RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O governador interino do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PSC), escolheu nesta quarta-feira (6) o promotor Luciano Mattos como o novo chefe do Ministério Público estadual.

O futuro procurador-geral de Justiça foi o mais votado na eleição interna da categoria. Castro manteve, assim, a tradição de optar pelo vencedor da disputa entre os membros do Ministério Público do Rio de Janeiro. Mattos assumirá o cargo no próximo dia 15.

Ele será o responsável por atuar no processo aberto após a denúncia contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio decorrente do caso das “rachadinhas”. O filho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) é acusado de peculato, lavagem de dinheiro, apropriação indébita e organização criminosa.

O futuro procurador-geral de Justiça também tem a atribuição de conduzir a investigação contra Flávio sobre suposta lavagem de dinheiro por meio de uma loja de chocolates. O suposto crime não foi incluído na denúncia enviada no ano passado ao Tribunal de Justiça do Rio.

Mattos não era o preferido da família presidencial e sofria, inicialmente, resistência de alguns dos interlocutores do senador por ter um histórico de atuação na Tutela Coletiva, área de parte dos membros do Gaecc, grupo responsável pelas investigações contra Flávio. A vinculação funcional era vista com maus olhos pelo grupo do filho do presidente.

O futuro procurador-geral de Justiça conseguiu contornar as resistências por meio dos contatos políticos construídos nos seis anos em que comandou a Amperj, associação dos membros do MP-RJ. Castro foi aconselhado por aliados a evitar uma crise, manter a tradição de optar pelo mais votado, e escolher Mattos, que tem um perfil de diálogo com o mundo político.

A interlocutores, Flávio afirmou que não iria atuar para vetar a escolha de Luciano pelo governador interino.

A escolha foi anunciada por Castro em sua conta nas redes sociais. "Tenho certeza que o novo procurador-geral assumirá o compromisso de bem servir e defender os interesses da sociedade fluminense. Desejo sucesso na missão e confio que ele reúne todas condições de fazer um excelente trabalho à frente do Ministério Público estadual", afirmou o governador.

A escolha de Mattos ocorre dias após procuradores do Ministério Público do Rio debaterem uma reação a uma declaração de Bolsonaro.

Em uma transmissão em rede social no último dia 31, o presidente da República questionou a imparcialidade do MP-RJ ao falar sobre as investigações da "rachadinha".

Dirigindo-se à Promotoria, Bolsonaro mencionou a hipótese de o filho de uma autoridade do Ministério Público ser acusado de tráfico. E questionou: “O que aconteceria, MP do Rio de Janeiro? Vocês aprofundariam a investigação ou mandariam o filho dessa autoridade para fora do Brasil e procurariam maneira de arquivar esse inquérito?”.

“Caso hipotético, vamos deixar claro”, continuou o presidente. “Caso um filho de uma autoridade entrasse num inquérito da Polícia Civil do Rio e aí um delator tivesse falado que ele participava de tráfico internacional de drogas. O que aconteceria?"

Em um grupo de WhatsApp, procuradores cobraram uma manifestação do procurador-geral de Justiça do estado, José Eduardo Gussem, cogitando interpelar o presidente.

Nas conversas, que invadiram o último fim de semana, os integrantes do Ministério Público divergiram sobre a proposta de convocação do Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça para analisar a pertinência da interpelação. Gussem foi um dos que discordaram da ideia.

O Ministério Público do Rio de Janeiro afirmou que “a fala do presidente da República (31/12) não altera em nada as investigações em curso”.

A indicação de Mattos também acontece após dias de articulações políticas provocadas pela importância que o cargo ganhou em razão das investigações contra a família do presidente conduzidas pelo órgão —o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) também é alvo de apuração no Ministério Público fluminense.

O órgão também conduz a apuração sobre o mandante do homicídio contra a vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes, assassinados em março de 2018.

O candidato preferido da família presidencial, o procurador Marcelo Rocha Monteiro, não conseguiu votos suficientes para entrar na lista tríplice enviada ao governador.

Alguns aliados de Flávio passaram a apoiar o nome da procuradora Leila Costa, segunda mais votada, que passou a se articular no Judiciário fluminense em busca de apoio. O movimento ocorreu mesmo ela tendo se comprometido, durante a campanha interna, em apoiar o mais votado.

Mattos venceu a disputa interna com 546 votos, seguido de Leila Costa (501) e do promotor Virgílio Stavridis (427), que formaram a lista tríplice.

Rocha Monteiro teve 143 votos, seguido do procurador Ertulei Laureano, com 93. Votaram 904 dos 907 membros do MP-RJ aptos no pleito, que podiam marcar até três nomes cada.

Castro não havia se comprometido a escolher o mais votado. Ele chegou a ameaçar abrir uma brecha para a escolha de Rocha Monteiro caso algum dos nomes da lista tríplice recusasse a nomeação.

“Se alguém renunciar, pode ser que algum deles [os dois últimos] entre na lista. [...] A legislação é clara. Eu preciso receber uma lista tríplice”, disse Castro, em entrevista à rádio CBN no mês passado.

Mattos integra o Ministério Público fluminense há 25 anos e está lotado na Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa do Meio Ambiente do Núcleo Niterói.

O cargo de procurador-geral ganhou mais importância para as investigações sobre Flávio após o Tribunal de Justiça definir que o senador tem direito ao foro especial. Neste caso, é o próprio chefe do MP-RJ quem tem atribuição para conduzir as apurações e oferecer eventual denúncia contra o senador.

O MP-RJ também defende junto ao STF a revogação da decisão do tribunal, tese que poderá ser reavaliada pelo novo procurador-geral de Justiça.

Carlos, por sua vez, perdeu foro especial após o STF (Supremo Tribunal Federal) considerar suspenso o dispositivo que previa este benefício a vereadores do Rio de Janeiro. O chefe do MP-RJ não tem poder para interferir nas investigações de promotores que atuam na primeira instância. Mas pode desfazer estruturas especializadas criada na atual gestão.

O Gaecc (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção) é o responsável por prestar auxílio aos promotores em investigações consideradas complexas. Ele conta com equipe própria para a realização de diligências.