Parlamentares discutem durante votação na Comissão Especial da Reforma Política: principal argumento dos defensores da proposta é que ela é simples de ser entendida e aplicada
Parlamentares discutem durante votação na Comissão Especial da Reforma Política: principal argumento dos defensores da proposta é que ela é simples de ser entendida e aplicada | Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil



Curitiba – A Comissão Especial de Reforma Política da Câmara aprovou na quinta-feira (10) passada o polêmico "distritão", que muda por completo a forma de escolha dos vereadores, deputados estaduais e deputados federais. Para valer já nas próximas eleições, as novas regras precisam passar pelo plenário das duas Casas do Congresso Nacional, em dois turnos, até 7 de outubro. São necessários 308 votos favoráveis, de um total de 513, uma vez que se trata de uma PEC [Proposta de Emenda Constitucional].

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Hoje, o sistema brasileiro é proporcional, isto é, valem os votos recebidos pelo conjunto dos candidatos do partido e também pela legenda. Com a mudança, ele passaria a ser majoritário. No Paraná, por exemplo, que possui 30 cadeiras, seriam eleitos os 30 candidatos mais bem votados, independentemente de ideologia ou sigla. Os votos sobressalentes, contudo, seriam desperdiçados. Os parlamentares pretendem, no mesmo bolo, dobrar o valor previsto de recursos públicos para financiar as campanhas. A ideia é instituir um fundo de 0,5% da receita corrente líquida, o que corresponde a cerca de R$ 3,6 bilhões.

Patrocinado pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), atualmente preso, e pelo presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), o "distritão" chegou a ser rejeitado em 2015. Agora, voltou a ganhar força, sobretudo devido ao apoio de outras legendas governistas e de políticos do chamado baixo claro. Eles tentam "vendê-lo"como uma transição para a adoção do distrital misto, que seria uma mistura dos dois sistemas, em 2022.

O principal argumento dos defensores da proposta é que ela é simples de ser entendida e aplicada. "Sou favorável, primeiro porque acaba com a coligação. Cada partido teria condição de eleger o seu representante. Não teríamos mais a situação de um candidato eleger três ou quatro, como acontece hoje. O Enéas [Carneiro], por exemplo, elegeu deputado federal que nunca tinha ido a São Paulo", relembrou Toninho Wandscheer (Pros-PR), em referência ao emblemático caso. Em 2002, os 1.573.642 votos do então líder do Prona, já falecido, puxaram outros cinco candidatos.

Para Wandscheer, o povo gosta de votar no indivíduo, e não na legenda. "Seria uma forma de valorizar a pessoa. Os eleitores não levam em conta o partido. Acho melhor porque o cidadão vai saber em quem votar, se está envolvido ou não com corrupção...", prosseguiu. "Hoje, no Brasil, qual partido está fortalecido? Não é por causa dessa decisão que vai mudar. O partido se mantém na base, no município. E o candidato vai para o partido onde tem chance de se eleger; não vai pela questão ideológica", opinou.

CLIENTELISMO
Em vigor apenas no Afeganistão, na Jordânia e em alguns pequenos países insulares, entretanto, o "distritão" é fortemente criticado por especialistas. De acordo com o professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Luiz Domingos, de todos os sistemas discutidos, esse seria o pior. "Não é só a minha opinião; é uma opinião consolidada na Ciência Política. Ele vai aprofundar os traços mais viciados da política, que são o personalismo, o clientelismo e a briga intrapartidária, para ver quem pega mais dinheiro do fundo partidário, além de trazer outros", afirmou.

Outra cítica é de que a mudança beneficiaria os candidatos já conhecidos do grande público, em detrimento de representantes de minorias. "Os 30 primeiros [candidatos] são considerados [no caso do Paraná] e o restante dos votos é jogado no lixo. Isso, numa sociedade desigual e heterogênea, acaba privilegiando os grupos mais fortes da população, como empresários, celebridades e chefes ou donos de partidos. Já os grupos minoritários, mulheres, negros, ciclo ativistas, que não têm tanto dinheiro, se não sumirem vão ser muito reduzidos", completou.

Na avaliação de Domingos, nenhum sistema persevera se não existir partido forte. O cientista político também disse que considera estranho e despropositado apresentar tal modelo como uma transição ao sistema alemão [o distrital misto]. "Se surtir o efeito que os políticos estão procurando no momento, que é se proteger, pegar esses R$ 3,6 bilhões para gastar bastante, é provável que repitam em 2022 (…) Eles [deputados] nunca estiveram preocupados com o eleitor."

Segundo o professor da PUCPR, o discurso de que o "distritão" é mais fácil de entender é ainda oportunista. "Esse é um problema histórico da relação dos partidos com os eleitores e da falta de cidadania desde a escola. Não é um problema do eleitor. O sistema pode ser mais inteligível, mas é ruim. É como se numa partida de futebol você tirasse as regras e voltasse a jogar pelada na rua – cinco vira e dez acaba. Nem sempre mais simplicidade é melhor. Num curto prazo, os efeitos vão é afugentar e desagradar a torcida."

Imagem ilustrativa da imagem Defendido por caciques, 'Distritão' é alvo de críticas de especialistas