A empresa maringaense Belcher Farmacêutica do Brasil entrou no foco da CPI da Covid, após a assinatura de uma carta de intenções para a aquisição da vacina Convidecia, desenvolvida pela Cansino em conjunto com um instituto de pesquisa ligado aos militares chineses ao custo de 17 dólares por dose e por possível conexão da empresa com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Se o contrato fosse assinado e cumprido integralmente, resultaria na aquisição de 60 milhões de doses, geraria uma fatura próxima a R$ 5,2 bilhões e seria a mais cara entre todas as vacinas, se comparada às outras adquiridas pelo Programa de Imunização do Ministério da Saúde.

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. | Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

A Belcher Farmacêutica foi alvo da operação "Falso Negativo" e é suspeita de fazer parte de um suposto esquema que superfaturou testes de coronavírus adquiridos pelo governo do Distrito Federal. Um dos sócios da empresa, Emanuel Ramalho Cattori, foi contatado pela reportagem da FOLHA, mas não se manifestou sobre as supostas relações da farmacêutica com Ricardo Barros.

A Cansino Biologics afirma que a Belcher Farmacêutica do Brasil não a representa para a comercialização da vacina Convidecia. O rompimento ocorreu após o Ministério da Saúde ter assinado uma carta de intenção de compra de 60 milhões de doses da vacina, no dia 4 de junho. Por meio de nota, a empresa maringaense confirmou que desde o dia 10 de junho de 2021 não mais representa formalmente no Brasil o laboratório chinês Cansino Biologics, “por questões técnicas de natureza privada entre as empresas”, mas não elucida quais são essas questões. A Belcher disse também que após discussões internas a decisão do rompimento se estabelece em comum acordo e os trâmites administrativos seguem em fase final.

A nota informou ainda que a Belcher Farmacêutica apresentou regularmente à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) do Brasil o pedido de autorização para uso emergencial da vacina Convidecia, produzida pela Cansino Biologics, no dia 18 de maio deste ano. “Tendo em vista que o referido pedido continua em análise técnica, aguardando o cumprimento de diligências e complementação documental, a Belcher Farmacêutica reuniu, em 21 de junho de 2021, com a autoridade sanitária para tratar, conforme consta publicamente no portal da Anvisa, ‘sobre a alteração de contrato entre a empresa Cansino e Belcher e o encaminhamento do processo de uso emergencial da vacina’, com o objetivo de evitar descontinuidade regulatória que pudesse impactar o mais breve e significativo acesso à vacina de dose única por parte do Brasil, que enfrenta fase pandêmica tão crítica.”

O Ministério da Saúde assinou uma carta de intenção com a Belcher para a compra de 60 milhões de doses da vacina, no dia 4 de junho.
O Ministério da Saúde assinou uma carta de intenção com a Belcher para a compra de 60 milhões de doses da vacina, no dia 4 de junho. | Foto: Reprodução/Ministério da Saúde

A Belcher Farmacêutica informou não ter firmado qualquer tipo de contrato com o Ministério da Saúde. “E considerando que não mais representa no Brasil há cerca de 20 dias o laboratório chinês Cansino Biologics, não participará de eventuais novas fases de negociação ou contratualização. Para fins de registro, o Ministério da Saúde apenas emitiu a pedido, em 4 de junho de 2021, uma carta de intenção de compra, que é um requisito da Cansino Biologics para o inicio das negociações”, justificou a empresa de Maringá. “A carta foi enviada sob diversas condicionantes, a exemplo da autorização do imunizante pela Anvisa e da entrega completa das doses no segundo semestre, mediante o interesse público de reforçar o Programa Nacional de Imunizações contra a Covid-19.”

A empresa maringaense disse, por fim, que o documento referido, no entanto, não é vinculativo, não obriga a contratação por parte do poder público, tampouco o fornecimento pelo laboratório chinês. “Por ora, inclusive, sequer tem efeito pleno, tendo em vista que a Belcher Farmacêutica não mais representa comercialmente no Brasil a vacina Convidecia.”

CONEXÕES

Uma das razões que levantaram uma possível conexão do deputado Ricardo Barros com um dos sócios da Belcher Farmacêutica, Daniel Moleirinho Feio Ribeiro, é o fato de que ele é filho de Francisco Feio Ribeiro Filho, que foi presidente da autarquia de urbanização de Maringá, a Urbamar S.A. (Urbanização de Maringá), no período em que Barros foi o prefeito da cidade, entre 1989 e 1992. A assessoria do deputado federal chegou a dizer à FOLHA no domingo (27) que o deputado “apenas conhece os proprietários". Mas a reportagem publicada na última segunda-feira (28) apontou que a família Barros pode ser mais íntima do que a assessoria deu a entender. A FOLHA apurou que o irmão de Ricardo Barros, o também ex-prefeito de Maringá Silvio Barros II, esteve presente na festa de aniversário de Chiquinho Ribeiro, em 2016. E Ribeiro foi conselheiro da Sanepar no governo de Cida Borghetti, quando ela lhe concedeu a comenda Ordem Estadual do Pinheiro. a mais alta honraria do Estado do Paraná.

No domingo (27), o senador Otto Alencar (PSD-BA), integrante da CPI da Pandemia, afirmou que não quer acusar Ricardo Barros de nada, mas disse ser "muita coincidência", se referindo ao fato de que o líder do Governo na Câmara possui ligações próximas com a empresa de Maringá que estava envolvida na compra da vacina chinesa Convidencia.

O QUE DIZ RICARDO BARROS

Ricardo Barros já havia negado anteriormente que teve envolvimento no contrato de aquisição da Covaxin após apontamentos feitos pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) na sexta-feira à CPI da Covid. Em nota enviada à imprensa na noite de domingo (27), o líder do Governo na Câmara também comentou a respeito da nomeação da servidora Regina Célia Silva Oliveira, que deverá ser convocada para depor à CPI. Além de também ser convocado para depor nos próximos dias, uma vez que disse estar à disposição para prestar esclarecimentos diversas vezes, Barros poderá entrar na mira de uma representação no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados por conta do que Miranda disse sobre o deputado na CPI.