Em derrota para Lava Jato, STF decide que Justiça Eleitoral pode julgar crime comum
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quinta-feira, 14 de março de 2019
Reynaldo Turollo Jr.<br>Folhapress
Brasília - Com uma virada no placar, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta (14), por 6 votos a 5, que crimes como corrupção e lavagem de dinheiro, quando investigados junto com caixa dois, devem ser processados na Justiça Eleitoral, e não na Federal, como queria a Procuradoria-Geral da República e os membros da Lava Jato.
A procuradora-geral, Raquel Dodge, e procuradores da força-tarefa em Curitiba afirmam que a Justiça Eleitoral não é estruturada para julgar crimes complexos e que nela pode haver impunidade. Dodge também sustentou que a Constituição determina que crimes contra o patrimônio da União sejam processados na Justiça Federal.
A maioria do Supremo entendeu diferentemente, impondo uma derrota ao Ministério Público. Para seis ministros, o Código Eleitoral é claro ao definir que cabe aos juízes eleitorais processar os crimes eleitorais e também os crimes comuns - como corrupção - que lhes forem conexos.
Votaram desse modo os ministros Marco Aurélio, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente da corte, Dias Toffoli. Coube a Toffoli desempatar o julgamento.
Do outro lado, atenderam ao pleito da PGR os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
O placar final no plenário consolidou o que a Segunda Turma do STF, responsável pela Lava Jato, já vinha fazendo: investigações sobre políticos suspeitos de caixa dois e, ao mesmo tempo, de corrupção devem ser remetidas para os tribunais eleitorais. Assim, um político que recebeu propina desviada de obras públicas e usou parte do dinheiro na campanha será processado na Justiça Eleitoral.
Essa vem sendo, segundo a maioria dos ministros, a jurisprudência da corte nos últimos 30 anos. "Sempre o tribunal assim decidiu, nunca houve uma variação [na jurisprudência]. É mentirosa a afirmação de que a Segunda Turma criou essa questão", disse Gilmar.
Um inquérito sobre o ex-presidente Michel Temer (MDB) e os ex-ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco, por exemplo, foi enviado à Justiça Eleitoral de São Paulo. Eles são suspeitos de negociar, em um jantar no Palácio do Jaburu, R$ 10 milhões de doação ilegal da Odebrecht para campanhas do MDB e R$ 4 milhões de propina de obras no aeroporto do Galeão, no Rio - o que as defesas negam.
DIVISÃO
A PGR queria que investigações como essa fossem divididas, para que o caixa dois (dinheiro não declarado para campanha) fosse julgado na Justiça Eleitoral e a corrupção (propina em contratos públicos), na Justiça Federal.
O ministro Barroso, que compôs o grupo vencido, disse que as varas criminais federais têm se especializado em corrupção e lavagem de dinheiro e têm mostrado resultados - como os da Lava Jato. Para ele, o Supremo não deveria mexer no que vem dando certo.
"A lógica [das investigações] é que parte do dinheiro vai para o bolso e parte para a campanha, via caixa um ou via caixa dois. O problema não é para onde o dinheiro vai. O problema é de onde o dinheiro vem. O dinheiro vem de uma cultura de achaque e de propina que se disseminou pelo País", disse Barroso, para quem a Justiça Federal estaria mais capacitada para punir.
Fux também salientou que a Justiça Eleitoral, em geral, lida com crimes de menor complexidade. "Coagir o eleitor, transportar o eleitor no dia da eleição não têm nenhuma relação com esses megadelitos que estão sendo apurados", afirmou.
Mesmo que uma investigação seja remetida para um tribunal eleitoral, o juiz eleitoral pode, após analisá-la, entender que a atribuição deveria ser da Justiça Federal. Então, na linguagem jurídica, ele declina da competência em favor da Justiça Federal.
Nas últimas semanas, procuradores fizeram uma ofensiva pública contra a remessa de processos à Justiça Eleitoral. Um dos principais nomes da Lava Jato, Deltan Dallagnol disse que essa definição seria catastrófica e poderia levar à anulação de casos já julgados na Justiça Federal.
Nas redes sociais, o procurador Deltan Dallagnol afirmou que a decisão de hoje começa a "fechar a janela de combate à corrupção política que se abriu há cinco anos, no início da Lava Jato".
A procuradora-geral, diferentemente, disse que não vê risco de anulação. "Eu não vejo esse risco neste momento, mas é preciso avaliar tudo isso com muito cuidado e não perder o foco", afirmou Dodge nesta quinta.