Mazza chega aos 90 anos sem perder a força da crítica e vigor da atualidade
Colunista de política, que está na ativa há 70 anos - 40 deles na FOLHA, tem a história confundida com a do próprio Estado
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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021
Colunista de política, que está na ativa há 70 anos - 40 deles na FOLHA, tem a história confundida com a do próprio Estado
Pedro Moraes - Grupo Folha
Sob as densas sobrancelhas, os olhos atentos buscam acompanhar os fatos com a mesma velocidade que surgem. A disposição e o dinamismo tão comuns entre os jovens permanecem intactos no provecto jornalista Luiz Geraldo Mazza. O leitor costumeiro talvez não tenha percebido, mas o colunista que ocupa as páginas de política na FOLHA diariamente, exceto às segundas-feiras, completa, nesta quarta-feira (10), 90 anos. Para um homem de sua idade, qualquer cálculo indica marcas impressionantes, mas impossíveis de serem destacadas. São mais de 70 anos de carreira, 40 deles dedicados ao jornalismo opinativo neste veículo. Das frases feitas e perguntas óbvias sobre tamanha façanha de vida, o próprio Mazza foge e mostra seus pés fincados na realidade. “Parece que fiz muito pouco para conquistar esse marco. Sempre fui uma pessoa ativa. Essa idade assusta, às vezes parece que não tem nada a ver comigo, ainda estou trabalhando. Aliás, não posso ficar sem trabalhar. Esta é a atividade que ocupa e alivia o drama da passagem do tempo”, afirma.
Sua chegada na imprensa foi feita de forma quase que natural em seu tempo. Apaixonado pelas letras, viu no Direito a sua formação intelectual. Diplomado em 1954 na Universidade Federal do Paraná, já ocupava as páginas nos jornais. Pode-se dizer que trabalhou em quase todos os que circularam no Estado. Estava na primeira equipe do extinto “Diário do Paraná”, do poderoso grupo dos Diários Associados de Assis Chateaubriand. Também fez carreira no “Última Hora”, de Samuel Wainer, e teve coluna semanal na “Folha de São Paulo”, somente para listar alguns. Funções, exerceu de todo tipo: repórter, chefe de reportagem, editor, chefe de redação. Mas, como colunista de opinião, ganhou boa parte da vida. Na TV, também fez história, desde os primórdios, até dirigir, por dez anos, o telejornalismo da TV Paranaense Canal 12. O meio de comunicação hoje é um de seus principais meios companheiros em tempo de pandemia. “Mantenho fiel o hábito da leitura dos jornais, mas fico ligado nos canais de notícia, que dão uma visão mais ou menos geral do que ocorre. Ter notícias na província é complicado”, diz, referindo-se a Curitiba, cidade onde vive desde os 9 anos.
PARNANGUARA
Da infância nas margens do Rio Itiberê, em Paranaguá, onde nasceu, na Rua Visconde de Nácar, ele lembra com vigor dos hidroaviões alemães que voavam pela região. Recorda-se com orgulho que o maestro e compositor Heitor Villa-Lobos frequentou sua casa, reminiscências que muito poderiam ter levado o jovem à literatura. Mas, mesmo com a imprensa, seu destino na maturidade foi ser acolhido pela Academia Paranaense de Letras, onde ocupa a cadeira de número 20 desde 1998. “A minha chegada ao jornal foi por meio da fantasia da literatura, o que era muito comum. Aqui fazíamos uma imprensa cheia de parnasianismos, mas logo chegaram os especialistas de São Paulo com o trabalho da diagramação, que era desconhecido. Abandonamos a visão pobre que tínhamos na época de colocar um painel com os fatos na porta dos jornais”, narra. Um dos episódios mais marcantes foi o da notícia de que o leite estava "batizado" e, para provar, o jornal pendurou uma garrafa em que um peixe nadava no seu interior. “Havia um lado lírico, dos jornais cantados pelos pequenos jornaleiros. Os meninos que gritavam as manchetes nas ruas”.
Sua longa experiência como jornalista de opinião fez com que se confrontasse com os mais diferentes governos, nas mais diferentes épocas. Durante a Ditadura Militar, impedido de exercer outra de suas atividades, atingido por um ato institucional e respondendo a um processo militar, foi convidado pelo então proprietário da FOLHA, João Milanez, para assinar sua coluna. A decisão à época continua sendo motivo de orgulho para a empresa. “É uma imensa satisfação ter um profissional tão representativo do jornalismo paranaense, como é o Luiz Geraldo Mazza, como colunista do jornal. Sem dúvida, é o mais importante colunista político do Paraná e um dos mais importantes do Brasil. Devemos comemorar pela oportunidade de contar diariamente com sua análise e opinião de temas políticos do nosso Estado e do nosso País”, afirma Nicolás Mejía, superintendente da FOLHA.
