Rio de Janeiro - A ação deflagrada pela Polícia Federal que desarticulou um plano do PCC para atacar o ex-juiz e senador paranaense Sergio Moro (União Brasil) e outras autoridades serviu de munição para mais um embate pessoal entre ele e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O titular do Planalto afirmou nesta quinta-feira (23) achar ser "uma armação" de Moro a articulação da facção criminosa descrita pela PF para atingir o ex-juiz da Operação Lava Jato. "Eu não vou falar porque acho que é mais uma armação do Moro. Quero ser cauteloso, vou descobrir o que aconteceu. Mas é visível que é uma armação do Moro", disse o presidente.

A ameaça contra o senador foi descrita pelo próprio ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), ao divulgar a operação da PF contra o PCC nesta quarta (22). "Mas isso vou esperar. Não vou ficar atacando ninguém sem ter provas. Acho que é mais uma armação. E se for mais uma armação, ele vai ficar mais desmascarado ainda. Não sei o que ele vai fazer da vida se continuar mentindo do jeito que ele está mentindo", afirmou Lula, em visita ao Complexo Naval de Itaguaí (RJ), onde é desenvolvido o programa do submarino nuclear da Marinha.

O presidente expôs suspeita sobre a atuação da juíza Gabriela Hardt, substituta de Moro na condução da Lava Jato na Justiça Federal de Curitiba e responsável por assinar os mandados de prisão. "Vou pesquisar o porquê da sentença. Fiquei sabendo que a juíza não estava nem em atividade quando deu o parecer para ele."

Moro respondeu às insinuações de Lula por meio de um vídeo postado em suas redes sociais em que cobra "decência" de seu adversário político. "Eu repudio veementemente essas afirmações a uma família ameaçada pelo crime organizado. Se o presidente não tem nenhum apreço por mim, pela vida humana, peço pelo menos que respeite a mim e a minha família, peço que respeite o trabalho que a PF vem realizando e as polícias que estão prestando segurança a mim e a minha família estão fazendo", afirmou o senador.

"E pergunto ao presidente da República se diante dessas declarações realizadas frente à ameaça a uma família pelo crime organizado se o senhor não tem decência. O senhor tem que fazer uma reflexão muito séria a respeito do que o senhor pretende no seu governo. se o senhor quer transformar o seu governo num ato contra a população brasileira ou se o senhor vai de fato governar pro bem do país", prosseguiu.

ORIGEM DA RIXA

Moro e Lula são adversários desde que o então juiz da Lava Jato determinou sua prisão, em 2018, meses antes da disputa eleitoral pela Presidência que colocava o petista como líder das pesquisas. A decisão foi referendada pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) e depois pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e Lula ficou mais de 580 dias detido na sede da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. Naquele ano, o então candidato Jair Bolsonaro (hoje no PL) venceu as eleições e Moro aceitou ser seu ministro da Justiça, o que motivou diversas ações jurídicas da defesa do petista alegando parcialidade e atuação política do ex-juiz.

Lula foi solto após o STF anular os processos judiciais com base em revelações do site "The Intercept" que mostraram por meio de mensagens gravadas pelo aplicativo Telegram que Moro atuava "em parceria" com os procuradores da força-tarefa da Lava Jato, o que caracterizou sua suspeição. Nesta semana, em entrevista ao portal de esquerda Brasil 247, Lula disse que quando procuradores da República que o visitavam na prisão lhe perguntavam se estava tudo bem, o atual presidente respondia que só ficaria bem quando ele pudesse f... Moro. A revelação foi feita um dia antes de a PF deflagrar a operação que desarticulou plano do PCC que visava atacar Moro e outras autoridades.

transferência

Como ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, Moro atuou na transferência de chefes do PCC, entre eles Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, para o sistema penitenciário federal. O principal chefe do PCC foi transferido do sistema penitenciário estadual de São Paulo para a penitenciária federal em Brasília em fevereiro de 2019. Meses depois, seguiu para uma unidade federal em Rondônia e depois retornou para a capital federal.

Além dele, outros 21 integrantes da cúpula da facção foram transportados naquele momento em um avião das Forças Armadas a partir do aeroporto da vizinha Presidente Prudente (SP) para a transferência.

Os ataques contra Moro e outras autoridades, segundo a apuração da PF, ocorreriam de forma simultânea, e os principais alvos estavam em São Paulo e no Paraná. Em São Paulo, o alvo era o promotor Lincoln Gakiya, que atua há anos em investigações sobre a atuação do PCC.

EM ANÁLISE

Porém, os motivos que levariam Moro a entrar na lista do PCC ainda são alvo de análise por parte de integrantes das forças de segurança de São Paulo. Isso porque, até o final de 2022, o nome do ex-juiz e senador pela União Brasil não constava de lista dos serviços de inteligência paulista sobre os "decretados". Isso enfraquece a tese de que ele poderia ter entrado na mira da facção criminosa por ter participado da transferência de presos ao sistema federal em 2019.

DEFESA DE DELTAN

O deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), ex-procurador chefe da Lava Jato, saiu em defesa de Moro e disse que Lula "ataca a credibilidade" de próprio ministro da Justiça, além da dos presidentes da Câmara e do Senado, da Polícia Federal, do Ministério Público Federal, do Ministério Público de São Paulo e da Justiça, "como se fossem farsantes e mentirosos, em mais uma teoria da conspiração lulesca que nega a realidade". Deltan disse que o petista age "de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo, o que configura crime de responsabilidade".

"Lula está defendendo o PCC, como 'vítima de uma armação', contra os agentes da lei. Está negando o vínculo criminoso dos 9 presos, o imóvel alugado para monitorar a família, o mapeamento dos deslocamentos, o dinheiro e carros apreendidos e mais, como negava as provas da Lava Jato", afirmou.