalia que não há risco de gastos indiscriminados, já que a Comissão de Tomada de Contas da AL analisaria as despesas “nota a nota”. “Para quem tiver dúvida e quiser conferir e questionar, ficam disponibilizadas todas as notas no Portal da Transparência.”
Na avaliação do deputado Luiz Fernando Guerra (PSL), houve avanços recentes no portal da AL, mas é necessário ampliar o controle por meio de órgãos como o Ministério Público e o Tribunal de Contas, além da própria população.
Os que menos gastaram - 1º tri. de 2021
Luiz Fernando Guerra (PSL)R$ 2.837,00
Rodrigo Estacho (PV)R$ 11.943,72
Mabel Canto (PSC)R$ 24.858,33
Evandro Araújo (PSC)R$ 29.992,50
Gilson de Souza (PSC)R$ 33.642,35
Homero Marchese (Pros)R$ 34.708,44
Artagão Junior (PSB)R$ 41.615,32
Professor Lemos (PT) R$ 43.059,37
Marcio Pacheco (PDT)R$ 44.559,88
Luciana Rafagnin (PT)R$ 45.482,94
Os que mais gastaram - 1º tri. de 2021
Cobra Repórter (PSDB)R$ 98.831,65
Paulo Litro (PSDB)R$ 93.046,29
Boca Aberta Junior (PROS)R$ 91.927,58
Alexandre Curi (PSB)R$ 90.394,50
Soldado Fruet (PROS)R$ 87.760,32
Cristina Silvestri (CDN)R$ 87.417,75
Douglas Fabrício (CDN)R$ 84.671,96
Tadei Veneri (PT)R$ 84.536,79
Jonas Guimarães (PSB)R$ 83.421,95
Tercílio Turini (CDN)R$ 82.828,39
Os maiores aumentos em relação ao 1º tri. de 2020
Luiz Carlos Martins (PP)206,05%
Gilson de Souza (PSC)168,32%
Anibelli Neto (MDB)98,67%
Jonas Guimarães (PSB)96,79%
Mabel Canto (PSC)69,16%
Maria Victória (PP)57,61%
Michele Caputo (PSDB)57,26%
Cobra Repórter (PSDB)55,45%
Cantora Mara Lima (PSC)33,41%
COMO FUNCIONA
As verbas indenizatórias cobrem despesas como combustíveis e locação de veículos, passagens aéreas, serviços de hospedagem, alimentação, serviços de divulgação da atividade parlamentar, locação de imóveis para instalação de escritório de representação parlamentar, material de escritório e gastos diversos do gabinete, incluindo telefonia e TV a cabo.
Para receber, o gabinete do parlamentar deve apresentar notas fiscais, recibos, faturas ou mesmo os bilhetes, no caso de passagens. As despesas são examinadas pela Comissão de Tomada de Contas da AL, presidida por Jonas Guimarães (PSB).
Questionada sobre a disparidade entre as verbas requeridas pelos parlamentares, o aumento observado no primeiro trimestre deste ano e se os atuais critérios para o ressarcimento de gastos de parlamentares poderiam favorecer gastos indiscriminados, a Assembleia Legislativa do Paraná respondeu, por meio de nota, que “os gastos com as verbas de ressarcimento são de responsabilidade de cada gabinete parlamentar.”
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