EXEMPLO
Entre os colegas a presença e trajetória do jornalista são motivo de inspiração. Com seu jeito próprio e com alguma resistência à tecnologia – não usa celular –, Mazza é reconhecido por seu profissionalismo e sua incansável determinação. A chefe de redação da FOLHA, a jornalista Adriana de Cunto, trabalhou pessoalmente com o colunista por 12 anos. O período fez construir nela uma imensa admiração. “Ele é um ícone da imprensa paranaense e o mais importante colunista de política do Estado. A história dele se confunde com a história do jornalismo do Paraná, pois em sua trajetória transitou por diferentes veículos, sempre com muita competência”, elogia, ressaltando seu vigor. “Com um estilo muito próprio, expressivo, é um homem forte que nunca deixou que as dificuldades da vida abalassem a sua trajetória admirável. A idade não diminuiu a disposição para trabalhar, se mantém uma pessoa ativa, de memória invejável e uma das mentes mais brilhantes com quem eu já tive o prazer de trabalhar”.
O olhar aguçado e as palavras certeiras fizeram com que os próprios analisados por Mazza vissem sua importância para a construção do papel democrático que a imprensa preenche na sociedade. Pela ocasião do aniversário, o governador Ratinho Junior (PSD) celebra a data. “Ele é testemunha ocular dos bastidores da política e das transformações da nossa sociedade. O Paraná sempre teve nele um cidadão atento e um profissional hábil. Um feliz aniversário! Parabéns pelos 90 anos! Que Deus lhe traga felicidades e saúde”, estima.
O presidente da Assembleia Legislativa, o deputado Ademar Traiano (PSDB), também ressalta a importância do veterano. “Comemoramos, em plena pandemia, os 90 anos de uma verdadeira lenda do jornalismo paranaense, Luiz Geraldo Mazza: mais de 70 anos de jornal, sempre um trabalho da melhor qualidade. Com humor, cultura, informação, independência e profissionalismo. Sem esquecer o monumental talento, o bom caráter e o refinado e inimitável senso de humor. Personagem de histórias deliciosas que enriqueceram o folclore curitibano”.
BOCA MALDITA
Torcedor do Coritiba – acompanha os jogos mesmo nas más fases, como ocorre atualmente –, Mazza é apreciador de longas horas de pescaria, adepto de uma cervejinha ou uma caipirinha, e não dispensava circular por Curitiba de ônibus. Na capital paranaense sempre foi personagem conhecido na Boca Maldita, entre cafés, bancas de revista e bancos do calçadão na Avenida Luiz Xavier. Entre tantos amigos que guardam boas recordações das noites de boa prosa está o advogado criminalista e professor da Universidade Federal do Paraná René Dotti, que ressente a falta dos comentários do companheiro no rádio. “O Mazza tem a melhor memória do Paraná. Não há evento político que ele não tenha conhecido em detalhes. Eu ouvia sempre no rádio, quando ele exercia uma crítica moderada e de qualidade, sempre com humor. São inesquecíveis nossas noites na Boca Maldita. Um amigo muito querido que desejo que tenha os 90 anos muito celebrados”, deseja.
Tão longa quanto sua relação com a imprensa é o seu casamento. Mazza ostenta outra marca invejável ao lado de sua mulher, Lucy Werneck Mazza: bodas de platina. São 65 anos numa união que gerou quatro filhos, seis netos e seis bisnetos. O olhar de admiração é visto por quem carrega no nome a marca da hereditariedade: Luiz Geraldo Mazza Neto, 27 anos, que também tem no jornalismo o seu meio de vida. “É um orgulho e ao mesmo tempo uma responsabilidade tremenda em levar este nome. Nunca me imaginei na área. Comecei na faculdade de Publicidade e Propaganda e, com um ano de curso, eu tranquei e fui para o Jornalismo, quando me identifiquei com a profissão. Vejo como uma continuidade levar o nome dele por mais tempo ainda pelo jornalismo. É claro que ele sempre será lembrado. Tento seguir o jornalismo ético que ele sempre defendeu”, diz orgulhoso.