Washington (EUA) - Replicando a estratégia de grupos de direita latino-americanos radicados nos EUA, bolsonaristas vêm recorrendo a Washington para denunciar uma suposta violação de direitos humanos sofrida no Brasil, alegando perseguição política e censura.

Para especialistas, a articulação busca preparar o terreno para um eventual novo governo Trump e respaldar uma candidatura na eleição de 2026.

O exemplo mais recente desses esforços foi a tentativa de emplacar uma audiência intitulada "Brasil: Uma crise da democracia, da liberdade e do Estado de Direito?" na Comissão de Direitos Humanos do Congresso americano.

O evento, previsto para ocorrer na última terça-feira (12), acabou sendo barrado pela ala democrata do órgão, uma ação inusual dada a existência de um acordo de cavalheiros entre os partidos para não bloquear propostas de audiências um do outro.

A comissão é copresidida por dois deputados, um de cada partido: o democrata Jim McGovern e o republicano Chris Smith, com quem uma comitiva brasileira liderada pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) se encontrou em novembro do ano passado. Eduardo também se encontrou com o ex-presidente americano Donald Trump nesta quarta-feira (13) em seu resort em Mar-a-Lago, na Flórida.

À reportagem McGovern diz que não vê o debate como uma questão de direitos humanos. "Parece que foi desenhada para dar a ele [Eduardo Bolsonaro] cobertura e legitimidade, e esse não é o propósito da nossa comissão", afirmou.

Em resposta ao bloqueio, Smith promoveu uma conferência do lado de fora do Capitólio no mesmo dia em que aconteceria a audiência.

Em seu discurso, disse que "o Brasil está indo na direção da anarquia e do Estado pelo direito - em que o direito é usado seletivamente como um instrumento de poder político para processar pessoas como forma de silenciar a oposição".

O deputado americano, que preside também a subcomissão de Saúde Global, Direitos Humanos Globais e Organizações Internacionais, prometeu realizar uma nova audiência sobre direitos humanos no Brasil e disse estar preparando um projeto de lei para "responsabilizar o governo brasileiro por seus abusos".

Participaram da conferência os deputados Eduardo Bolsonaro, Gustavo Gayer (PL-GO) e Marcel Van Hattem (Novo-RS) e o ex-apresentador da Jovem Pan Paulo Figueiredo, neto do ex-presidente João Batista Figueiredo (ditadura militar) e acusado pela Polícia Federal de ajudar integrantes do governo Bolsonaro a planejarem um golpe no Brasil em 2022.

Um analista da Heritage Foundation, um think tank conservador americano, completou o quadro.

A deputada Bia Kicis (PL-DF) e Allan dos Santos, fundador do site bolsonarista Terça Livre, acompanharam o grupo, mas não discursaram.

"Sempre alertei em meus discursos no Congresso [do Brasil] sobre os perigos de meu país se tornar uma Cuba ou Venezuela, com seus campos de concentração", disse Eduardo Bolsonaro.

"Hoje, infelizmente, vivo em meu próprio filme sobre o gulag. Meu pai agora é perseguido e difamado das mais variadas formas, e como em qualquer tirania, o limite do ridículo não existe mais."

O filho do ex-presidente esteve em Washington no fim de fevereiro para participar da conferência conservadora CPAC.

No discurso, ele se dirigiu diretamente aos congressistas americanos, pedindo a realização de uma audiência para "expor essa tirania", em referência a uma suposta perseguição sofrida pelo governo Lula (PT) e pelo Judiciário brasileiro.

Apesar do bloqueio democrata, Figueiredo diz à reportagem que a audiência vai acontecer e vê na ação do partido de Joe Biden mais uma prova da suposta perseguição da esquerda, acusando McGovern de ter laços com Cuba, as Farc e o bilionário George Soros.

No mês passado, ele e Eduardo foram entrevistados pelo ex-âncora da Fox News Tucker Carlson, um aliado de Donald Trump.

Na descrição do episódio, o jornalista americano diz que o "governo Biden ajudou a instalar um governo pró-China no Brasil, que imediatamente calou a mídia de oposição e começou a prender dissidentes". "Aqui estão duas das suas vítimas", encerra o texto.

Além da imprensa conservadora e o Congresso americanos, bolsonaristas também têm mirado a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Em novembro, alguns parlamentares brasileiros se encontraram com o relator especial para Liberdade de Expressão, Pedro Vaca Villarreal, e técnicos do secretariado executivo, com o objetivo de denunciar uma suposta perseguição.