A escalada da radicalização política se intensificou no comércio da região de Londrina neste final de semana, quando uma lista de supostos apoiadores do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi compartilhada por bolsonaristas em grupos de mensagens do WhatsApp e pelas redes sociais. O objetivo é boicotar os “petistas”, de acordo com a postagem. Na cidade vizinha de Cambé, também houve compartilhamento de uma “lista atualizada” nesta segunda-feira (7), seguida da convocação: “Vamos boicotar. Saiam desse pessoal.” As associações comerciais de Londrina e Cambé repudiaram o movimento, que pode até ser configurado como criminoso, segundo juristas.

Um empresário ouvido pela FOLHA confirmou que recebeu a lista e viu o nome do estabelecimento dele entre os alvos dos bolsonaristas insatisfeitos com a derrota nas urnas da candidatura à reeleição do atual presidente. “É triste, pois é importante um ajudar o outro para fortalecimento do comércio. A gente fica muito chateado até porque a cidade teve cerca de 70% de votos no Bolsonaro. Então, acho impossível não ter nenhum reflexo. De alguma forma, nós vamos sentir”, lamentou o empresário que pediu para não ser identificado. O responsável por compartilhar a mensagem em um grupo foi identificado, e o advogado do estabelecimento, acionado pelo proprietário para analisar as consequências jurídicas. “O advogado já sinalizou que pode ser enquadrado como crime e como existem vários casos semelhantes pelo País, estamos procurando qual o caminho”, adiantou.

Especialistas no meio jurídico apontam que os casos podem ser enquadrados no crime de difamação (art. 139 do Código Penal) com agravante de 1/3 da pena se cometido em grupos de WhatsApp por conta da facilidade de distribuição do conteúdo. A divulgação sem autorização dos citados pode ser enquadrada em difamação, pois mesmo se for verídica, afeta a honra ou atividade econômica da vítima neste contexto de polarização.

Procurada pela reportagem, a Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina) rechaçou o boicote de comerciantes e prestadores de serviços por motivos políticos e ressaltou o respeito às liberdades individuais e defesa dos direitos constitucionais dos cidadãos e associados. “Neste momento importante para o país, em que as opiniões são manifestadas das mais diferentes formas, a Acil reitera sua defesa pela liberdade de expressão, respeitando a individualidade dos cidadãos e associados. A Associação não apoia qualquer tipo de boicote difundido pelas redes sociais contra empresas. Como entidade do setor produtivo de um país democrático, somos defensores dos direitos constitucionais”, respondeu a entidade em nota enviada à FOLHA.

GREVE GERAL

Manifestantes bolsonaristas ainda convocaram uma greve geral para esta segunda-feira (7) com o fechamento do comércio para pressionar a mudança no resultado das eleições democráticas, mas não houve adesão ao movimento na região de Londrina.

O presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) no Norte do Paraná, Henrico César Tamiozzo, afirmou que não tinha conhecimento da lista de boicote bolsonarista, que tem no setor um dos alvos. “Fiquei surpreso por essa notícia, mas de qualquer forma, a nossa posição continua a mesma. Não temos partido ou estamos apoiando um ou outro lado. Pelo contrário, queremos que o setor seja bem aceito, desburocratizado e que haja flexibilidade nas contratações”, afirmou.

Ele disse ainda que orienta os estabelecimentos a evitarem manifestações de posições políticas por causa de restrições ou boicotes. “Mas, alguns acabam se posicionando e isso fica a critério de cada local, mas logicamente não concordamos com mensagens com esse teor (lista de boicote) e precisamos respeitar a liberdade de cada um.”

CAMBÉ

Em Cambé, a FOLHA teve acesso a uma lista de boicote que foi atualizada na tarde de segunda-feira (7) e publicada nas redes sociais com mais de 20 nomes de empresas de diferentes segmentos. O presidente da Acic (Associação Comercial e Industrial de Cambé), David Garcia, afirmou que a lista dos supostos eleitores de Lula fere o direito constitucional do voto secreto. “E mesmo que tenha ocorrido a manifestação dessas pessoas, elas são livres, democraticamente, para expor sua opinião e, eventualmente, participar de alguma candidatura”, analisou.

Ele também ressaltou que a Acic é apartidária e não toma posição política. “Preservamos a nossa linha de desenvolvimento econômico, associativismo, manifestação livre, pacífica e respeitosa e defendemos o Estado Democrático. Então não há motivo para esse tipo de retaliação a comerciantes, que talvez tenham tido uma posição diferente no último pleito”, afirmou o presidente da entidade, que ainda lembrou que não existem provas da veracidade dos dados divulgados ou identificação dos autores.

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