Imagem ilustrativa da imagem Deepfakes em tempos de eleição: o risco da construção de falsas realidades
| Foto: FOLHA ARTE

Poderiam ser efeitos especiais de superproduções hollywoodianas, mas os vídeos que vêm surgindo na internet e mostram realidades fictícias criadas por computação estão cada dia mais populares. Em um dos mais conhecidos, o ex-presidente Barack Obama aparece chamando o atual mandatário americano, Donald Trump, de “um idiota total e completo”. A nova realidade no universo das notícias falsas se chama “deepfake”: uma expressão cunhada a partir dos termos “deep learning” e “fake” – que livremente traduzido do inglês para o português significam, respectivamente, aprendizagem profunda e falso.

Em termos bem resumidos, consiste em sintetizar imagens e sons a partir de técnicas diversas e de inteligência artificial. A tecnologia tem enorme potencial para o entretenimento, mas, ao mesmo tempo, representa um risco no período eleitoral, como o que será vivido no Brasil neste ano com os pleitos municipais. “Historicamente, já se viu o uso de um registro fora de contexto para ganhos políticos, mas é claro que há expectativa de que a técnica seja utilizada. A cada eleição, novos perigos surgem e as redes sociais têm um papel cada dia mais importante”, avalia o advogado Fernando Peres, especialista em Direito Digital.

A edição de vídeos a partir da lógica da técnica do deepfake não é uma tarefa simples e requer uma boa dose de conhecimento e um equipamento apropriado. Há ainda uma série de questões técnicas que precisam ser notadas para que o vídeo fique o mais próximo da realidade. “Um dos fatores primordiais é ter uma grande variedade de imagens e áudios de alta qualidade da pessoa que deve ser retratada no vídeo. Caso não tenha, é até possível criar um vídeo, mas ficará muito aparente que foi editado”, explica Sylvio Barbon, professor e pesquisador do curso da Ciência da Computação da UEL (Universidade Estadual de Londrina).

Resumidamente, a edição é feita a partir da substituição de um pedaço da imagem por outro, como, por exemplo, o rosto ou a boca, e depois é feita uma espécie de equalização de tons e forma. Apesar da aparente complicação, a elaboração da técnica é considerada de baixo custo, o que pode ser um facilitador para a sua disseminação para a construção de factoides durante as eleições. “Com certeza, o orçamento de um processo de candidatura teria a condição de cobrir os custos, mas depende de uma rede de pessoas dispostas a trabalhar com irregularidades”, alerta Barbon.

COMBATE

Apesar da velocidade e qualidade da produção de notícias avançarem, a Justiça vem reagindo com celeridade. Segundo Fernando Peres, o embasamento legal existente oferece segurança ao processo eleitoral. “A verdade é que nossa Justiça Eleitoral tem observado e acompanhado a tecnologia de forma razoável. Acredito que tanto os candidatos como os eleitores como usuários das redes estão sob a abrangência das leis”, opina o advogado.

A Justiça Eleitoral, seja por meio do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e dos TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) nos estados, não atua como órgão fiscalizador. Ao longo do processo da campanha, os órgãos só atuam quando provocados por ações ou pelo Ministério Público. No entanto, os tribunais têm estrutura técnica para análise de conteúdos digitais. “A nossa preocupação ficou ainda mais evidente depois das eleições de 2018. O TSE criou grupos de análise sobre fakenews. Também contamos com a perícia forense da Polícia Federal, além dos técnicos das Forças Armadas e da Abin (Agência Brasileira de Inteligência)”, afirma Gilmar de Deus, secretário de Tecnologia da Informação do TRE do Paraná.

INFORMAÇÃO

Em meio às ameaças das deepfakes e das fakenews, uma força é fundamental para evitar os possíveis estragos e consequências no processo eleitoral: a informação. “A questão é que a própria sociedade precisa aumentar sua capacidade de compreensão sobre os fatos. Até que ponto as pessoas acreditam no que veem?”, questiona Barbon. Na mesma linha, opina o gestor da tecnologia do TER-PR. “Acredito que a tecnologia ficará cada vez mais sofisticada, mas a sociedade precisa estar preparada e isso só se consegue com conhecimento”, conclui Gilmar de Deus.