Isabel Braga
Agência Estado
De Parintins
O presidente Fernando Henrique Cardoso descartou ontem o aumento do valor a ser repassado aos Estados em razão das perdas com a Lei Kandir – além dos R$ 3,864 bilhões acertados com os governadores – e a possibilidade de alterações na Lei de Responsabilidade Fiscal, que está sendo apreciada pelo Senado. Depois de participar de solenidade de abertura do ano letivo em Parintins (AM), o presidente defendeu a votação da lei sem alterações porque, segundo ele, é um ‘‘anseio nacional’’ e o Brasil precisa dela ‘‘com urgência’’.
‘‘Qualquer modificação a gente faz depois, vendo a experiência’’, argumentou. Ao ser indagado sobre a ameaça de boicote à votação da lei feita pelos governadores, Fernando Henrique afirmou: ‘‘Duvido que o Senado deixe de corresponder ao que o Brasil deseja.’’
O pleito por mudanças na lei e por aumento no valor do repasse da Lei Kandir foi feito por governadores que se reuniram em Curitiba, na última sexta-feira. O presidente salientou ainda que a lei está tramitando no Congresso há mais de um ano e questionou o pedido de alterações nesse momento.
‘‘Isso poderia ter sido visto antes; por que agora?’’, comentou. ‘‘Temos de ver a situação do Brasil, estamos caminhando tão bem, nós temos tanta possibilidade de deixar para trás esses momentos de aperto, de desorganização’’, apelou, acrescentando: ‘‘Não podemos interromper uma lei que levou um ano na Câmara’’.
Fernando Henrique disse que, até ontem, não havia recebido qualquer pedido formal de audiência dos governadores que hoje estarão em Brasília, mas que irá dizer a eles não aceitar mudanças na lei. ‘‘O Brasil precisa de um sinal firme, como tem tido o Congresso, de que a era do descontrole já passou’’, ponderou. Para o presidente, a determinação em não modificar a lei não o impede de entender que os governadores têm problemas e, por isso, ele afirma que tem tentado os ajudar sempre que possível.
Citando o governador do Paraná, Jaime Lerner (PFL), o presidente afirmou que tem colaborado nas dificuldades que ele enfrenta com a previdência dos servidores públicos. ‘‘Isso foi imprevidência, não dele, mas dos que o antecederam e eu sei que os governadores atuais não têm responsabilidade’’, comentou. ‘‘Mas o que eu vou fazer? Eu também passo o tempo todo tratando de resolver questões que herdei de outros’’.
Para o presidente, ‘‘ficaria até mal’’ se, depois de pedir publicamente o empenho do Congresso para a aprovação da lei, ele pleiteasse mudanças aos senadores. ‘‘Depois do que a Câmara fez, uma beleza, uma votação maciça, hoje, não há nem oposição nessa matéria’’, disse. ‘‘É todo mundo junto vendo que o Brasil precisa botar ordem nas finanças, disciplinar o gasto público, punir em todos os níveis’’, acrescentou.
Ao dizer que não ‘‘vê possibilidade’’ de aumentar o repasse das perdas com a Lei Kandir para este ano, Fernando Henrique lembrou que o Congresso está votando o Orçamento da União e que ele ‘‘tem um limite’’. O presidente destacou ainda que o governo federal fez um acordo com os governadores que prevê o pagamento das perdas de R$ 10,1 bilhão, em três parcelas até 2001. ‘‘Nós já tínhamos estabelecido uma regra e as regras são para serem mantidas’’, avisou.
Segundo ele, o governo irá ajudar os governadores de outras formas, como no apoio a programas de incentivo ao turismo (Prodetur) e outras demandas específicas. ‘‘Claro que eu entendo a situação de cada governador, mas eu também tenho a minha (situação)’’, queixou-se o presidente. ‘‘Tenho limitações’’, insistiu, acrescentando: ‘‘Eu sei que é difícil, nós temos de lutar muito, e darei quando puder as mãos aos governadores’’.
Em Curitiba, Jaime Lerner não quis comentar ontem as declarações do presidente. A sua assessoria confirmou, entretanto, a presença do governador na caravana que tem audiência com congressistas hoje, às 16 horas, em Brasília. Anfitrião da conferência que deliberou pela pauta de reivindicações, Lerner aguardava ontem contato do governador do Ceará, Tasso Jereissati (PSDB), para saber se haverá ou não encontro com o presidente hoje. Nos bastidores, corria a versão de que o governador ficou chateado com o pronunciamento de Fernando Henrique, principalmente porque Lerner considera a revisão da Lei Kandir e da Lei de Responsabilidade Fiscal causa justa. (Colaborou Leandro Donatti)