BRASÍLIA, DF, 27.03.2022 - JAIR-BOLSONARO-DF: O presidente Jair Bolsonaro acompanhado da primeira-dama, Michelle, participa do encontro nacional do Partido Liberal, no Centro Internacional de Convenções do Brasil, em Brasília, neste domingo. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
BRASÍLIA, DF, 27.03.2022 - JAIR-BOLSONARO-DF: O presidente Jair Bolsonaro acompanhado da primeira-dama, Michelle, participa do encontro nacional do Partido Liberal, no Centro Internacional de Convenções do Brasil, em Brasília, neste domingo. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress) | Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Brasília - Em um evento com clima de comício antecipado, o presidente Jair Bolsonaro (PL) disse neste domingo (27) que a eleição de outubro não é luta da esquerda contra a direita, mas "do bem contra o mal", em referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), à frente nas pesquisas de intenção de voto.

"O nosso inimigo não é externo, é interno. Não é luta da esquerda contra a direita, é do bem contra o mal. E nós vamos vencer essa luta, porque estarei sempre na frente de vocês", disse Bolsonaro durante evento do PL.

O chefe do Executivo fez um discurso com roupagem de candidato à reeleição, ainda que isso não tenha sido mencionado.

"Se é para defender a democracia, a liberdade, eu tomarei a decisão contra quem quer que seja. E a certeza do sucesso é que eu tenho o exército ao meu lado. Este exército é composto de cada um de vocês", disse.

Em outro momento, Bolsonaro afirmou que, às vezes, "embrulha o estômago ter que jogar dentro das quatro linhas [da Constituição]", mas que o faz.

"Por vezes, me embrulha o estômago ter que jogar dentro das quatro linhas [da Constituição], mas eu joguei e não foi da boca para fora. E aqueles que estão do meu lado, todos, em especial os 23 ministros, eu digo isso, vocês têm a obrigação de, juntamente comigo, fazer com que quem esteja fora das quatro linhas seja obrigado a voltar para dentro."

Esta não é a primeira vez que ele fala sobre quem atua fora da Constituição. Costuma usar a expressão como referência velada a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).

O evento contou com a presença de parlamentares, ministros e apoiadores do presidente.

A legislação eleitoral só permite campanha a partir de 16 de agosto. Comícios não são autorizados até lá. Eventos públicos de lançamento de pré-candidatura, situação não prevista na lei, também são vetados.

Em meio à crise que envolve a atuação de pastores na liberação de verbas do MEC (Ministério da Educação), Bolsonaro não fez menções diretas ao ministro Milton Ribeiro, alvo de investigação, mas afirmou que "buscam qualquer gota d'água para transformar num tsunami".

"Todos nós somos humanos. Podemos errar. Quem nunca errou que está na plataforma neste momento?", disse no palanque.

Quando o chefe do Executivo discursou, tinha o general Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) ao seu lado. Militar e bolsonarista de primeira hora, o general foi amplamente utilizado na campanha de 2018.

"Eu sou chefe da segurança institucional, a segurança institucional que já foi ofendida, já foi jogada pela janela várias vezes. Estou quieto. Vamos aguardar o fim deste filme, que eu tenho certeza que, graças a vocês, será glorioso", disse Heleno, sem citar diretamente as eleições.

Pesquisa Datafolha divulgada nesta semana mostrou que Bolsonaro recuperou fôlego na corrida pelo Planalto, mas continua atrás de Lula. O levantamento mostra que o mandatário tem 26% de intenções de voto, contra 43% do petista.

"Vocês já ouviram no passado, ouvem ainda, dizer que uma mentira repetida mil vezes transforma-se numa verdade. Vou dizer para vocês agora, uma pesquisa mentirosa publicada mil vezes não fará um presidente da República", afirmou. Em seguida, foi exaltado pela plateia, que gritava "mito".

Todos os discursos desta manhã tiveram como tônica a crítica mais ou menos velada aos governos petistas. Em gesto aos jovens, preocupação das campanhas neste ano, Bolsonaro pediu que suas famílias contassem como era a vida delas antes.

"Não podemos esquecer o nosso passado, porque aquele que esquece seu passado está condenado a não ter futuro. Os mais jovens podem não conhecê-lo, os seus pais e avós têm a obrigação de mostrar para eles para onde o Brasil estava indo, bem como vivem os jovens em outros países, como por exemplo a Venezuela."

Como costuma fazer em outros discursos, Bolsonaro começou a contar sua trajetória desde 2014. Ao falar daquele ano, disse que o país elegeu uma pessoa "que não tinha qualquer carisma, que a gente não consegue entender como teve dentro do TSE tanto voto".

Ele se referia à ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que sofreu um processo de impeachment em 2016. O PSDB, que perdeu no segundo turno para ela, pediu auditoria das urnas eletrônicas, questionando a vitória da petista.

