A disputa acirrada entre os presidenciáveis Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a divisão dos votos entre a direita e a esquerda também produziram efeitos no Poder Legislativo. As bancadas de ambos os lados cresceram na Câmara: o PL, que tem 76 deputados atualmente, passará a contar com 99 a partir de 2023; já o PT, que elegeu 58 parlamentares em 2018, terá 80 cadeiras na próxima legislatura.

No Paraná, a disputa foi amplamente favorável ao governador reeleito Ratinho Júnior (PSD), apoiador de Bolsonaro. O PSD terá 15 das 54 cadeiras na Assembleia Legislativa do Paraná (AL) e teve o deputado estadual mais votado, Alexandre Curi, com mais de 237 mil votos. Quatro foram eleitos pela primeira vez: a ex-secretária de Saúde de Curitiba Márcia Huçulak, Gugu Bueno, Adão Litro e Cloara Pinheiro.

Na disputa por uma vaga na Câmara dos Deputados, o PSD do Paraná teve o deputado mais votado do partido em todo o país, Beto Preto, ex-secretário estadual da Saúde, que recebeu 206.885 votos. A bancada será a maior do estado na Câmara, com sete parlamentares. Paulo Litro, que atualmente é deputado estadual, terá seu primeiro mandato.

A oposição no Paraná também comemorou as eleições legislativas. A bancada do PT na AL cresceu de cinco para sete deputados. Os quatro que disputaram a reeleição foram novamente eleitos (Tadeu Veneri foi eleito deputado federal). Os novos nomes serão Renato Freitas, Ana Júlia e Dr. Antenor.

A bancada na Câmara também cresceu. De três deputados do PT na atual legislatura, passará a ter seis dos partidos que integram a Federação Brasil Esperança (PT, PCdoB e PV). Gleisi Hoffmann, Zeca Dirceu e Enio Verri, os três do PT, se reelegeram. A eles se somarão o deputado estadual Tadeu Veneri, Carol Dartora (PT) e Aliel Machado (PV).

O PT do Paraná comemorou a eleição de Renato Freitas, vereador que teve o mandato cassado em Curitiba após participar de uma manifestação em uma igreja na capital. A cassação acabou revertida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Roberto Barroso, o que devolveu os direitos políticos a Freitas. Além disso, o partido elegeu a primeira mulher negra deputada federal pelo Paraná, Carol Dartora, que também é vereadora em Curitiba.

A Folha ouviu duas das eleitas pela primeira vez para saber mais sobre suas trajetórias e suas propostas para o Poder Legislativo: Márcia Huçulak e Carol Dartora. Leia o perfil nestas páginas.

Ana Júlia Ribeiro (PT), de 22 anos, é a deputada mais jovem da história a ocupar uma vaga na AL (Assembleia Legislativa), e Carol Dartora (PT), 39, é a primeira parlamentar negra eleita pelo Paraná para o Congresso Nacional. Elas estão entre os quatro vereadores da Câmara Municipal de Curitiba que conquistaram os novos cargos de um total de 17 que disputaram as eleições pela capital paranaense.

CONCRETIZAÇÃO DE UM PROJETO

Eleita com 130.654 votos, Carol Dartora (PT), 39 anos, irá assumir uma vaga no Congresso Nacional como a primeira deputada federal negra a representar o Paraná e com a mesma energia que a moveu ao longo da vida. Ela e a colega de partido Ana Júlia, deputada estadual mais jovem da história a ocupar uma vaga na Assembleia Legislativa, estão entre os quatro vereadores da Câmara Municipal de Curitiba que conquistaram os novos cargos de um total de 17 que disputaram as eleições pela capital paranaense.

“A gente trabalhou muito para construir essa cadeira federal. Sou uma mulher do Partido dos Trabalhadores, feminista, uma militante do movimento negro, sindicalista, professora. Sofremos com uma sub-representação política muito grande e essa denúncia vem sendo feita há muito tempo. Então, esse resultado é a concretização de um projeto, é a concretização de uma luta que, inclusive, não se encerra agora. Muitas outras precisam vir”, diz Dartora, para quem a presença delas na política institucional representa uma maior consciência social entre os paranaenses.

