Além de Beto, Pepe e Fernanda Richa, Gaeco cumpriu mais nove mandados de prisão; ex-governador e candidato ao Senado ainda é alvo de nova fase da Lava Jato
Além de Beto, Pepe e Fernanda Richa, Gaeco cumpriu mais nove mandados de prisão; ex-governador e candidato ao Senado ainda é alvo de nova fase da Lava Jato | Foto: Arquivo Folha


Curitiba - O dia 11 de setembro de 2018 entrou para a história da política paranaense como a data em que pela primeira vez um ex-governador do Estado foi preso. Presidente do PSDB estadual e candidato ao Senado pelo partido, Beto Richa foi detido temporariamente na manhã desta terça-feira em seu apartamento em Curitiba, durante operação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), braço do Ministério Público do Paraná.

Além dele, também foram presos a esposa, Fernanda Richa, o irmão, José Richa Filho (o Pepe), um de seus principais secretários, Deonilson Roldo, e mais oito pessoas, entre agentes públicos e empresários (veja gráfico). Uma das prisões ocorreu em Londrina, a do primo do ex-governador, Luiz Abi Antoun (leia box). Apenas três mandados de prisão, dos 15 expedidos pela 13ª Vara Criminal de Curitiba, não foram cumpridos pelo Gaeco.

A operação, batizada de Radiopatrulha, investiga indícios de direcionamento de licitação para beneficiar empresários e pagamento de propina a agentes públicos, além de lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça, em um programa estadual de manutenção de estradas rurais entre 2012 e 2014.

A FOLHA confirmou a informação de que no final da tarde Beto, Fernanda, Pepe e mais quatro detidos foram levados ao Complexo Médico Penal de Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, onde deveriam cumprir a pena de cinco dias determinada pela Justiça.

Na mesma manhã em que agentes do Gaeco cumpriam a ordem de prisão temporária, Beto Richa também era alvo da 53ª fase da Operação Lava Jato, mas nesse caso os policiais federais cumpriram mandados de busca e apreensão em seu apartamento e escritório político (leia mais na página 4). A ação da PF resultou em nova ordem de prisão contra Deonilson Roldo, que foi chefe de gabinete de Richa e apontado pelo Ministério Público Federal como "participante oculto" da campanha do ex-governador ao Senado (leia na página 4).

Embora sem ligação entre si, as duas operações atingem em cheio o estafe de uma das principais lideranças políticas do Estado e podem ter impacto direto na campanha eleitoral tanto para o Senado, em que Beto Richa vem aparecendo como o segundo colocado nas pesquisas de intenção de voto, quanto para o Palácio Iguaçu. Afinal, o ex-governador apoia a atual governadora e candidata à reeleição, Cida Borghetti (PP), e teve o líder nas pesquisas, candidato Ratinho Jr. (PSD), como seu secretário de Desenvolvimento Urbano em parte do mandato.

Imagem ilustrativa da imagem Beto Richa, irmão e esposa são presos em operação do Gaeco



Radiopatrulha

O programa Patrulha do Campo, lançado em 2011, no primeiro ano de gestão de Beto Richa como governador, consistia em serviços de manutenção de estradas rurais por meio de locação de máquinas pelo governo do Estado. Segundo a denúncia do Gaeco, o ex-deputado Tony Garcia, que assinou acordo de colaboração com o MP, detalhou o esquema, que consistia em direcionar a licitação para as empresas envolvidas no esquema, mediante pagamento de propina ao governador e sua equipe. O edital de concorrência, no valor de R$ 72.190.004.40, foi dividido em três lotes.

Tony Garcia relatou que em 2010, após a eleição de Richa, foi procurado pelos empresários Celso Frare, proprietário da Ouro Verde Transporte e Locação, e o já falecido empresário Osny Pacheco (dono da Cotrans Locação de Veículo) para intermediar uma proposta de implementar o programa com o objetivo de fraudar a licitação, "de modo que as empresas que fizessem parte do esquema criminoso se tornassem vitoriosa, beneficiando os empresários com o desvio de verbas públicas por meio de contratos superfaturados, que então repassariam propina aos agentes do governo como contraprestação."