O resultado da auditoria tucana saiu em 2015, concluindo que não houve fraude no processo.

Bolsonaro relembrou ainda o que declarou durante a votação na Câmara para destituir Dilma. Na ocasião, ele, então deputado, exaltou o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos principais símbolos da repressão durante a ditadura militar, chamando-o de um "velho amigo" que "lutou pela democracia".

O presidente também reformulou a frase que será tema de sua campanha: em vez do versículo bíblico "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará", repetido por ele desde 2018, Bolsonaro adotou o "nada temais, nem mesmo a morte, a não ser a morte eterna".

O discurso de Bolsonaro e dos seus ministros também foi direcionado, principalmente, para nordestinos, mulheres e jovens, camadas que têm maior rejeição ao presidente.

Inclusive, no começo de sua fala, o presidente passou o microfone para a ministra Tereza Cristina (Agricultura) e para a primeira-dama, Michelle. Esta última, como a Folha mostrou, deve aparecer mais durante a campanha neste ano, após aliados do presidente identificarem que ela pode ajudar a reverter a rejeição dele junto às mulheres. ​

A primeira-dama, que não costuma discursar, falou rapidamente. "Sei que, assim como Ele [Deus] foi fiel em 2019, será em 2022."

Cotado a vice na chapa do presidente, o ministro da Defesa, Braga Netto, não participou do evento.

Filiaram-se à legenda neste domingo os ministros Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e João Roma (Cidadania), além do senador Eduardo Gomes (TO).

Antes de o presidente discursar, falaram os ministros Roma, Tarcísio de Freitas (Infraestrutura) e Tereza Cristina (Agricultura). Respectivamente, eles devem se candidatar aos governos da Bahia, de São Paulo e ao Senado pelo Mato Grosso do Sul.

Os três fizeram falas em contraponto aos governos petistas. Tarcísio disse que Bolsonaro está construindo um caminho "sem corrupção" e "que levou água para o nordeste, libertou as pessoas do carro-pipa".

Roma, por sua vez, mencionou programas de distribuição de renda e disse que o governo Bolsonaro não usurpa direitos e liberdades.

No fundo do palco, uma foto do presidente entre apoiadores com os dizeres: "Capitão do povo".

Se há quatro anos Bolsonaro fez campanha com menos recursos, o evento desta tarde serviu para mostrar que, em 2022, ele contará com outra realidade.

O ato desta manhã foi organizado e teve estrutura diferente do passado. O evento começou às 10h deste domingo em Brasília. A expectativa dos apoiadores era de que chegasse a 5.000 convidados, mas o salão tinha locais esvaziados. O apresentador era Cuiabano Lima, locutor de rodeio.

Apesar da reformulação do evento deste domingo pela campanha, para tentar se adequar às regras eleitorais, Bolsonaro disse no sábado (26) se tratar de lançamento de sua pré-candidatura.

"Amanhã está previsto às 10h. Aí não sei, deve ter muita gente lá, muita gente está se inscrevendo. Não precisa se inscrever. Se tiver espaço, vai entrar mesmo quem [não] está inscrito. É o lançamento da pré-candidatura", afirmou.

Como a Folha de S.Paulo mostrou, a campanha do chefe do Executivo teve de mudar o anúncio do evento, que inicialmente seria o lançamento da pré-candidatura, após o sinal vermelho da equipe jurídica.

Os organizadores alteraram o material de divulgação e passaram a chamar o evento de "Movimento Filia Brasil".

No mesmo fim de semana, o ministro Raul Araújo, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), enquadrou como propaganda eleitoral manifestações políticas das cantoras Pabllo Vittar e Marina no festival Lollapalooza, as duas simpáticas a Lula e avessas a Bolsonaro.

Araújo estipulou uma multa de R$ 50 mil para a organização caso outros artistas falem qualquer coisa, a favor ou contra, sobre qualquer candidato ou partido político.

Na sexta (25), Pabllo exibiu uma bandeira vermelha com o rosto do ex-presidente petista. Já a galesa Marina, uma atração internacional, xingou Bolsonaro e o russo Vladimir Putin.

Outros ministros também estiveram no evento do PL, como Ciro Nogueira (Casa Civil), Flávia Arruda (Secretaria de Governo), Onyx (Trabalho), Bento Albuquerque (Minas e Energia), Fábio Faria (Comunicações), Anderson Torres (Justiça), Gilson Machado (Turismo), Marcelo Queiroga (Saúde) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional).

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, envolvido em um escândalo sobre a atuação de pastores na liberação de verbas da pasta, não esteve no evento. Um inquérito da Procuradoria-Geral da República apura suspeitas de corrupção passiva, tráfico de influência, prevaricação e advocacia administrativa.