Delator diz ter sido agente infiltrado de Moro e procuradores do PR
Ex-deputado Tony Garcia afirma ter sido obrigado a gravar pessoas de forma ilegal a pedido do ex-juiz e procuradores, que negam relatos
PUBLICAÇÃO
segunda-feira, 05 de junho de 2023
Ex-deputado Tony Garcia afirma ter sido obrigado a gravar pessoas de forma ilegal a pedido do ex-juiz e procuradores, que negam relatos
Catarina Scortecci - Folhapress
Curitiba - O empresário de Curitiba e ex-deputado estadual Antônio Celso Garcia, conhecido como Tony Garcia, 70, afirma que foi obrigado a gravar pessoas de forma ilegal a pedido de procuradores e do ex-juiz federal Sergio Moro após firmar acordo de colaboração premiada em 2004. "Eu fui um agente infiltrado deles", disse ele, em entrevista à Folha, na sexta-feira (2). O caso foi revelado pela revista Veja.

As supostas ilegalidades, segundo Garcia, foram reveladas para a juíza federal Gabriela Hardt em 2021. Em novembro de 2022, a magistrada rescindiu o antigo acordo de delação, atendendo a um pedido do MPF (Ministério Público Federal) de 2018. A defesa do empresário ainda recorre da decisão.
Garcia afirma que, embora tenha apontado atuação ilegal das autoridades envolvidas em sua delação, a juíza não tomou providências. Segundo ele, seu relato foi feito durante uma audiência em 2021 e o conteúdo foi enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) somente em abril deste ano, por decisão do juiz Eduardo Appio - afastado do cargo desde 22 de maio sob suspeita de infração disciplinar.
Segundo Garcia, ele prestou depoimento à juíza para detalhar sua atuação como colaborador, "para que ela formasse juízo de valor antes de sentenciar uma barbaridade daquela", isto é, o pedido de rescisão feito pelo MPF. "Nessa audiência, surpreendi até os meus advogados, que não sabiam de nada, e coloquei tudo que eu fui obrigado a fazer. Fui agente infiltrado [de Moro e dos procuradores]", disse ele, em referência aos anos seguintes ao acordo de delação, entre 2005 e 2006.
"Eles [procuradores] me obrigaram a andar com dois telefones deles com microfone aberto. Foi assim que eu gravei o [advogado] Roberto Bertholdo, um monte de gente, para eles. Quando eles pegavam conversas que interessavam, eles levavam ao Moro e ele esquentava as conversas. Fazia como se tivesse autorização judicial, com data retroativa."
Garcia afirma que possui provas para corroborar as declarações e que pretende mostrá-las ao STF.
Hoje senador pela União Brasil, Moro disse em nota que o empresário faz um "relato mentiroso e dissociado de qualquer amparo na realidade ou em qualquer prova".
A reportagem procurou Gabriela Hardt na sexta, por meio da assessoria de imprensa da Justiça Federal, mas não teve retorno.
Garcia afirma que passava frequentemente números de telefones para agentes da Polícia Federal de Brasília hospedados em Curitiba.
"Um agente tinha um Guardião, [sistema] que grava vários telefones ao mesmo tempo. Quase todo dia, a gente se encontrava às 6 horas da tarde em frente ao shopping Mueller. Eu pegava ele, ele entrava no meu carro, e eu passava números de telefone para ele grampear", narrou.
INTERESSE ESPECIAL
Segundo o empresário, Moro e os procuradores tinham interesse especial no advogado Roberto Bertholdo, por causa da suposta influência que ele teria junto a desembargadores federais do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
Ex-assessor do MDB em Brasília, Bertholdo é um lobista conhecido e já foi acusado de suposto tráfico de influência e interceptação telefônica ilegal (inclusive de conversas de Moro). Ele também foi suplente de Garcia em uma disputa ao Senado.
Garcia cita o nome de Carlos Fernando dos Santos Lima e de Januário Paludo entre os procuradores da Lava Jato que supostamente o obrigavam a gravar pessoas de forma ilegal.
Carlos Fernando, hoje aposentado, chamou de "palhaçada" as falas do delator. A reportagem ainda não conseguiu contato com Paludo, atualmente lotado na Procuradoria Regional da República da 4ª Região.