Ainda segundo o delator, o então governador Beto Richa aceitou a "proposta fraudulenta" e orientou a Garcia que entrasse em contato com seus homens de confiança, Ezequias Moreira Rodrigues e Deonilson Roldo, e com seu irmão, Pepe Richa, secretário estadual de Infraestrutura e Logística, para implementar o esquema, "como de fato ocorreu." "Por sua vez, os empresários Osny Pacheco e Celso Frare cuidaram de orientar a elaboração do processo de licitação de modo a beneficiar suas empresas", diz a ação. Tony Garcia diz ainda que ao ser desaconselhado pelo ex-governador a participar do certame, convidou o empresário Joel Malucelli, dono da J. Malucelli, a integrar o esquema. Ainda segundo Garcia, a concepção do edital fraudulento foi feita na sede do DER (Departamento de Estradas e Rodagem). A licitação acabou beneficiando Cotrans, Ouro Verde e a Terra Brasil, cujo proprietário era o então secretário de Governo, Edson Casagrande. A J. Malucelli teria sido beneficiada com o repasse de quatro patrulhas rurais, enquanto Tony Garcia ficaria com uma. Segundo a denúncia, a propina recebida pelo casal Beto e Fernanda Richa teria sido lavada na compra de imóveis.

MANDADOS

Os três mandados que não haviam sido cumpridos até o fim da tarde de terça-feira são contra o empresário Joel Malucelli, da construtora J. Malucelli; Edson Casagrande (empresário da Terra Brasil e ex-secretário de Assuntos Estratégicos) e André Felipe Bandeira (procurador de Casagrande). Joel Malucelli informou, em nota, que estava fora do País, em férias, e aguardava orientações dos advogados. O Ministério Público não informou as razões para o não cumprimento dos outros dois mandados.

A operação também cumpriu 26 mandados de busca e apreensão em Curitiba, Londrina, Santo Antônio do Sudoeste e Nova Prata do Iguaçu. Foram feitas buscas em 16 residências, quatro escritórios, o escritório político de Richa, quatro empresas e a sede do DER-PR (Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná).

Em pronunciamento à imprensa na manhã da operação, o coordenador estadual do Gaeco, Leonir Batisti, não deu detalhes sobre as investigações, dizendo apenas que os mandados de prisão temporária - determinados pela 13ª Vara Criminal de Curitiba - foram expedidos "para o interesse da investigação". O procurador de Justiça afirmou que a operação está sob sigilo e ressaltou que não há acusação contra os investigados. Ele também não revelou quando os presos seriam ouvidos pela investigação. Mais tarde, por meio da assessoria de imprensa, afirmou que o Gaeco vai analisar os objetos recolhidos durante as buscas - o Ministério Público divulgou imagens de documentos, discos rígidos externos para computador, laptops, notebooks e celulares apreendidos. O braço do Gaeco em Londrina informou que os depoimentos deveriam ser tomados a partir desta quarta-feiras (12).

No final da manhã, o diretor do IML Paraná, Paulino Pastre, esteve na sede do Gaeco em Curitiba para realizar exames de corpo de delito com os investigados presos. Leonir Batisti explicou que não caberia ao Ministério Público determinar para onde os detidos seriam encaminhados. O Departamento Penitenciário do Estado (Depen) confirmou no final da tarde o encaminhamento de Beto, Fernanda e Pepe Richa, além de mais quatro detidos, ao Complexo Médico Penal em Pinhais. São eles: Ezequias Moreira (ex-secretário de cerimonial de Richa), Aldair Petry, Celso Frare, do grupo Ouro Verde, e o contador Dirceu Pupo.

Coincidências

A operação do Gaeco foi deflagrada junto com a 53ª fase da Operação Lava Jato, batizada de Piloto, que também cumpriu mandado de busca e apreensão no apartamento de Beto Richa em Curitiba. Deonilson Roldo, alvo das duas operações, acabou sendo preso preventivamente pela Polícia Federal.

O coordenador do Gaeco sustentou que tratou-se de uma coincidência. "Embora ninguém vá acreditar, [as operações] são independentes", disse. Sobre a ação na residência do ex-governador, o procurador disse que a busca foi "normal e tranquila".

Questionado por jornalistas, Leonir Batisti afirmou que o Ministério Público está ciente da interferência da operação na eleição, mas disse que o ritmo de investigações da instituição não pode ser interrompido pelo período eleitoral. "Não há uma vedação legal de se fazer investigações no período pré-eleitoral. Eu sei que, quando atinge uma pessoa que é, inclusive, candidata, é óbvio que interfere. Mas de forma alguma podemos parar os trabalhos por motivos dessa natureza", disse.