.

Imagem ilustrativa da imagem Eleição nos legislativos "contempla" esquerda e direita no Paraná
| Foto: CM/Divulgação

A petista foi a primeira mulher negra eleita vereadora em Curitiba e a terceira candidata mais votada em 2020. Ela conta que os pais são militantes do movimento negro, e que assim como muitas famílias brasileiras, estão na luta há muito tempo.

Para falar sobre o ingresso na política, ela cita o cotidiano de boa parte das mulheres que precisam "fazer política" para viver. “As mulheres fazem política o tempo todo. Somos nós que estamos denunciando a falta de vagas em creches, a falta de atendimento nos postos de saúde, mas nós não estamos na política institucional por conta de inúmeras barreiras”.

Além da própria barreira do voto, que ainda é hegemônico para homens brancos, acima de 45 anos, tem a questão do racismo e machismo. “Isso cria inúmeras dificuldades materiais e subjetivas. A gente precisa formar muito essa consciência crítica, formar esse voto”, destaca Dartora, acrescentando que, por isso, o resultado das urnas no domingo (2) deve ser bastante comemorado. “São votos críticos, de pessoas que pensam a respeito da necessidade de superação do racismo, da superação do machismo, das desigualdades sociais, ainda mais nesse momento em que o Brasil voltou para o mapa da fome e as pessoas estão sem casa e sem trabalho”.

Os anos dedicados em sala de aula como professora, segundo Dartora, foram impulsionados principalmente pelo desejo de atuar na formação do senso crítico, e a opção pelo curso de História está ligado ao fato de ela ter nascido em Curitiba. “É uma cidade conhecida como a capital europeia e eu não tinha um pertencimento com a cidade. Minha vontade foi justamente olhar para a história no sentido de resgatá-la”, comenta.

FEMINIZAÇÃO DA POBREZA

Uma das principais bandeiras erguidas pela deputada federal eleita é a defesa das mulheres. Como vereadora, Carol Dartora criou mais de 30 projetos de lei, entre eles, o que virou a lei que determina tramitação prioritária em processos administrativos para mulheres em situação de violência.

“Foi uma conquista muito importante para a cidade e a gente tem de levar isso agora a nível nacional. Tem uma coisa na nossa sociedade que se chama feminização da pobreza. A pobreza é negra e mulher. Somos nós, as mulheres, que temos os piores salários, os piores empregos, e quando são mulheres negras isso é muito mais agravado. São mulheres negras que estão na base da pirâmide social, que recebem menos que homens e mulheres brancas, que são as mais impactadas pela carga tributária, pela fome, pelo desemprego. Não é mais possível que a gente caminhe sem que essa representação esteja nos parlamentos e em todo lugar, para a gente poder produzir política pública”, afirma.

A lei de cotas raciais para os serviços públicos municipais, também de autoria de Dartora, tem servido de base em Curitiba para pensar a revisão de lei de cotas nacional. “Saber que vou poder participar desse debate é maravilhoso. É uma das primeiras coisas em que quero trabalhar”, diz. (Micaela Orikasa/Reportagem Local)

ATENÇÃO À SAÚDE PÚBLICA

Depois de comandar a área da Saúde na maior cidade do Paraná durante a pandemia do coronavírus, Márcia Huçulak terminou as eleições deste ano como a mulher mais votada em todo o estado. Filiada ao PSD do governador Ratinho Júnior, a ex-secretária de Saúde de Curitiba teve 75.659 votos e deverá dar atenção especial à área da saúde pública em sua atuação na Assembleia Legislativa.

A ex-secretária de Saúde de Curitiba Marcia Huçulak foi a candidata a deputada estadual mais votada no Estado
A ex-secretária de Saúde de Curitiba Marcia Huçulak foi a candidata a deputada estadual mais votada no Estado | Foto: Divulgação

Enfermeira por formação, Márcia enfrentou as mais diversas pressões durante os momentos mais duros da pandemia: de um lado, era cobrada pelos que pediam mais restrições por parte da prefeitura; do outro, era atacada nas redes sociais pelos apoiadores de Bolsonaro contrários às medidas protetivas. Administrou a crise, sobreviveu e evitou que o sistema hospitalar da capital paranaense entrasse em colapso. “Foi um trabalho de conscientização”, resume a deputada eleita. Neste ano, foi convidada pelo governador Ratinho Júnior para se filiar ao PSD.

Descendente de italianos e ucranianos, Márcia tem 60 anos. Ela nasceu em Tangará (SC) e foi para Curitiba aos 4 anos, com a família. Formada em Enfermagem pela Pontifícia Universidade Católica do PR (PUC-PR), fez especialização em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz e mestrado em Planejamento e Financiamento em Saúde na Universidade de Londres, na Inglaterra.

Trabalhou na UTI do Hospital Evangélico, um dos principais de Curitiba, e é servidora municipal em Curitiba há 35 anos. Na prefeitura, coordenou o programa materno-infantil e foi superintendente de Gestão da Secretaria da Saúde e diretora de controle, avaliação e auditoria. Assumiu a Secretaria da Saúde em 2017 e deixou o cargo neste ano. Também exerceu funções na Secretaria Estadual da Saúde: foi superintendente de Atenção à Saúde, superintendente de Gestão de Sistemas e diretora regional.

Na Assembleia, Márcia pretende ajudar a ampliar o uso de tecnologias nos serviços de saúde, reforçar as ações de prevenção, aumentar o volume de recursos para a atenção primária e incentivar o atendimento a distância em Saúde, entre outras pautas. “A minha principal pauta é a saúde em todos os seus aspectos: melhoria do acesso e da prestação de serviços, bom uso de recursos, valorização profissional e condições adequadas e seguras para os profissionais que atuam na saúde”, diz a deputada eleita.

Uma das preocupações é garantir segurança jurídica para que o estado possa ampliar o uso de tecnologias nos serviços de saúde. Ela participou do desenvolvimento do aplicativo Saúde Já, da prefeitura de Curitiba, em 2017. Durante a pandemia, coordenou as adaptações para que o atendimento emergencial de pacientes com suspeita de covid fosse feito pelo aplicativo. “Outro objetivo é reforçar as ações de promoção e prevenção de Saúde, para reduzir casos críticos como AVCs, ataques cardíacos, crises de hipertensão e outros”, afirma.

políticas públicas para os idosos

“Precisamos fortalecer as políticas públicas para promover a qualidade de vida, melhorar estruturas e qualificar equipes durante o envelhecimento e criar uma legislação de amparo para pessoas que deixam a vida profissional para assumir a função de cuidador de um familiar idoso ou com deficiência”.

Márcia Huçulak espera que a proximidade com Ratinho Junior e parceria entre Curitiba e o estado para enfrentar a pandemia rendam bons frutos na Assembleia. “Fui eleita pelo partido do governador. Foi ele quem me convidou a pleitear essa cadeira na Assembleia”, conta. “Tenho grande admiração pelo trabalho do governador, desenvolvemos uma ótima parceria para as ações de enfrentamento da pandemia em Curitiba e no Paraná. Nessa nova fase, poderemos trabalhar ainda mais por projetos”.

Ela também levará para a Assembleia a experiência de ter atuação no Conass (Conselho Nacional dos Secretários de Saúde), em Brasília, quando participou da formulação de políticas e programas nacionais. Um dos resultados foi o projeto que agilizou as transferências de recursos da União para estados e municípios e os repasses por meta atingida para hospitais. (José Marcos Lopes, especial para a FOLHA)

Receba nossas notícias direto no seu celular! Envie também suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link wa.me/message/6WMTNSJARGMLL1.

Assim como as muitas barreiras que Dartora encontrou em 39 anos de vida, ela parte agora para outros novos desafios, especialmente no sentido de produzir política pública para que a porta dos espaços democráticos e de decisão seja aberta para todas as pessoas. “É uma vitória sim, mas ao mesmo tempo a gente continua com muitas dificuldades. Eu sei que uma andorinha sozinha não faz verão. Estou muito feliz que vou me encontrar com outras eleitas, mas ainda somos uma minoria”, conclui.

mockup